Notícias
Começa, em Brasília, o Seminário Internacional
Ministra da Seppir, Luiza Bairros, ministra da Cultura, Ana de Hollanda, presidente da FCP, Eloi Ferreira de Araujo e embaixador Paulo Cordeiro.
Por Drielly Jardim
Aconteceu nesta segunda-feira (20), no Museu Nacional da República em Brasília, a cerimônia de abertura do Seminário Internacional “Herança, Identidade, Educação e Cultura: gestão de sítios históricos ligados ao tráfico negreiro e à escravidão”.
A iniciativa, que tem como objetivo incentivar o turismo de memória nos locais ligados ao tráfico negreiro e à escravidão, é resultado de uma parceria entre a Fundação Cultural Palmares (FCP) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), com o apoio dos Ministérios da Cultura, Educação, Turismo, Relações Exteriores e patrocínio dos Correios.
Durante a solenidade, o presidente da FCP, Eloi Ferreira de Araujo, ressaltou que um dos objetivos do Seminário Internacional é refletir sobre a identidade nacional brasileira e a necessidade de inventariar os sítios históricos ligados ao tráfico negreiro e à escravidão.
Eloi Ferreira de Araujo também lembrou que o início do resgate da valorização dos símbolos negros brasileiros se deu com o Parque Memorial Zumbi dos Palmares, localizado na Serra da Barriga – AL, e aproveitou o momento para lançar oficialmente a candidatura do Cais do Valongo à Patrimônio Cultural da Humanidade.
“O Cais do Valongo foi o maior porto de entrada de africanos no Brasil. É um sítio histórico rico em memória e deve ser compartilhado com todos, por isso, deve se tornar Patrimônio Cultural da Humanidade”, defendeu o presidente da FCP.
A ministra da Cultura, Ana de Hollanda, afirmou que a realização do Seminário representa bem a posição do governo brasileiro em relação ao povo de ancestralidade africana e lembrou que as recentes discussões sobre as cotas movimentou toda a sociedade civil. “Assim como outras que estão por vir, essa discussão foi muito importante, porque não dá para tratar de forma igual os desiguais, temos sim que ter um tratamento desigual”, disse.
A ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), apontou a candidatura do Cais do Valongo à Patrimônio Cultural da Humanidade como o reconhecimento da contribuição dos descendentes de escravos para a construção do Brasil.
“Apesar de todos os avanços que nós já obtivemos enquanto sociedade, no que se refere à igualdade racial, ainda somos um país que lida muito mal com o seu passado escravista. Teremos a chance de transformar aquele sítio (Cais do Valongo) em símbolo da nossa luta pela democracia racial”, garantiu.
O representante da UNESCO no Brasil, Lucien Muñoz, lembrou aos participantes que o Seminário será “uma oportunidade para analisar as melhores práticas de turismo de memória e identificar novas abordagens sobre o tema, além de desenvolver diretrizes claras para o desenvolvimento de um manual que deve capacitar os gestores responsáveis por esses sítios históricos”.
O secretário de Cultura do Distrito Federal, Hamilton Pereira, e a deputada Federal Erika Kokay, concordaram ao afirmar que o evento acontece em um momento em que o Brasil se debruça sobre si mesmo para melhor se reconhecer e que os brasileiros terão a chance de uma nova descoberta cultural, além de desfrutarem de um mergulho em sua africanidade.
Josefina Serra dos Santos, secretária de Políticas para a Promoção da Igualdade Racial do Distrito Federal (Sepir-DF), lembrou que esta também é uma contribuição para que a Lei 10.639/2003 (que torna obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-brasileira em todas as escolas brasileiras) seja cumprida. “Precisamos cobrar para que as determinações da Lei sejam cumpridas, pois esse é um dos instrumentos que temos para que o preconceito com os afrodescendentes e com os países do continente africano seja reduzido a cada dia”, finalizou.
O ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Carlos Alberto Reis de Paula, acredita que o encontro propicia um momento mágico para a cultura e a educação no Brasil. “Só se escreve o hoje, se olharmos para trás e para o futuro. Só se constrói um país se ele tiver memória e o Brasil não pode escrever sua história sem descobrir sua essencialidade na rota da escravidão”, disse.
Para Matilde Ribeiro, ex-ministra da Seppir e militante do movimento negro, o Seminário reforça a importância das políticas de igualdade racial no Brasil, entretanto, ela afirma que “a luta pela igualdade só terminará no momento em que tivermos efetiva igualdade em nosso país e quando tivermos igualdade em nosso futuro”, concluiu.
Palestras – Ainda pelo período da manhã foram realizadas duas palestras. A primeira, ministrada pelo embaixador Paulo Cordeiro Andrade Pinto, subsecretário-geral para África e Oriente Médio, retratou a Memória da África no Brasil.
Segundo Paulo Cordeiro, o Brasil não conhece realmente o continente africano e, por isso, não se reconhece em suas raízes. Para ele, o trabalho realizado pela UNESCO, juntamente com o seminário a Rota do Escravo, serve de instrumento para “diminuir a ignorância dos povos e dissipar a treva do desconhecimento à respeito das suas próprias origens”.
Para o embaixador, o Brasil aprendeu, nos últimos anos, a valorizar coisas que antes não eram percebidas. “O Brasil tem, por exemplo, o livro dos heróis brasileiros, onde o segundo nome é de Zumbi dos Palmares, entretanto, nós cultuamos o nosso nome muito pouco. Falta aos nossos jovens conhecer as referências importantes da nossa história”, ressaltou.
Hervé Barré, especialista em Turismo Cultural e Desenvolvimento da UNESCO, falou sobre “O que é turismo cultural?”. Para ele, o segmento é uma das principais formas de valorização da cultura e, posteriormente, de transformar a cultura em desenvolvimento econômico e social.
Barré ressaltou ainda que o turismo está mais democrático, principalmente porque os turistas têm reconhecido o valor dos patrimônios históricos e a as populações locais têm se mostrado aliadas à preservação dos seus sítios e da cultura.
O especialista frisou também que é preciso considerar o turismo como atividade favorável ao desenvolvimento e elaborar planos de gestão baseados no valor patrimonial a ser protegido, bem como criar mecanismo com vistas a envolver a indústria do turismo para incentivar turistas a ter um comportamento sustentável e democrático.
Reuniões Técnicas – O evento também reunirá, entre 21 e 23 de agosto, profissionais atuantes na preservação e promoção de sítios e lugares de memória ligados à escravatura, envolvidos em desenvolvimento de políticas públicas sobre o tema e pesquisadores, além de especialistas da África, das Américas, do Caribe, do Oceano Índico e da Europa.
As reuniões permitirão a criação de uma rede internacional de gestores de sítios de memória para o desenvolvimento das recomendações formuladas pelo Seminário, além de reafirmar a troca de experiências realizada durante as reuniões técnicas.
Um dos principais objetivos é a elaboração de um guia conceitual e metodológico dirigido aos gestores culturais, que deve facilitar a instalação de turismo de memória em torno dos sítios, lugares, monumentos e museus ligados ao tráfico negreiro e à escravidão.
Palmares completa 24 anos – Durante o Seminário, mais precisamente no dia 22 de agosto, a Fundação Cultural Palmares completa 24 anos de trabalho pela promoção, preservação, proteção e disseminação da cultura negra e afro-brasileira.
A data também será marcada com um show do cantor Carlinhos Brown, às 19h30, na sala Villa Lobos do Teatro Nacional Claudio Santoro. A apresentação será aberta ao público e promete levantar a plateia com sucessos como A Namorada e Tantinho, além de músicas que marcaram a época em que comandava a banda Timbalada.