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Quilombolas do Maranhão debatem Lei de Consulta
Reunião entre os quilombolas de Alcântara sobre Lei de Consulta
Por Daiane Souza
Pelo menos 100 lideranças quilombolas do Estado do Maranhão participam de atividades que integram o projeto Territorialidade e dignidade: fortalecimento das lutas quilombolas de Alcântara frente ao avanço da Base Espacial. Nas etapas do encontro que acontece até o fim do ano, eles debatem o direito a consulta prévia, garantido aos povos tribais do mundo pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Promovido pela Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), com financiamento da Ford Foundation, o evento proporciona o esclarecimento de dúvidas quanto ao que é considerado consulta prévia. Em 20 anos de existência, a Convenção 169 vem acumulando experiências na implementação dos direitos reconhecidos a esses povos, garantindo sua autonomia para decidir sobre o controle de suas próprias instituições, formas de vida e desenvolvimento, além de tratamento penal.
A Lei de Consulta, um dos direitos estabelecidos pela OIT, ainda está em construção no Brasil, e dá às comunidades tradicionais – quilombolas, indígenas, ribeirinhos, e ciganos – autonomia para administrar as próprias terras e recursos naturais. O princípio do documento é assegurar o entendimento pacífico entre essas comunidades e os desenvolvedores de grandes obras que possam afetá-las.
Exemplos que podem ser citados no caso do país são a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (Pará), a transposição do Rio São Francisco, a Usina Hidrelétrica de Santo Antônio (Roraima) e a Base Aérea de Alcântara (Maranhão). Somente no município de Alcântara, mais de 200 comunidades quilombolas são diretamente ou indiretamente afetadas pela Base Aérea. Delas, 32 estão sendo realocadas para outras áreas.
Conciliação – De acordo com o presidente da Fundação Cultural Palmares, Eloi Ferreira de Araujo, com a consulta prévia pode ser viável a conciliação entre as partes – comunidades tradicionais, grandes empresas e governo. “Uma grande obra traz impactos a várias populações. Mas com respeito e trabalho conjunto essas transformações podem ser positivas de modo a colaborar para o desenvolvimento das comunidades”, afirma.
Nesse sentido, todas os quilombos certificados que enfrentam ou podem vir a enfrentar efeitos de grandes construções são acompanhadas juridicamente pela procuradoria federal junto à instituição. “É nosso papel orientar as comunidades sobre seus direitos e acompanhar se estão sendo cumpridos”, destacou o presidente.
Em reunião realizada no último dia 19, o assessor jurídico da SMDH, Igor Almeida, destacou a necessidade de publicidade e transparência dos processos. “A expansão da Base Espacial de Alcântara entre 2004 e 2005 não passou por este processo e o Brasil foi por isso denunciado junto à OIT”, afirmou o advogado. Ele orientou as comunidades atingidas de como podem fazer valer outros direitos a partir da consulta, apesar das conseqüências.
Ele reforça que a consulta é um mecanismo para o consenso e não apenas uma simples participação dos povos em transformações impostas. “A consulta depende de um procedimento adequado, devendo haver um plano, o respeito a representatividade, a informação qualificada, pública e de fácil acesso e compreensão”, explica. “Se por acaso não houver acordo, a Consulta deve influenciar e motivar a decisão estatal”, completou.
As atividades terão continuidade, mas suas outras etapas ainda não foram divulgadas. Elas incluirão palestras, cursos modulares de formação e assistência jurídica para os quilombolas locais.