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Quilombolas albinos iniciam acompanhamento médico no Hospital Universitário
Moradores da comunidade quilombola Filus, de Santana do Mundaú, foram atendidos por uma equipe médica do HU para tratar de problemas ligados ao albinismo.
Diego Barros
Quilombolas albinos da comunidade Filus, de Santana do Mundaú, foram levados nesta segunda-feira ao Hospital Universitário, em Maceió, para iniciar um acompanhamento médico que visa prevenir e monitorar possíveis doenças provocadas pelo albinismo. A ação contou com o apoio do Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral) e o Instituto Irmãos Quilombolas. Desde a morte de Luzinete Isabel da Conceição, em 2008, vítima de câncer de pele, a preocupação entre os outros albinos da comunidade aumentou.
De acordo com o médico especialista em cirurgia plástica Fernando Gomes, eles têm mesmo motivos para se preocupar. “É bem provável que todos eles, em alguma fase da vida, desenvolvam tumores, por isso precisam de acompanhamento”, alerta o médico.
Ele explica que lesões sucessivas provocadas por exposição ao sol podem, ao longo do tempo, provocar alterações celulares e, com isso, gerar os tumores. Na manhã desta segunda-feira, oito dos nove albinos moradores da comunidade Filus foram atendidos por ele e por outros médicos do Hospital Universitário.
Segundo Fernando Gomes, os tipos mais comuns de tumores que podem aparecer em albinos são o espinocelular, o melanoma ou o basocelular. Para tentar evitar o aparecimento de tumores, o médico recomenda alguns cuidados, como usar sempre boné ou chapéu, de preferência com proteção para a nuca e as orelhas, roupas de mangas longas, protetor solar e realização de exames pelo menos duas vezes ao ano.
Segundo Cláudio Cavalcante, médico especialista em cirurgia de cabeça e pescoço que também prestou atendimento aos quilombolas albinos, é mais comum que esse tipo de câncer apareça a partir dos 40 anos e que 85% dos cânceres de pele envolvam a cabeça ou o pescoço. A médica Edna Tenório também participou deste primeiro contato com os quilombolas albinos.
De acordo com o médico Fernando Gomes, que já fez uma visita à comunidade Filus, alguns dos fatores que provocam o aparecimento do albinismo são a base da consaguinidade e o perfil genético, ou seja, o casamento entre pessoas da mesma família, como primos. Isso ocorre em Filus e, segundo o médico, será levado em consideração. “A avaliação do grupo dos não-albinos também será importante, por isso eles passarão por alguns exames”, comenta.
Segundo o médico, o primeiro passo do acompanhamento dos albinos será encaminhá-los para os setores de clínica médica, genética e dermatologia, que deverão solicitar exames para diagnosticar ou não o aparecimento de alguma doença. Após essa fase eles deverão retornar ao hospital pelo menos duas vezes ao ano para a realização de novos exames.
Outros problemas – Além da particularidade dos albinos, a comunidade Filus é carente de uma série de outros serviços. Um deles é o acesso ao local, que fica a mais de nove quilômetros da sede do município de Santana do Mundaú, e precisa de melhorias.
Outro problema antigo é a água para o consumo. Segundo Cícera Vital, presidente do Instituto Irmãos Quilombolas, na comunidade há um alto índice de esquistossomose, doença contraída pelo consumo da água contaminada, que também é usada para banhar animais e lavar roupa. Também faltam banheiros, muitas casas ainda são de “taipa”, e algumas pessoas já estão com a doença de Chagas.
O presidente do Iteral, Geraldo de Majella, disse que o instituto vai continuar acompanhando e dando apoio aos moradores da comunidade Filus, que já foi reconhecida oficialmente como remanescente de quilombos em 2006. “Vamos procurar a Secretaria de Estado da Saúde para trabalhar com o HU, e acreditamos que deve haver problemas de saúde semelhantes em outras comunidades”, afirmou Majella. “O trabalho de organização é para que o Estado assuma suas responsabilidades e inclua essas pessoas, que há séculos já vêm sendo excluídas dos serviços de cidadania”, completou.
Segundo ele, o Iteral está concluindo a elaboração de um mapeamento etnográfico das comunidades quilombolas de Alagoas que ainda não foram certificadas oficialmente pela Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura. Esse mapeamento faz uma descrição das condições sociais, econômicas, histórias e geográficas de cerca de 30 comunidades quilombolas e vai ajudar o Estado a direcionar suas ações. Ainda segundo ele, o Iteral está realizando um trabalho de sensibilização dessas comunidades para obter a certificação junto à Fundação Palmares.
Entre as mulheres albinas de Filus, a mais velha é dona Deusa da Silva, de 52 anos. Ela conta que quando se expõe ao sol sente coceira na pele, que chega a descamar. Mas ela está otimista em relação ao acompanhamento médico iniciado nesta segunda-feira. Dos nove albinos de Filus, a mais nova é Tais, de apenas cinco meses, filha de Cleone Severino da Silva, que não é albina. A mãe espera aprender como cuidar melhor da filha e que ela não desenvolva nenhuma doença.