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Zezé Motta e Tom Farias Agitam Último Domingo da 35ª Felib
A noite do domingo (16) foi marcada em Brasília pela participação da cantora e atriz Zezé Motta e do escritor Tom Farias na 35ª Feira do Livro de Brasília (Felib). Os dois agitaram a Arena Outras Leituras em um diálogo direto com o público, onde se posicionaram sobre a maior parte dos temas referentes à população negra contemporânea.
Zezé falou de sua carreira de atriz e do filme Carolina, do cineasta Jeferson De – de 2003, no qual interpretou Carolina Maria de Jesus. “Não dava para manter distância dos sofrimentos dela, pois o que ela enfrentou foi muito da vida de outras pessoas da sua época”, disse detalhando os desafios de reviver a escritora. O filme teve como base a obra mais famosa de Carolina: Quarto de Despejo – Diário de Uma Favelada.
O livro também inspirou Farias que apresentou sua obra Carolina: Uma Biografia, recém-lançada pela Editora Malê. Mas, para chegar à publicação ele foi além: estudou mais de 500 trabalhos, entre teses, dissertações e recortes de jornais para trazer o retrato de uma Carolina que não estava nos livros que ela própria escreveu. “Eu quis fugir da imagem que todos têm dela, aquela do ‘Quarto de Despejo’. Fui em busca da Carolina que escreveu a História do Brasil sob a ótica do negro, sobretudo de uma forma poética, fabular e antropológica entre outros aspectos”, ressaltou.
De acordo com o escritor, Carolina quebra um paradigma social, pois, com sua baixa escolaridade, venceu pela escrita. Zezé, enfatizou que o livro de Farias tem muito a dizer, especialmente para as mulheres brasileiras que têm uma realidade próxima a de Carolina. “É necessário vencer apesar de todas as adversidades”, disse relembrando, ainda, as primeiras lutas do Movimento Negro.
Racismo velado – Zezé Motta e Tom Farias fizeram um paralelo entre a década de 1970 e a atualidade: “O racismo era velado e éramos acusados de importarmos problemas que o Brasil não tinha. Hoje, com as redes sociais, não se tem como fugir, todo mundo diz o que de fato pensa, seja protegido ou não pela rede”, afirmou a atriz. “Também pelo racismo, a história do negro é mal contada há 500 anos, e, pouco se faz para que essa realidade seja modificada”, complementou Farias.
O escritor abordou ainda o Art. 26-A da Lei nº 9.394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –, com redação dada pela Lei 10.639/2003, que estabelece o ensino da História e Cultura Afro-brasileira e Africana nas escolas públicas do Brasil. “É uma lei justa. Vamos continuar em busca de que seja implementada em todas as escolas”. Ele apontou um tópico importante a ser trabalhado pelo Estado: “Existem materiais, mas os nossos professores infelizmente não estão preparados para absorverem esse conhecimento”.
Mercado artístico e literário negro – Quando o assunto é a abertura dos espaços artísticos e do mercado editorial para negras e negros, as barreiras são múltiplas. Ao relembrar seus primeiros momentos como atriz, Zezé resgatou que nesse universo, os negros estavam sempre em papéis onde não tinham família, eram escravizados ou serviçais. “Você pegava o book de um ator e, além de constantemente desatualizado pela falta de oportunidades, ele estava limitado a experienciar apenas esses personagens”, desabafou.
Do auditório, a modelo e atriz Simone Ramos se identificava com as falas da referência no palco. “Zezé é uma mulher guerreira que, com sua luta, nos incentiva a acreditar na nossa história”, disse emocionada. No evento, Simone estava como ponte entre Zezé Motta e as mulheres e meninas das comunidades nas quais ela é referência – Ceilândia e o Quilombo Mesquita. “A mensagem que levo da Zezé é que não podemos desistir. Precisamos nos envolver mais com a nossa cultura para enfrentar os desafios e alcançarmos um futuro melhor”, disse.
A 35ª Felib foi encerrada com Zezé interpretando várias maneiras de amar em canções como Trocando em Miúdos, Soluços, Fez Bobagem, Pérola Negra, Crioula. O pocket show foi marcado pela canção Tigresa, música de Caetano Veloso em homenagem à Zezé. A noite terminou em festa com as pessoas que compunham o público sambando no palco a convite da cantora.