Discurso do presidente da República durante lançamento do programa Brasil Sorridente
Nos outros mandatos que eu tive, todo ministro que queria anunciar algum programa, tinha que passar no meu gabinete, discutir com a minha assessoria e discutir o que é que ele ia falar e o que é que eu falar.
Porque muitas vezes quando a gente vai fazer discurso por escrito, o nosso discurso é feito por todo mundo que falou antes, então, você tem sempre que inventar uma coisa nova pra dizer. Olha, a primeira coisa que eu queria que vocês compreendessem, é que quando você quer eleger um vereador, um deputado, um prefeito, um governador, você tem que ter em consciência o seguinte: a nossa cabeça, ela funciona de acordo com o chão que os nossos pés pisam. Presta atenção nisso.
Porque não é fácil as pessoas se preocuparem com as coisas dos mais pobres. Eu lembro que nesse país aqui teve um governante muito letrado, que resolveu distribuir dentadura, e muitas vezes era uma cesta de dentaduras, para que a pessoa escolhesse aquela que servisse na sua boca. E isso me incomodava muito, porque como eu viajava muito o Brasil, eu não suportava ver uma menina de 16 anos, um rapaz de 16 anos, de 17, já não mais conseguia sorrir na frente da gente, de vergonha.
E a gente tem que compreender que as coisas simples, muitas vezes têm mais importância do que aquelas coisas que a gente pensa que têm importância. Uma vez o Doutor Adib Jatene, e eu era candidato a governador em 82, e o saudoso Adib Jatene, de quem eu tenho a mais grata lembrança, me levou num debate, acho que na Escola Superior de Medicina em São Paulo, eu sei que era o lugar dos bam bam bam da Medicina em São Paulo. E eu disse para eles, que um dos problemas desse país era que todo corpo humano era tratado com uma questão de saúde pública, menos a boca.
Os convênios que a gente fazia com as empresas naquela época não aceitavam colocar tratamento odontológico no plano de saúde. Ou seja, quando você participava de um churrasco, que o sindicato fazia muitos, tinha gente que não comia carne porque não tinha dente.
Ela falou da castanha... Aqui dentro do palácio, um companheiro do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra lá de Pernambuco, do Porto de Suape, em Recife, nós estávamos em uma mesa conversando e eu coloquei, o garçom colou amendoim, castanha e eu falei: você não come? Ele falou: eu gosto, mas não posso morder.
Eu lembro que passou uns três, quatro meses, eu falei para o governador do estado de Pernambuco que era preciso cuidado e levar o companheiro ao Brasil sorridente. Passado uns quatro ou cinco meses eles voltaram aqui para discutir o mesmo assunto da terra, e esse companheiro falou: presidente, agora pode colocar castanha que eu vou mastigar castanha e vou morder a castanha.
Bem, eu... Todos os números que os companheiros que falaram antes de eu vir falar, eu ia falar. Mas não vou falar mais. Eu vou apenas dizer para vocês o seguinte: tem política que você só coloca em prática, se você tiver vivido. Porque é preciso perceber como é que reage o ser humano. Imagina você numa escola, duas crianças da mesma idade, uma que o pai tem o mínimo de recurso e pode tratar do dente dele, e a outra que o pai não tem nenhum recurso, e que o dente vai apodrecendo e vai ficando sem tratamento porque não tem recurso. Mas, não é só tratar no dentista, é a qualidade da água que a pessoa vai beber, é a qualidade da comida que a pessoa vai comer. Porque se não houver este processo de educação e este processo de investimento para melhorar essas coisas, não adianta.
Os programas muitas vezes não valem a pena, se as pessoas não estiverem educadas. Por isto que eu disse para a ministra Nísia que eu quero que esse programa garanta, sabe, que a gente tenha dentista para ir na sala de aula ver todas as crianças de uma escola.
Tem que ver se a criança precisa de um tratamento e, educar essa criança, a partir da escola, para que a gente possa daqui a 20 ou 30 anos sonhar em ter uma sociedade em que as pessoas possam comer carne, possam comer castanha, possam sorrir, possam até arrumar namorado ou namorada.
Ninguém vai querer namorar uma moça que não tenha dente na frente, muito menos ela vai querer namorar um rapaz que não tenha dente na frente. Por que é que a gente tem vergonha de falar essas coisas que são a realidade?
A realidade é que as pessoas gostam, sabe, de ser bem tratadas. As pessoas não se tratam, porque não podem. Ninguém gosta de estar banguelo. Ninguém gosta de ter dente sujo. Ninguém gosta de aparecer feio diante dos outros, e o Brasil Sorridente é uma coisa extraordinária porque recupera, não o sorriso, recupera a dignidade do ser humano. Recupera a dignidade, o orgulho do ser humano.
Por isso, gente, eu quero que vocês tenham consciência que nós temos mil duzentos e poucos dia pela frente. Eu esqueci a quantidade de dias, porque eu vivo todo dia citando. Mas nesse pouco tempo que a gente tem, a gente vai ter que fazer mais do que a gente fez nos outros mandatos. A gente tem a obrigação de fazer mais! Uma parte é recuperar tudo que foi destruído, e vocês não tem noção de como foram destruídas as coisas que nós levamos 13 anos para fazer, eles levaram quatro anos pode destruir. Ou seja, agora nós temos que reconstruir tudo.
Amanhã, por exemplo, eu vou... essa semana eu vou no Estado do Ceará, lançar a retomada da reconstrução de 4 mil obras em escolas públicas que eles paralisaram. Dentre delas, 1.700 creches.
Nós temos 14 mil obras paradas, que nós temos que começar, outra vez, a reconstruir. Ou seja, o país que a gente tinha construído, ele foi desmontado. E no lugar de benefício para o povo, foi colocado a mentira, foi colocado ódio, foi colocado desrespeito, foi colocada a redução salarial.
Nós chegamos aqui, o funcionalismo Público Federal havia sete anos que não recebia um acordo. E nós fizemos um acordo com 100 sindicatos, aprovado por unanimidade, há 15 dias atrás. E, nós temos várias outras coisas para recuperar, e eu estou vendo ali, uma faixa já pedindo nomear cirurgiões dentistas. Eu acabei de sancionar a lei, e a primeira reivindicação está ali.
Então, o que eu acho é o seguinte, tudo isso para mim é investimento, não me fale em gasto. Porque tratar da saúde do povo é investimento, porque é m cidadão com saúde ele é muito mais produtivo e muito mais útil do que um cidadão doente, sem força, sem qualidade para prestar um serviço que ele gostaria de prestar. Por isso, companheira Nísia... Quando escolhi a Nísia para ser ministra, eu tinha quatro ex-ministros para escolher. Eu tinha o Humberto Costa, eu tinha o Padilha, eu tinha o Temporão e tinha o Chioro e tinha mais o companheiro de Minas Gerais. E eu fiquei pensando, por que repetir outra vez a escolha de um homem, por que não tentar uma mulher?
E aí eu descobri uma companheira, que não é médica, que é cientista política e que dirigiu com maestria o Instituto Souza Cruz por seis anos. Foi de lá que eu fui buscar essa mulher para dirigir a saúde desse país. Porque como eu dizia sempre que governar um país é como coração de mãe. Você só governa se você tiver paixão, se você tiver amor, se você fizer as coisas. E, eu quero que a Nísia trate a saúde do povo brasileiro com muita paixão, porque essa gente, que já é agradecida ao Humberto, ao Padilha, ao Chioro, ao Temporão e muitos outros, essa gente não vai esquecer, que a primeira mulher, quem sabe se Deus quiser, a primeira mulher ministra da Saúde, pode se transformar na melhor ministra da Saúde que esse país teve.
E uma coisa importante é que você não está aqui por indicação de partido político. Você não está aqui por pressão de médicos, você não está aqui por pressão de dentistas. Você está aqui, pura e simplesmente, pelo mérito da tua capacidade de gerenciar a Fiocruz. Foi isso que trouxe você a ser Ministra da Saúde. Faça disso o que você puder fazer de melhor, esse povo vai te agradecer. Trate a saúde com o coração – e eu sei que quando você tiver problema financeiro, a gente vai ter que discutir, porque sempre na área econômica, qualquer dinheiro que a gente precisa é gasto. Eu tô numa teimosia pra dizer que qualquer dinheiro para cuidar do povo é investimento. E se a gente não fizer.... a gente não resolve o problema.
Que Deus abençoe todos vocês. Boa sorte! E que tratem o povo brasileiro com muita dignidade.
Eu vou contar uma coisa pra vocês: essa minha ligação com dentista não é só aqui do Brasil. Eu não era presidente da República, eu fui à Portugal e lá eu conheci a situação dos brasileiros que eram dentistas e que não tinham condições de trabalhar como dentistas. Eram contratados como se fossem bagrinhos pelos dentistas portugueses.
Porque, na verdade, Portugal não tinha cursos de odontologia. Em Portugal, a pessoa estudava medicina, e, no último ano, fazia odontologia como se fosse a residência dele. Então, os dentistas brasileiros eram adorados pelos portugueses que queriam tratar os dentes. E, graças a Deus nós conseguimos com o governo português, que os nossos que dentistas pudessem trabalhar livremente, como se fossem portugueses.
E isso, eu espero que a gente consiga fazer em outros países do mundo. Porque nós estamos fazendo muitos acordos, em que o diploma dele vale aqui e o nosso diploma valha lá, para gente poder universalizar as coisas boas que o nosso povo precisa.
Parabéns a vocês!