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ESPECIAL
110 ANOS DE ABDIAS DO NASCIMENTO: UM LEGADO DE RESISTÊNCIA
Nesse (14) de março, a Fundação Cultural Palmares (FCP) preparou um especial pela memória de Abdias do Nascimento, um dos maiores expoentes intelectuais dedicados à cultura Afro-brasileira do século XX.
Figura central pela luta dos direitos civis e pela igualdade racial no Brasil, é um ícone cuja trajetória transcendeu na memória do povo negro. Considerado por muitos estudiosos o maior intelectual pelos estudos africanos do país, é sinônimo de resiliência e determinação.
Convidamos você leitor e leitora, a conhecer a vida e o legado que se estende há 110 anos, desse visionário, o qual seu feito, ultrapassa o tempo e as barreiras da racialidade.
Elisa Larkin Nascimento, esposa de Abdias, presidente e fundadora do Ipeafro, descreve o legado do político como o ativista mais completo do mundo africano do século XX, em razão de sua atuação nas artes, na política, no pensamento acadêmico e no ativismo antirracista.
“Abdias foi poeta, curador, teatrólogo, artista visual, professor universitário, deputado federal e senador. Fundou o Teatro Experimental do Negro, o Museu de Arte Negra, o jornal Quilombo e o Ipeafro. Foi autor de conceitos teóricos e de práticas políticas e culturais de defesa e promoção da população negra no Brasil e no mundo, como o Quilombismo, o Genocídio do Negro Brasileiro, e as primeiras propostas legislativas ao Estado brasileiro de políticas públicas para criminalizar o racismo e promover a igualdade racial”, enfatiza Elisa.
Trajetória
Infância e Juventude
Abdias do Nascimento nasceu em 14 de março de 1914, no município de Franca, no estado de São Paulo. De família pobre, seu pai José do Nascimento (Sapateiro), e sua mãe Josina do Nascimento (doceira), sempre o incentivaram nos estudos.
Aos 11 anos, ao frequentar a escola Ateneu Franco, teve que aprender desde cedo a lidar com as dificuldades decorrentes do preconceito racial. Mais tarde, formou-se em contabilidade. Já em sua primeira experiência profissional, ao ser contratado para trabalhar na administração de uma fazenda em Franca, Abdias sofreria novamente com o racismo, mas optaria por enfrentar a situação e não se curvar, preferindo abandonar o emprego.
Tal experiência tornaria combustíveis para suas lutas pelos direitos civis. Na capital, além de seguir a carreira de militar, o jovem Abdias não deixaria de lado os estudos e entrou para a faculdade de economia da Escola de Comércio Álvares Penteado, onde se deparou com a dura realidade do racismo institucional.
Teatro Experimental do Negro
Durante a década de 1930, envolveu-se em movimentos políticos e sociais no Brasil, destacando-se como militante antirracista.
Em 1938, foi preso por liderar uma manifestação contra o racismo no Teatro Municipal do Rio de Janeiro enfrentando a prisão, mas deixando claro que sua voz não seria silenciada.
Participou da fundação do Teatro Experimental do Negro em 1944, uma plataforma inovadora que buscava redefinir a narrativa cultural afro-brasileira. Por meio da arte, o teatro se tornou um espaço de resistência, desafiando estereótipos e celebrando a riqueza da herança africana.
Em 1945, Abdias do Nascimento participou da fundação do Congresso Afro-Brasileiro, uma organização que buscava promover a igualdade racial no Brasil. Ao longo dos anos, continuou a trabalhar para sensibilizar a sociedade sobre a importância da igualdade racial.
Escritor e Intelectual
Foi autor de diversos livros, artigos e peças teatrais que abordavam temas relacionados à cultura afro-brasileira, discriminação racial e história do povo negro. Entre suas obras mais conhecidas está "O Genocídio do Negro Brasileiro: Processo de um Racismo Mascarado." Além das fronteiras do Brasil, Abdias levou sua luta para o cenário internacional. Participou de conferências, denunciou a apartheid na África do Sul e tornou-se uma voz global pela igualdade racial.
Político
Eleito deputado federal, Abdias do Nascimento continuou sua luta nos corredores do poder. Sua presença política foi uma extensão de sua missão, ampliando o alcance de sua voz na promoção da igualdade racial. As organizações por ele fundadas persistem na busca por um Brasil mais inclusivo.
Durante o exílio, trabalhou com Leonel de Moura Brizola para criar a organização que viria o Partido Democrático Trabalhista (PDT) do Brasil. Como resultado dos esforços pioneiros de Abdias, o partido incluiu a questão do racismo e da discriminação racial como prioridade no seu programa político nacional, também liderou a organização do movimento negro dentro do partido.
Como parlamentar brasileiro, participou dos simpósios regionais e internacionais das Nações Unidas em apoio à Luta do Povo da Namíbia pela sua Independência. Em 1991, tornou-se o primeiro senador afrodescendente a dedicar o seu mandato à promoção dos direitos civis e humanos do povo negro do Brasil.
Alguns anos depois, em 1999, Abdias assumiu como primeiro titular da nova Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Em 1995, foi eleito Patrono do Congresso Continental dos Povos Negros das Américas, realizado no Parlamento Latino-Americano em São Paulo, na ocasião do Centenário da Imortalidade de Zumbi dos Palmares.
Cofundador da Fundação Cultural Palmares
Também foi um dos principais atores no processo de criação da Fundação Cultural Palmares (FCP), órgão vinculado ao Ministério da Cultura para assuntos afro-brasileiros, bem como na instituição do Dia Nacional da Consciência Negra, dia 20 de novembro, aniversário da morte de Zumbi dos Palmares. Com o tempo, esta data tornou-se feriado oficial em diversos municípios e Estados da Federação e hoje é reconhecido e comemorado em escolas e centros culturais em todo o país, além de ser um feriado nacional.
Morte
Abdias do Nascimento, falecido em 23 de maio de 2011, aos 97 anos, deixou um legado que transcende sua existência física. Sua trajetória é um chamado à ação, um convite para continuarmos a luta por um mundo onde as fronteiras da cor se dissolvam e a igualdade prevaleça. Sua vida é continuará sendo um farol a iluminar o caminho para um futuro mais justo e inclusivo.
Reconhecimento e Homenagens
Durante toda a sua vida, Abdias recebeu prêmios e homenagens, reconhecendo seu papel essencial na promoção da igualdade racial. Sua trajetória é um convite para todos nós continuarmos a caminhar rumo a um futuro onde as fronteiras da cor não mais existam. Participou ativamente de conferências internacionais, denunciando a apartheid na África do Sul e defendendo os direitos dos afrodescendentes em escala global. Sua visão transcendeu fronteiras, inspirando a busca por justiça racial em diversos países.