Discurso do presidente da República no Fórum Empresarial Brasil - Portugal em Matosinhos, na região do Porto (Portugal)
24/4/2023
Transcrição do discurso do presidente Lula na abertura do Fórum Empresarial Brasil-Portugal em Matosinhos (Portugal)
António Costa, primeiro-ministro da República Portuguesa; meu caro João Gomes Cravinho, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal; Luísa Salgueiro, presidente da Câmara de Matosinhos. Empresários portugueses, empresários brasileiros. Empresárias portuguesas e empresárias brasileiras;
Querido ministro Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores do Brasil; José Múcio, ministro da Defesa, que me acompanha nessa viagem; Nísia Trindade, ministra da Saúde que me acompanha; Luciana Santos, ministra da Ciência e Tecnologia; Márcio Macedo, secretário-geral da Presidência;
Senhora senadora Leila Barros, senadora da República; deputados federais Marcelo Queiroz, Lídice da Mata, Jandira Feghali, Júlio Lopes, Newton Cardoso Júnior, Denise Pessoa, Gervásio Maia, Átila Lins e Gabriel Mota, deputados de vários partidos políticos dando a demonstração de que o Brasil está voltando à civilidade. Estamos fazendo democracia da forma mais plural que um país pode exercer.
Quero também cumprimentar o senhor Luís Faro Ramos, embaixador de Portugal no Brasil; o senhor Raimundo Carreiro, embaixador do Brasil em Portugal; a embaixadora Maria Stela Brasil Frota, cônsul-geral do Brasil no Porto; tenente-brigadeiro do Ar Marcelo Damasceno, comandante da Força Aérea Brasileira, que fez questão de vir fazer o voo no KC-390 aqui em Portugal.
Meu querido companheiro Márcio Elias Rosa, que está aqui representando meu vice-presidente, que é ministro da Indústria e Comércio. O companheiro Márcio Elias Rosa representa aqui o nosso companheiro Alckmin, ex-governador de São Paulo e atual vice-presidente da República e ministro de Indústria e Comércio; Luís Rebelo de Sousa, presidente da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal e o meu companheiro Jorge Viana, nosso presidente da APEX; cumprimentar o Emídio de Souza; o companheiro Hélio Doyle, que é presidente da nossa empresa de comunicação (EBC) e cumprimentar os parceiros que vieram aqui nos acompanhar.
A primeira coisa, primeiro-ministro, eu quero agradecer ao Centro de Engenharia e Desenvolvimento por acolher o Fórum Empresarial Brasil-Portugal e os empresários que prestigiam este evento. É para mim uma satisfação enorme abrir o fórum justamente nesta casa.
Além de ser um centro de referência de pesquisa em Portugal, a instituição participou do desenvolvimento e da certificação de parte da aeronave KC-390 da Embraer e mantém parcerias com diversas empresas e entidades brasileiras ligadas à tecnologia e à inovação. O Centro de Engenharia e Desenvolvimento representa muito bem a cooperação empresarial que queremos impulsionar com o encontro de hoje, uma cooperação voltada para o futuro, a tecnologia, as energias renováveis, a mobilidade urbana e a saúde.
Quando estive em Portugal pela última vez como presidente da República, em 2010, pude testemunhar os primeiros passos dessa parceria com os investimentos da Embraer no setor aeronáutico português. Naquele instante, Portugal iria produzir asas de um avião feito pela Embraer. A parceria deu frutos, mostrando que quando há trabalho diário de cooperação, as sementes plantadas florescem. Hoje, nossa associação estratégica na indústria aeronáutica é uma realidade e motivo de grande orgulho.
A ela se seguiram muitas outras e este evento é uma arte do relançamento das relações bilaterais em todas as suas vertentes que pretende promover. A prioridade do meu governo é retomar o desenvolvimento e a inclusão social no país de forma sustentável. A transição ecológica energética é também uma oportunidade de fazermos isso com empregos verdes na área de energia renovável, onde temos imenso potencial solar e eólica, no reaproveitamento de resíduos e na recuperação de 30 milhões de hectares de pastagem e terras degradadas. Estamos retomando o combate ao desmatamento e voltamos a prevenir de verdade os crimes ambientais.
Quando no Brasil nós falamos que o Brasil voltou, é porque o Brasil esteve afastado do mundo praticamente 6 anos. Durante 6 anos, o nosso país recusava outros países e os outros países também recusavam o Brasil. Vocês se lembram que o Brasil não recebia nenhum presidente e o nosso presidente não viajava para nenhum país, porque ninguém tinha nenhum interesse em conversar com pessoas que não se comportavam de forma muito civilizada.
E nós falamos que o país voltou a ter um governo que trabalha e dialoga com a sociedade e com o mundo todo e que constrói o futuro do país. Apenas em 3 meses deste ano, a gente investiu mais em educação do que o governo passado todo o ano passado. E apenas este ano nós vamos investir na área de infraestrutura 23 bilhões de reais, o que significa 4 vezes o que foi investido em quatro anos do outro mandato. Ou seja, significa que o nosso país não andou, significa que o nosso país não fez aquilo que qualquer presidente ou qualquer governo tem que fazer, que é estabelecer relações, convencer as pessoas da importância do Brasil, da qualidade do Brasil.
E para que um presidente da República possa visitar outros países e atrair capital externo, o país tem 3 componentes básicos. Primeiro, o presidente tem que oferecer estabilidade política, estabilidade social e estabilidade jurídica. Essa é uma coisa sem a qual nenhum investidor irá colocar dinheiro em outro país. Se você não tiver estabilidade social, estabilidade política e estabilidade jurídica, ninguém vai colocar um centavo no seu país.
A segunda coisa que você sempre pode colocar para convencer as pessoas é credibilidade. E credibilidade você só tem se você tiver relação direta com as pessoas. No Brasil, nós não vamos vender empresas públicas, o que nós queremos é convidar os empresários a fazer em parceria conosco, naquilo que a gente precisa criar de novo. No Brasil nos últimos 6 anos, se vendeu muito patrimônio público, não para construir outro patrimônio ou para construir outro ativo, se vendeu patrimônio para simplesmente pagar os juros da dívida pública.
Ou seja, nós nos desfizemos do nosso patrimônio, o nosso patrimônio ficou menor e a qualidade do serviço não melhorou. Eu vou dar, primeiro-ministro, um exemplo para você do que aconteceu no Brasil. Nós privatizamos a nossa maior empresa de energia elétrica, que era a Eletrobrás. Uma empresa muito grande. Ela foi vendida por US$ 36 bilhões, se não me falha a memória.
Quando essa empresa foi vendida, a primeira coisa que a diretoria da empresa fez foi aumentar o salário da diretoria de R$ 60 mil por mês para R$ 360 mil por mês. Se você quiser ver apenas um absurdo, eu agora tenho que indicar um conselheiro para essa empresa. Um conselheiro dessa empresa para trabalhar uma vez por mês ganha R$ 200 mil.
Essa é apenas uma demonstração da desfaçatez do que aconteceu no Brasil nesses anos de obscurantismo. E nós voltamos a governar este país, primeiro-ministro, para tentar recuperar. Quando nós deixamos a Presidência, o Brasil era a sexta economia do mundo, o Brasil voltou a ser a 12ª economia do mundo. O Brasil era o país considerado um país da oportunidade por quase todos os países do mundo, nós chegamos a ser o país que mais recebia investimento direto de outros países.
Isso paralisou. Então a minha volta, quando a gente fala o Brasil voltou, é porque que nós queremos efetivamente fazer com que o Brasil volte a ter a importância que ele sempre teve e, para ter importância, o presidente do Brasil precisa viajar. O presidente do Brasil precisa chamar e convidar outros presidentes. Os nossos empresários precisam viajar, os nossos pensadores precisam viajar, os nossos deputados e senadores precisam viajar. Nós não podemos ficar trancados a sete chaves, achando que o mundo nos acha bonitos e que vai investir.
O Brasil já tem a matriz energética possivelmente mais limpa do mundo, 80% da nossa energia elétrica é limpa. Mesmo na área de combustíveis, nós somos um país que você tem carro que pode ter 25% de gasolina misturada com etanol, misturando a gasolina 50% ou 100%, não tem problema. Nós aprovamos 12% de biodiesel para ser colocado no óleo diesel, na perspectiva de fazer com que o Brasil produza o óleo diesel mais qualificado do mundo.
Já existe engenharia de você não precisar misturar o óleo, a própria refinaria vai refinar o biodiesel junto com o diesel e vai sair um biodiesel de melhor qualidade. Nós estamos apostando no hidrogênio verde em todos os estados do Nordeste, na perspectiva de que a gente possa estabelecer uma parceria muito grande com o mundo inteiro na construção de eólicas, na construção de biomassa, na construção de energia solar e na questão do hidrogênio. O Brasil está preparado para voltar a ser um país grande. O Brasil está preparado para voltar a ser um país importante. O Brasil está preparado para voltar a ser um país atraente.
E o Brasil quer construir definitivamente políticas de parceria, nós não queremos relações hegemônicas com ninguém. Não é porque nós somos grandes que nós temos que ter hegemonia. Não, nós queremos construir parcerias com as empresas portuguesas e nós queremos que os empresários portugueses construam parcerias com as nossas empresas. Nós não queremos vender aquilo que já está pronto, nós queremos construir aquilo que falta fazer.
Só para vocês terem ideia, nós temos 14 mil obras que desde o meu governo em 2010 e o governo Dilma até 2016 estão paralisadas. Só na área da educação são 4 mil obras que estão paralisadas: escolas de tempo integral, escola de ensino fundamental e creches. Essa semana, tomamos a decisão de começar a fazer 1600 creches que estão paralisadas há 6 anos no país. Obras de infraestrutura são quase 6000 obras paralisadas. E tudo isso agora vai voltar a funcionar.
Nós temos um problema no Brasil, primeiro-ministro, que Portugal não sei se tem, que a nossa taxa de juros é muito alta. No Brasil, a taxa Selic, que é a taxa básica, está 13,75%. Ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%, ninguém. Não existe dinheiro mais barato. E a verdade é que um país capitalista precisa de dinheiro e esse dinheiro tem que circular, não apenas na mão de poucos, na mão de todos.
É por isso que eu digo sempre: a solução do Brasil é a gente voltar a colocar o pobre no orçamento, é a gente garantir que as pessoas pobres possam participar. Porque quando eles virarem consumidores, eles vão comprar. Quando eles comprarem, o comércio vai vender. Quando o comércio vender, vai gerar emprego. Quando começa a vender, vai comprar mais produto na fábrica, não precisa importar da China, pode comprar dos produtos produzidos no Brasil. E a gente vai gerar mais emprego, mais emprego vai gerar mais salário, é uma coisa mais normal de uma roda gigante da economia funcionando e todo mundo participando.
Nós já fizemos isso uma vez e vamos fazer outra vez. Por isso é que essa parceria Brasil-Portugal é importante. Porque sempre se tratou Portugal como um país pequeno. Ah, Portugal é a porta de entrada para o Brasil ir para a Europa. Não. Pessoal achava que não era Portugal, que a porta era a Alemanha, ou a França. E nada melhor do que a gente estabelecer uma relação com Portugal, daqui de Portugal se produzir os produtos juntos e de Portugal se exportar esse produto para outros países europeus, é muito mais fácil.
É muito mais simples para nós, é apenas a gente acreditar, é apenas a gente estabelecer essa relação que falta. E eu queria fazer uma ponderação aos empresários: eu tenho 1350 dias de governo. Nesses 3 meses o que nós fizemos, na verdade, foi preparar o Brasil para dar o salto de qualidade que nós queremos dar. Nós tivemos que recuperar todas as políticas de inclusão social que foram desmontadas. O que nós fizemos em 13 anos foi desmontado em 4 anos.
Até a fome que tinha sido reconhecida como acabada no Brasil pela ONU voltou e hoje nós temos 33 milhões de pessoas passando fome, uma coisa que tinha acabado em 2012. Significa que nós vamos ter que fazer muitas coisas que nós já tínhamos feito, muitas coisas: a maior política de crédito para financiar o pequeno produtor; a maior política de levar água na casa dos pobres, 1,4 milhão de cisternas; o mais importante programa de energia para levar energia na casa das pessoas que não podem pagar, tudo isso financiado pelo Estado. Isso vai voltar, meu caro ministro Antônio, e você certamente vai ter orgulho do Brasil voltar a crescer.
Eu estou muito feliz com o povo brasileiro que está aqui em Portugal, mas eu estou mais feliz com aqueles que estão aqui porque vieram aqui para trabalhar, vieram aqui para investir. E aqueles que vieram porque o Brasil não oferece oportunidade, eu quero levá-los de volta, oferecendo a oportunidade como fizemos em 2007, 2008. Porque quando houve a crise de 2008, o Brasil foi o último país a entrar e o primeiro a sair da crise.
Eu tinha muito orgulho quando os soldadores japoneses vieram para o Brasil por causa da construção dos navios que nós estávamos fazendo em todos os estaleiros brasileiros. Acabou. Só para você ter ideia: uma indústria naval que em 2003 tinha 3 mil trabalhadores, chegou a 82 mil trabalhadores em 2010, agora acabou outra vez. Nós temos 20 mil funcionários. A gente estava produzindo os grandes cargueiros que a Petrobras precisava. Isso parou, estamos importando de Singapura, estamos importando da China coisas que nós sabemos fazer.
Nós tínhamos estabelecido no Brasil que 65% dos componentes desses navios, dos componentes das plataformas, dos componentes das sondas seriam todos produzidos no Brasil. Isso acabou, e acabando isso, acabou a pequena e média empresa; acabando isso, acabou os pequenos fornecedores, que só para a Petrobras eram quase 65 mil empresas que forneciam. Acabou em nome do quê?
Eu não esqueço nunca, a primeira vez que eu estive aqui em Portugal e que eu dizia: “Nós podemos chegar a 10 bilhões de fluxo de comércio, é só colocar uma meta, estabelecer essa meta”. Você deve ter também uns 3 anos de mandato ainda, 2 anos e pouco de mandato. Nós poderemos estabelecer uma meta, o que é que nós queremos que aconteça entre Brasil e Portugal?
E a gente pode conseguir isso. Porque na política você tem que estabelecer a meta, na política você tem que ter um projeto, na política você não pode ficar governando de acordo com o vento. Você determina estrategicamente o que você quer que aconteça.
Eu lembro que quando você ganhou a primeira eleição, no Brasil se vendia muito a ideia de que quem tinha ganho as eleições em Portugal era uma geringonça. Geringonça no Brasil não é uma coisa muito boa não, é um amontoado de qualquer coisa. Ou seja, o dado concreto é que você está mudando a cara de Portugal, inclusive na relação política com o presidente Marcelo. Eu acho uma coisa extraordinária é as pessoas que pensam diferente estabelecerem uma regra de convivência pacífica em benefício de seu povo.
Esses dias no Brasil, me perguntaram qual era a minha base congressual. Eu disse: "A minha base congressual é 510 deputados e 81 senadores, todos”. Vamos esperar entrar os projetos no Congresso Nacional, vamos esperar o tipo de conversa que nós vamos fazer e vamos ver qual é a nossa base. Eu tenho certeza que a gente vai mudar a história do Brasil.
E eu acho que os gestos que nós estamos tendo hoje aqui nessa empresa de engenharia vão produzir frutos extraordinários para Brasil e Portugal. Nós vamos ter no ano que vem um encontro empresarial no Brasil, eu espero que você esteja presente, espero que o presidente Marcelo possa comparecer para que a gente não deixe cair o estímulo que nós tendo aqui. Ontem, a pedido do embaixador português, eu pedi para o Jorge Viana, vamos fazer uma agência da Apex em Lisboa.
Por que é só em Genebra e não em Lisboa? Em Genebra, o cara tem que falar o inglês ou o francês. Aqui não, aqui o cara fala português e ele pode vender nossas coisas, comprar as coisas de Portugal com muito mais facilidade. Por isso, Jorge Viana, por isso, companheiros portugueses, obrigado por esta oportunidade. O Brasil está de volta. Está de volta para ser protagonista internacional. É por isso que eu estou me dedicando inclusive em tentar parar de falar em guerra e construir a paz, para que a gente possa produzir, para a humanidade viver melhor. Um abraço e obrigado pela oportunidade.