Discurso do presidente da República durante almoço em homenagem ao primeiro-ministro de Cabo Verde
É um prazer receber, em Brasília, o primeiro-ministro José Ulisses Correia e Silva. Sua visita é muito especial: é a primeira de um mandatário africano ao Brasil desde minha cerimônia de posse.
Em meus dois primeiros mandatos, promovemos o reencontro do Brasil com o continente africano. Visitei a África doze vezes, fui a vinte e um países. Tive a satisfação de visitar Cabo Verde em duas ocasiões.
Agora a África voltará a ser uma prioridade para o Brasil, sobretudo o relacionamento com os países africanos lusófonos.
O Brasil aposta na África não só porque tem uma dívida histórica com esse continente irmão. Vemos para a África um futuro extraordinário, com seus 1,2 bilhão de habitantes e seu imenso e rico território.
Senhor primeiro-ministro,
O Brasil acredita na cooperação Sul-Sul solidária, com benefícios mútuos e baseada em experiências compartilhadas.
Nossa parceria na área de educação é motivo de profunda satisfação e orgulho.
Contribuimos para a criação da Universidade de Cabo Verde, em 2004. Com seus 18 anos de funcionamento, ela tem representado a importante alternativa para o ensino superior dos cabo-verdianos, que já não necessitam buscar alternativas somente no exterior.
Cabo Verde também é, historicamente, um dos principais beneficiários dos programas que acolhem no Brasil estudantes de graduação e pós-graduação.
Parte desses estudantes passaram pelos bancos da Universidade Federal da Integração Luso-Afro-Brasileira (UNILAB). Desde a sua criação, em 2010, alunos cabo-verdianos estão sendo formados na área de saúde, agricultura e gestão pública, com o compromisso de voltarem a atuar em seu país.
Outras iniciativas importantes bilaterais estão em curso em assistência materno infantil, coleta eletrônica de dados para pesquisas populacionais e sanidade animal.
Tenho certeza de que a participação do primeiro-ministro, amanhã, no maior encontro de tecnologia do mundo (o Web Summit) no Rio de Janeiro vai nos permitir identificar novas áreas de cooperação a serem exploradas em setores de ponta.
A economia digital e as chamadas “startups” têm enorme potencial de transformação de nossas economias, de geração de emprego e renda nas cidades e no campo.
Todas essas iniciativas traduzem a natureza fraterna do nosso relacionamento e o reconhecimento das particularidades de cada parceiro, além de não possuírem condicionalidades.
Caro amigo José Ulisses,
Brasil e Cabo Verde são dois países que apostam no multilateralismo como espaço privilegiado para enfrentar os desafios do desenvolvimento sustentável e de segurança.
Os efeitos da mudança do clima representam ameaças a todos, e seus impactos são particularmente perversos nos pequenos estados insulares. Como anfitrião da COP 30, que pretendemos sediar em Belém, na Amazônia brasileira, daremos especial atenção a essa circunstância vivida por Cabo Verde.
Nossos países também se encontram entre os que sempre defenderam a vocação pacífica do Atlântico Sul. Ao sediar a recém-concluída reunião ministerial da Zona de Paz de Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), Cabo Verde ajuda a manter o vasto oceano que nos une livre de armas de destruição em massa e fora de disputas geopolíticas alheias à região.
Outro ponto de união entre nós é patrimônio linguístico comum e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Temos agora um acordo de mobilidade, que vai facilitar a circulação dos nossos quase 300 milhões de habitantes no espaço da CPLP e contribuir para intensificar nossas relações humanas, culturais e comerciais.
Em visita que fiz a Portugal há poucos dias, entreguei o prêmio Camões a Chico Buarque. Essa premiação, que agraciou filhos ilustres de Cabo Verde, como Arménio Vieira e Germano Almeida, é uma celebração à cultura, às artes, à democracia e aos ideais de liberdade.
Hoje olho com admiração para a democracia cabo-verdiana, exemplo de maturidade política para a África e para o mundo.
No Brasil, a democracia resistiu às investidas do totalitarismo. Defendê-la e fortalecê-la é objetivo permanente de meu governo.
Nenhum democracia será plena sem inclusão social e combate a todas as formas de preconceito e discriminação.
O Brasil ainda tem contas a acertar com seu passado de escravidão.
Não transigiremos com o racismo. Para me ajudar nessa tarefa recriei o ministério do Igualdade Racial. Para ampliar a diversidade, determinei o preenchimento de no mínimo 30% de cargos comissionados na administração federal por negros e negras.
Também adotaremos medidas que facilitem o acesso da população negra ao trabalho, à renda, à terra e à educação.
No meu governo, a Fundação Cultural Palmares voltará a ser um ícone de resistência e preservação do legado e da cultura afro-brasileira.
Senhor primeiro-ministro,
Retomarei, em breve, meu roteiro de visitas ao continente africano para a Cúpula dos BRICS, na África do Sul, e para a Cúpula da CPLP, em São Tomé e Príncipe.
Como fiz no passado, irei a muitos outros países-irmãos africanos, e pretendo reencontrá-lo em Cabo Verde.
Peço, pois, a todos os presentes que me acompanhem num brinde à saúde do primeiro-ministro Correia e Silva e à prosperidade do povo cabo-verdiano.
Muito obrigado.