Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante o 59º Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE)
Primeiro, eu queria agradecer à direção da UNE por ter convidado o companheiro Pepe Mujica [ex-presidente do Uruguai] pra participar desse congresso. Eu e o Pepe Mujica, juntos, somamos 165 anos de história. Nós já tivemos a idade de vocês, mas vocês não tiveram a nossa idade. Portanto, nós sabemos o que vocês são capazes de fazer aos 20 anos, aos 18 anos, aos 25, aos 30, porque já tivemos essa idade. Mas, vocês nunca tiveram 77 e nem 88 anos pra saber do que que a gente é capaz de fazer nesse mundo.
O Pepe disse uma coisa extraordinária. O que motiva a vida humana e o que motiva a nossa capacidade de ser melhor ou não, é só a gente ter uma causa ou não ter uma causa. Uma pessoa que não tem uma causa, não tem muita razão pra viver. Uma pessoa que tem uma causa, pode até dizer que quer viver até 120 anos de idade – como eu acho que o homem que vai viver 120 já nasceu e eu acho que sou eu – e vocês se preparem porque vão viver comigo muito tempo,
Eu acho extraordinário a UNE apresentar uma pauta de reivindicação longa, longa, árdua e apimentada, porque tive o prazer, de 2008, na cidade de Caruaru, em Pernambuco, inaugurando a faculdade de medicina, o presidente da UNE me dizer. “Presidente Lula acabou a nossa pauta de reivindicação, nós não temos mais o que reivindicar.” Mas, já tinha indicado a pauta pra Dilma, mas, agora, vocês indicaram outra pauta. E eu queria dizer pra vocês com muito orgulho. Somente em um Governo eleito por vocês a gente é capaz de cumprir essa pauta de reivindicação que vocês apresentaram.
Porque nós continuamos acreditando e afirmando: dinheiro aplicado em educação, é investimento. Dinheiro aplicado em saúde, é investimento. Dinheiro aplicado na melhoria da qualidade de vida do povo, é investimento. E eu voltei, não porque eu quis voltar, eu voltei porque vocês voltaram junto pra gente recuperar esse país, recuperar a democracia e recuperar a qualidade de vida do nosso povo.
Vocês precisam compreender uma coisa. Como a democracia é importante. Há muito pouco tempo, há muito pouco tempo vocês conheceram o que que é o fascismo, vocês conheceram o que que é o nazismo, vocês conheceram, apenas em quatro anos, como é que se pode destruir a democracia e destruir as conquistas que, às vezes, a gente leva séculos pra conquistar. E eu espero que a gente tenha aprendido uma lição. A lição de que a democracia pode não ser a coisa mais perfeita que a humanidade criou, mas não tem nada igual ela. É na democracia que a gente pode viver a pluralidade, a diversidade, que a gente pode aplaudir, que a gente pode vaiar, que a gente pode gritar, que a gente pode contestar, é na democracia que a gente vive a plenitude da manifestação do ser humano.
E eu voltei com muito orgulho pra dizer pra vocês. Nós vamos voltar a fazer mais universidade, nós vamos voltar a fazer mais escolas técnicas, nós vamos voltar a fazer mais laboratórios, nós vamos nos reunir com reitores e com os estudantes. Nós vamos, outra vez, colocar o pobre no orçamento da União.
Se vocês tivessem aqui no meu lugar ou junto com todos nós aqui, vocês iriam sentir a diferença que eu senti. Eu participei – vocês não sabem porque são muito jovens – do primeiro congresso da recuperação da UNE, na cidade de Piracicaba, em 1976. Naquele Congresso da UNE não tinha negro, naquele Congresso da UNE era uma sociedade branca. Porque naquele tempo era proibido, não por lei, era proibido por questões econômicas que negro pudesse pensar em entrar numa universidade. Hoje, eu poderia avocar aqui o meu companheiro Aldo Arantes, que foi presidente da UNE, e ele vai perceber que hoje aqui tem mais pardos e negros do que branco nesse Congresso da UNE, numa demonstração de que as coisas mudaram nesse país e vão mudar muito. Aqui não tem apenas filho de doutor, aqui não apenas filho de gente rica, aqui tem filho de pedreiro, de empregada doméstica, aqui tem filho de metalúrgico, de químico, de gráfico. Aqui está os filhos e as filhas do povo brasileiro com a cara que nós temos, pra dizer: nós vamos mudar este país e este país vai voltar a privilegiar a melhoria da qualidade de vida de vocês.
Não é possível, esse país, companheira Jandira [Jandira Feghali - deputada federal], presidente nenhum gostava de receber reitores. A primeira coisa que eu fiz, no mês de janeiro, foi receber todos os reitores das universidades e dos institutos federais pra que eles entregassem uma pauta de reivindicação. Nós não temos medo de ouvir as pessoas dizerem o que querem, a única coisa que a gente tem medo é de a gente não poder cumprir com o compromisso que nos fez voltar a ser presidente da República para atender aos interesses de nossa sociedade. E podem ficar certos, podem ficar certos, eu fui o último presidente a participar do Congresso da UNE, em 2009. O último. E 14 anos depois, eu estou aqui. E estejam certo que eu estarei no próximo, que estarei no próximo porque eu venho de um mundo, eu venho de, de uma origem....
Companheiros e companheiras,
Eu, na verdade, eu ia começar a minha fala agradecendo a solidariedade de vocês nos período difíceis que nós vivemos e na minha reeleição.
Mas, eu queria dizer a vocês que eu sou grato, sou grato à UNE porque desde que tomei posse, em 2003, não teve um só momento que a UNE não esteve junto defendendo tudo aquilo que nós fizemos na educação brasileira. Tinha agrupamentos no movimento estudantil que era contra o Reuni, tinha gente que era contra o ProUni, tinha gente que era contra o Fies, tinha gente que era contra a gente aumentar a quantidade de alunos de 12 para 18 nas universidades. E eu sabia porque que as pessoas eram contra. Porque até então só a elite brasileira poderia entrar na faculdade. Quando o pobre entrou, eu sei que o pobre incomodou.
Eu sei como incomodou quando as meninas negras e meninos negros entraram na sala de aula. Eu sei quanta gente pensou: “O que que eles estão fazendo aqui? Eles deveriam tá trabalhando, eles deveriam tá carpinando, porque isso aqui não é pra eles.” E no nosso governo a faculdade, a universidade, o laboratório, a cultura é pra todos, independente da cor, independente da condição social da pessoa.
Por isso, companheiros e companheiras, eu queria dizer pra vocês uma coisa simples...
Eu, eu, eu lamento, lamento não ter aqui na mesa, por uma questão de saúde, o companheiro Renato Rabelo, nosso querido companheiro dirigente do Partido Comunista do Brasil, a quem eu devo muito respeito e muito carinho.
Mas, eu queria dizer pra vocês que eu, depois de 580 dias preso, eu comecei namorar com a Janja na cadeia. Casei com a Janja dia 18 de maio do ano passado. Eu, se tivesse juízo, eu não teria voltado pra política, eu teria ido cuidar da minha vida e viver o meu fim de ano com a Janja. Entretanto, quando a gente tem compromisso com esse país, quando a gente tem compromisso com esse povo e quando a gente encontra uma companheira que não puxa a gente, mas fala: “vai, vai porque a luta é nossa, a luta é do povo brasileiro e nós temos que voltar pra recuperar, recuperar aquilo que o povo tem direito.” E vocês podem ficar certo, eu voltei pra gente fazer mais, eu voltei pra gente fazer melhor, eu voltei pra vocês voltarem a sorrir, pra vocês voltarem a sonhar, pra vocês voltarem a ter esperança, pra vocês voltarem a ter emprego, pra vocês voltarem a ter oportunidade, pra vocês voltarem a ter orgulho de ser brasileiro de verdade e dizer que este país será o país do tamanho que a gente quiser. Este país será respeitado se nós quisermos que ele seja respeitado, esse país será grande, esse país será protagonista internacional; não paira, como foi durante o mandato do governo anterior. Portanto gente, estejam certos: a razão pela qual eu voltei é por causa de gente como vocês, que não me permitiram ficar em casa.
Quando eu estava na cadeia, que todo dia às 7h da manhã, eu ouvia vocês gritarem: “Bom dia, presidente Lula”. Na hora do almoço, eu ouvia vocês gritarem: “Boa tarde, presidente Lula”. E à noite eu ouvia vocês gritarem: “Boa noite, presidente Lula”, durante 580 dias. Eu não conhecia na história ninguém que teve o privilégio de ter a manifestação que vocês fizeram pra mim. Eu ficava preso e meditando. O que que eu vou fazer quando eu sair daqui? Eu firmei minha convicção. “Eu vou sair daqui, vou ganhar a presidência novamente e vou provar que este país pode, definitivamente, ser um país que dê ao seu povo a cidadania.” Porque uma nação não é grande pela quantidade de gente, uma nação é grande pela qualidade da educação, pela qualidade da saúde, pela qualidade do emprego.
E estejam certos, cada um de vocês, quem tem uma causa não fraqueja. E eu tenho uma causa. Essa causa chama-se: povo brasileiro. E por conta desse povo, nós vamos lutar até que este país seja, verdadeiramente, o país que todos nós sonhamos.
Um beijo no coração e até o próximo Congresso da UNE.