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Publicado em 11/08/2009 07h00 Atualizado em 15/03/2024 12h48
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Por Marcus Bennett

Fundador da Escola de Capoeira Pôr do Sol dos Palmares (convidada especial para se apresentar nos 21 anos da FCP) o professor de educação física e mestre de capoeira desenvolve há 27 anos a formação de capoeiristas em todo o estado de Alagoas.

Mestre Cláudio conta que começou na capoeira já aos 12 anos, no Rio de Janeiro, sua cidade Natal, com o mestre Mauro Perneta. Hoje, com 54 anos, mestre Cláudio conta ainda estar aprendendo como driblar o preconceito e a discriminação contra a nossa cultura afro-brasileira.

Além de Educação Física, mestre Cláudio é massoterapeuta, biodanceiro e leitor corporal, com especializações em: Treinamento Desportivo, na Universidade Gama Filho, no Rio,  e, atualmente, em Educação Física Escolar, na Faculdade Tiradentes, em Alagoas. Em 1987, cursou na IPEAFRO (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-brasileiros), no Rio, o curso de Conscientização da Cultura Afro-brasileira, o qual desde então, tem feito o professor atuar fortemente na formação da educação de jovens e crianças por meio da capoeira.

Numa rápida entrevista ele conta um pouco da sua história e do seu grupo, que se apresenta no próximo dia 20, às 18h, na sede da Fundação Cultural Palmares.

FCP – Há quanto tempo o senhor trabalha com a capoeira e onde realiza esse trabalho?

Mestre Cláudio – Há 27 anos, venho ensinando e formando capoeiristas aqui em Maceió e em vários municípios de Alagoas, em Escolas das Redes Estaduais, Municipais, Particulares e Federais de Ensino. Em clínicas de Terapia Reichiana, Grotas, Favelas, Centros Sociais Urbanos, Centro de Ressocialização de Menores Infratores, Centro de Ensino e Instrução da Polícia Milita e do BOPE de Alagoas; Academias, e na Serra da Barriga, onde tudo começou.

FCP – Como surgiu a Escola de Capoeira Pôr do Sol dos Palmares?

Mestre Cláudio – Embora não tivesse dado um nome ao Grupo na época em que comecei a trabalhar com capoeira em Alagoas, em 1982, desenvolvi uma expansão nos ambientes escolares muito significativa, tendo passado a envergar o nome do Mestre que me formou em 87, o mestre Mário Hulk (já falecido), sendo que em 89, assistindo um pôr de sol na Serra da Barriga, resolvi dar o nome de Escola de Capoeira Pôr do Sol dos Palmares.

FCP – Sei que o senhor cuida também de um Centro Cultural chamado de Quilombo dos Palmares.


Mestre Cláudio – 
Participo de uma ONG chamada Instituto Magna Mater, por intermédio dela, há três anos, fui convidado a participar da construção do Parque Memorial Quilombo dos Palmares, no conceitual histórico, tendo a oportunidade de conhecer mais sobre a história do Quilombo e a partir daí, criei o Centro Cultural Quilombo do Palmares, tornado os demais seguidores do meu grupo de Mocambos, como por exemplo, Mocambo Berimbau Sagrado, Mocambo Berimbau Dourado, entre outros que já formamos.

FCP – Conte um pouco do seu trabalho na formação de alunos-capoeiristas.

Mestre Cláudio – Procuro ser o mais fidedigno possível, conforme os fundamentos que tive com meus mestres e com o que me transformou. A única diferença que adapto à minha didática com o que aprendi na faculdade, tal como: anatomia, primeiros socorros, recreação infantil, psicologia da aprendizagem, sociologia geral etc.

Hoje, observo visivelmente a mudança comportamental dos meus alunos de capoeira terapia, com base nos feed-backs passados pelos terapeutas que os assistem em consultório.

No meu modo de viver e sentir, a capoeira me desafia cada vez que um obstáculo aparece na minha vida, seja no trabalho, seja na minha família, seja no financeiro. Pois a nossa realidade aqui em Alagoas é de total desqualificação e menosprezo, pelo menos até que a conhecem e passem a amá-la, como eu. No fundo ela me ensina o exemplo de Ganga Zumba, Zumbi, dentre outros: a luta pela liberdade. E é isso que tento passar aos meus alunos.

FCP – O grupo realiza muitos eventos. Teve algum em especial?

Mestre Cláudio – Sempre somos convidados para contribuir com os alunos da rede pública na semana do folclore, na semana da consciência negra, com palestras, rodas e orquestra de berimbaus, onde acompanhamos o hino nacional. Além disso, faço um batizado por ano em cada mocambo (grupo) que sou mestre.

No entanto, ano passado, fiz um batismo diferente de todos o que já havia feito. Reuni quatro grupos na Serra da Barriga e realizei um batismo com um culto ecumênico, onde participaram um padre, uma ialorixá e um pastor, mostrando aos diferentes que a tolerância religiosa é possível.

FCP – Conte um pouco dos projetos que o senhor tem desenvolvido.

Mestre Cláudio – Na Serra da Barriga desenvolvi um projeto muito particular, onde fomos contemplados com o Prêmio Capoeira Viva (do Ministério da Cultura), onde recebemos dois uniformes, um para treino e outro para apresentação e batizados, instrumentos musicais, como pandeiros, atabaques e berimbaus. Lá também levamos amigos para dar palestras sobre a importância da preservação ambiental, sobre o significado histórico e etnográfico, sobre doenças sexualmente transmissíveis, além de realizar oficinas de berimbaus.

FCP – O que o senhor acha de ter sido convidado pela FCP para as comemorações dos 21 anos da instituição?

Mestre Cláudio – Alguns pontos são de grande significado à nossa vida. Um desses é a honra de termos sido lembrados pela Palmares, quando sabemos que no Brasil existem milhares de grupos de renome nacional e  internacional, enquanto muitos de nossos alunos nunca saíram  nem das suas cidades para cidades vizinhas. Com certeza, essa viagem será de grande estímulo à auto-estima dos mesmos e uma experiência inesquecível em nossas vidas.

Acredito ainda, que a capoeira, com a sensibilidade demonstrada pela FCP, dará um salto muito grande no sentido do reconhecimento enquanto cultura nacional. Nunca se deu uma visibilidade tão relevante a nossa cultura afro-brasileira, por isso, parabenizo-a por essa iniciativa, que certamente expandirá num futuro bem próximo, com a implantação da capoeira nas escolas, através da lei 10.639/03 e com o empenho dessa instituição, a exemplo do que já vem fazendo para o nosso povo discriminado por ser afro-descendente.

FCP – O que o grupo Pôr do Sol pretende apresentar além da capoeira? Vai ter maculêlê?

Mestre Cláudio – Na verdade, eu preferi apresentar só a capoeira, pois estaremos realizando uma grande roda que certamente terá a presença de todos os mestres que participarão do evento, o que fatalmente irá extrapolar o tempo que teremos para apresentarmos.

FCP – Qual a importância que o senhor vê no encontro de mestres?

Mestre Cláudio – A iniciativa do encontro de mestres servirá para fortalecer e dar visibilidade ao Brasil da importância dos mestres e da nossa cultura genuinamente brasileira, a capoeira. Servirá também, para elevar a auto-estima dos mesmos, uma vez que a história mostra que muitos deles deram sua vida pela capoeira e morreram a míngua e no anonimato. Espero que esse intercâmbio cultural culmine com uma maior união entre os mestres e com propostas de ações afirmativas em prol dos excluídos, este que são nossos verdadeiros heróis e embaixadores do Brasil.

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