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Festa e consciência no primeiro dia do AfroPop
Margareth Menezes e seus convidados agitaram as cerca de três mil pessoas que estavam no Cais Dourado, em Salvador, ontem (7). Os tambores do Ilê Aiyê e os tambores de pneus de Peu Meurray e os Pneumático, os vozerões Margareth e Alcione e o violonista Diego Figueiredo embalaram a festa do primeiro dia do Movimento AfroPop Brasileiro.
O palco, sob direção artística de Bia Lessa, foi montado sobre caixas de sabão em pó, embalagens de palha de aço e de biscoito. Nas paredes circulavam pequenos versos e ditos populares, como “diga-me com quem andas e te direi se vou contigo”. E, ontem, com Margareth Menezes e seus convidados foram todos, embalados pela música e pela alegria.
Já, hoje (8), o show foi de cidadania. Na sede do Ilê, no Curuzu, bairro da Liberdade em Salvador, o Giro Cultural girou em torno de histórias de raça e força de cinco personagens negras: Margareth Menezes, a atriz Zezé Motta, a vereadora de Salvador, Olívia Santana (PCdoB), Vovô do Ilê e de Zulu Araújo, presidente da Fundação Cultural Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura.
Os convidados, jovens e adolescentes de 16 a 24 anos, ouviram os relatos de vida e as experiências de negros que precisaram se impor para garantir seu espaço. “Sempre enfrentei os desafios, não me deixei intimidar, mas nunca tive ninguém para me dar incentivo, por isso criamos este espaço, o Giro Cultural, para que seja um momento de reflexão”, explicou Margareth.
“Eu fiz limonada do limão que a vida me deu. E é sobre isso que quero falar, chega de filhos de negros mortos se tornarem números de estatísticas. É preciso afirmar nossa negritude, não estamos aqui de penetras, tem algo que nos pertence e temos que resgatar”, disse Olívia, que quando passou no vestibular era faxineira.
“Minha mãe foi faxineira e eu não queria ser isso na vida, não está no nosso DNA ser faxineira. É uma profissão digna, mas podemos ser outras coisas, temos que ter um projeto de vida, se não o capitalismo selvagem e racista arruma um projeto para a gente. Vocês têm que estudar, fazer seus planos. O projeto de vocês não deve ser conhecer a Disney, mas sim a África, suas raízes, suas essências”, ressaltou a vereadora, que também é pedagoga.
As histórias, todas muito parecidas. Zezé – filha de costureira – contou a sua saga e as dificuldades enquanto atriz. “Até depois de todo meu sucesso no cinema com Chica da Silva, onde ganhei todos os prêmios que se pode ganhar no cinema, só me ofereciam trabalhos como empregada doméstica”, contou.
Vovô, do Ilê, contou que o sonho era apenas ser um bloco de carnaval e hoje o Ilê Aiyê tem escola de percussão, de canto, de dança, de cidadania Band`Erê, escola profissionalizante de cozinha, além do projeto de extensão pedagógico do Ilê. Tem também a turnê: “Ilê o mais belo dos Belos” e o centro cultural senzala do Barro Preto. O espaço que o Ilê ocupa hoje é o maior espaço de área construída para uma entidade negra na América Latina – 10 mil m2 .
Zulu Araújo, um dos primeiros arquitetos negros da Bahia explicou o papel institucional da Fundação. “Hoje, estou diretor de uma instituição governamental que tem por princípio formular e implantar políticas públicas para potencializar a participação dos negros no processo de desenvolvimento a partir de sua história e sua cultura”.
“Essas histórias que vocês ouviram são reais, vividas, diferente das novelas”, alertou Margareth, depois que os participantes contaram situações em que foram vítimas de racismo.
“Cerca de 98% das cidades não tem cinema, 50% não tem teatro. Ficamos a mercê do que passa na televisão. É preciso tomar cuidado, pois tem muita coisa grosseira, muita música ruim, coisas que estão poluindo a cabeça de vocês. Falar de sexo é bom, fazer sexo é bom, mas não precisa ser só isso e tem que ser tratado de forma saudável, respeitosa. Não somos animais. Essas pessoas que estão aqui podem falar de outra forma de cultura, atentou Margareth”.
Ao final, uma das alunas, emocionada, percebendo a semelhança das histórias, fez um chamado aos seus colegas, “até quando o script de nossas histórias será esse. Está mais do que na hora de mudarmos isso”.
Os alunos são jovens da Liberdade e da ONG Fábrica Cultural, mantida por Margareth Menezes.
O movimento AfroPop Brasileiro é patrocinado pela Fundação Palmares e ainda terá mais três edições – dias 21 e 28 de janeiro e 4 de fevereiro, sempre a partir das 20h no Cais Dourado, no Comércio, em Salvador e o Giro Cultual no dia seguinte aos shows.
Na Palmares, a iniciativa é coordenada pelo Departamento de Fomento e Promoção da Cultura Afro Brasileira, comandado por Elísio Lopes.
Assessoria de Comunicação da FCP