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Comissão de Direitos Humanos do Senado debate ações para comunidades quilombolas
Brasília – 28/05/2008 – A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado debateu nesta quarta-feira (28), algumas das políticas do governo Lula voltadas às comunidades quilombolas.
De acordo com o senador Paulo Paim, presidente da Comissão, o evento é importante “para dar maior visibilidade à questão não só dos quilombolas, mas também às questões gerais de interesse do negro brasileiro”. Ele lembrou que este foi o último dos ciclos de debates realizados durante todo o mês de maio sobre a comunidade afro-brasileira.
Estiveram presentes representantes de diversos órgãos governamentais, bem como de algumas comunidades quilombolas que enfatizaram como principal ação a mobilização e união entre governos federal, estadual e municipal na luta pela melhoria de condições de vida da população quilombola.
O coordenador geral de regularização territorial de quilombos do Incra, Rui Almeida, apresentou alguns dados que o Instituto tem alcançado nos últimos anos. Segundo ele, até agora foram emitidos apenas 97 títulos de propriedade para as áreas quilombolas, beneficiando 150 comunidades e 2.356 famílias. Segundo ele, a principal dificuldade é a falta de servidores e especialistas, principalmente antropólogos, para suprirem o enorme número de relatórios técnicos que devem ser realizados para agilizar o processo de titulação das terras. De acordo com seu relato, a verba destinada para ações de estudo, demarcação e titulação aumentou consideravelmente nos últimos anos. De R$ 3,5 milhões passou para R$ 7,2 milhões. O que demonstra a preocupação do governo Lula com as políticas para essas comunidades.
Educação
Preocupantes entraves foram relatados na área educacional. A representante da Coordenação da Diversidade e Inclusão Educacional do Ministério da Educação (MEC), Maria Auxiliadora Lopes, apresentou sérios problemas enfrentados pelo órgão, principalmente, nas relações com estados e municípios. “Cerca de 97% das escolas direcionadas às comunidades remanescentes de quilombos estão na área rural, o que dificulta nosso trabalho, pois essas escolas ficam sob responsabilidade de pequenos municípios. Um grande problema, é que os gestores, tanto municipais quanto estaduais, não são capacitados e, muitas vezes, não têm interesse em trabalhar com essas comunidades. E tem ainda a falta de professores qualificados para educação de relações sociais e a falta de material didático específico”, relatou ela.
Outra dificuldade apresentada por Maria Auxiliadora foi quanto aos impedimentos legais na hora de construir. “De 2004 para cá, construímos apenas 64 salas de aula nas comunidades, mas não por falta de verba, mas sim por conta da legislação, dinheiro tem”. Referindo-se à Instrução Normativa nº 01 da Secretaria do Tesouro Nacional, que só permite construções caso se comprove a propriedade do imóvel, mediante certidão emitida por cartório. Situação muito difícil para as comunidades quilombolas que vivem, a maioria, em conflito de terras com fazendeiros ou grandes empresas. Mesmo assim, a representante do MEC citou algumas das metas do Ministério até 2010: construção de 950 salas de aula; distribuição de 280 mil exemplares de livros sobre cultura afro-brasileira; e formação continuada de 5.400 professores.
A mesma situação foi colocada por Sandra Maria Braga, representante da comunidade quilombola de Mesquista. “Infelizmente, os municípios não estão abraçando a causa como deveriam, tanto na área da educação como na da saúde, entre outras que têm projetos voltados para os quilombos`, lastimou.
A subprocuradora-geral da República Débora Duprat, afirmou que o governo Lula foi o que acolheu a causa quilombola, quando instituiu o Decreto 4.887/2003 e revogou o decreto anterior, que, segundo ela, “era excludente, hegemônico e claramente inconstitucional”. E afirmou: “temos hoje uma prática de estado que gera uma ação constitucional de proteção às comunidades quilombolas”.
No entanto, chamou a atenção para as legislações que muitas vezes vão contra qualquer ação positiva para esses povos, como, por exemplo, as escolas que não podem ser construídas e o direito à terra dos quilombolas. “Uma pessoa precisa morar no local por dez, vinte anos para conseguir a posse, enquanto os quilombolas precisam comprovar cem anos de ocupação. É preciso discutir essa legislação e desfazer as amarras”, argumentou Débora.
Saúde
O professor-doutor em Ciência da Saúde, Pedro Sadi Monteiro, da Universidade de Brasília, que foi o responsável pelos primeiros trabalhos de campo no governo Lula em algumas regiões quilombolas, falou sobre suas experiências nessas comunidades e apontou os principais problemas: “falta de água; falta de saneamento básico; meio ambiente poluído; além da terra que é pequena, mesmo para agricultura de subsistência”. Sadi comentou também que a visita do presidente Lula à comunidade de Engenho II, no Piauí, foi de extrema importância para levar o tema à sociedade e para o desenvolvimento de ações efetivas que antes não se tinha, “foi um marco para iniciar as atividades nas comunidades quilombolas”.
Mesma opinião apresentou Johnny Ferreira dos Santos, representante da Fundação Nacional de Saúde (Funasa): “Desde 2004 a Funasa tem como prioridade atender as comunidades quilombolas. Há uma grande preocupação do governo com projetos voltados para a saúde dos povos quilombolas”.
Como meta, a Fundação apresentou o saneamento de 380 comunidades, através do Pac/Funasa, até o fim do governo. Juntando com outras 146 comunidades que já foram beneficiadas, o instituto alcançaria uma meta de 526 comunidades beneficiadas, “superando todas as ações dos anos anteriores”, complementa. O problema, segundo Johnny, é que a falta de envolvimento na causa de estados e municípios, além da falta de projetos técnicos de engenharia e outros aspectos relacionados à operação e manutenção dos sistemas inviabilizam que mais comunidades sejam atendidas.
Assim como Johnny dos Santos, o representante da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades, Antônio César Ramos, também citou os mesmos problemas para realizar projetos de construção de casas nas comunidades quilombolas, como a falta de capacitação de técnicos e de parceiros para concretizar as ações. “É preciso haver um órgão intermediário entre a União e os beneficiários para fazer essa ponte”, afirmou.
Sensibilidade
A coordenadora da Comissão Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, Gilvânia Maria da Silva, enfatizou a necessidade da participação dos parlamentares opositores aos projetos quilombolas, como também, do Estatuto da Igualdade Racial.
Gilvânia também pediu um melhor relacionamento entre as diferentes esferas do governo executivo (federal, municipal e estadual). “Precisamos que os gestores tenham um mínimo de sensibilidade com nossa situação”, falou. Depois, apresentou algumas das dificuldades que o Senado deve enfrentar, mas que deve lutar para garantir os direitos das comunidades tradicionais: “Os senadores precisam consolidar os meios legais já existentes, como o artigo 68 da ADCT da Constituição Federal e o Decreto 4.887. E formar parcerias com estados e municípios, pois tem estado que não colocou um centavo em seu orçamento voltado para essas ações”.
A representante da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, Oraida Abreu, apresentou as metas da Agenda Social Quilombola. Ela lembrou que, para melhorar as ações de atendimento às comunidades é preciso haver um trabalho com diversos órgãos ministeriais, juntamente com a sociedade, para que as desigualdades sejam efetivamente reduzidas.
Marcus Bennett