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Em meio a polêmica sobre território, comunidade de Mesquita (GO) sedia Plenária Nacional Quilombola
Fotos: Ana Carolina Fernandes
A cerca de 50 quilômetros de Brasília, vivem remanescentes de quilombo da comunidade de Mesquita, com construções centenárias e costumes tradicionais. Pouco conhecido pelos brasilienses e moradores do entorno da capital federal, o território localiza-se no município de Cidade Ocidental (GO) e completou 272 anos no último dia 19 de maio, com o desafio de manter sua área e identidade.
Recentemente, Mesquita ganhou destaque na mídia por conta de uma discussão sobre possível redução no tamanho da comunidade. O pedido para esta mudança junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) partiu da Associação Renovadora Quilombo Mesquita. Diante de questionamentos dos quilombolas sobre a representatividade desta associação, o Incra prometeu rever o processo em sua área técnica.
Em meio à polêmica, na última semana, Mesquita sediou pela primeira vez a Plenária Nacional da Coordenação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). O evento contou com a presença de mais de 90 lideranças de 24 estados, que relataram diferentes desafios enfrentados em todo o país. Os remanescentes também expressaram solidariedade e preocupação com o risco de redução do território de Mesquita.
“Você não está apenas reduzindo a terra e sim uma história. O que me entristece é a maneira como eles abordam as pessoas da comunidade como se não fosse direito do quilombola lutar pelo seu território; como se estivesse buscando o que não é dele. Grande parte dos territórios quilombolas em alguma medida foi usurpada”, critica Antônio Crioulo, líder da Comunidade das Crioulas, em Pernambuco.
Já Bernadete Pacífico, líder do quilombo da Pitanga dos Palmares e líder religiosa de matriz africana, em Simões Filho (BA), teme que disputas de terra como a de Mesquita aumentem a violência contra os quilombolas, já considerada grave. Bernadete perdeu seu filho de 31 anos no ano passado. O rapaz foi assassinado devido a uma disputa com grileiros de terra. Moradores de Mesquita revelam que vêm sofrendo constantes ameaças para abrir mão de parte de suas terras.
“Reduzir o Território de Mesquita pode abrir uma brecha para que diminuam as áreas de outras comunidades quilombolas do Brasil”, observa Arilson Ventura, liderança do Espírito Santo.
Outros temas em debate
As mulheres também tiveram oportunidade de discutir os direitos para o público feminino nas comunidades quilombolas. Os principais problemas levantados foram a violência dentro das comunidades e as perseguições contra as lideranças e profissionais de educação. “Nas escolas, as professoras não podem ensinar a cultura quilombola aos alunos. São obrigadas a ocultar a sua identidade”, conta, angustiada, Sandra Braga, liderança de Mesquita.
Diversas apresentações culturais de artistas quilombolas dos estados brasileiros tiveram canto, dança e cor na Plenária. “Estou gostando muito manter contato com outros quilombos do Brasil. Estou conhecendo meu país sem sair de casa”, afirma Nara Denise, moradora de Mesquita. Os visitantes também se informaram sobre as história local, visitando o Museu Ponto de Memória, que reconstitui a trajetória da comunidade.
“Sou morador do Quilombo Mesquita, nascido e criado nesse chão. Aprendi aqui tudo que meus pais me ensinaram e a coisa mais importante foi cuidar da terra, pois dela nasce tudo: a água que bebemos e o marmelo com que faço o doce. Não vão conseguir tirar a nossa terra porque todos que vieram até aqui estão nos apoiando e nossa causa já ganhou dimensão nacional”, ressaltou, emocionado, o produtor João Antônio Pereira.
Texto: Walisson Braga. / Colaborou: Vinícius Aleixo de Lima.