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Rápido resfriamento do núcleo da Terra poderia evidenciar ‘morte’ do planeta, explica geofísica do ON/MCTI
O núcleo da Terra – fundamental para a manutenção da vida no planeta – está esfriando mais rápido do que se imaginava. Foi o que afirmou uma pesquisa recente realizada pelo Instituto Federal Suíço de Tecnologia de Zurique (ETH) e pela Carnegie Institution for Science, nos Estados Unidos.
No estudo, os pesquisadores investigaram minerais que transportam calor do núcleo para o manto terrestre e descobriram que o fluxo de calor é maior do que se pensava anteriormente. Isso sugere que quanto mais rápido o calor é transferido do núcleo para o manto, mais rápido ele perde calor, o que acelera o resfriamento da Terra.
Conforme explicou a Dra. em Geofísica do Observatório Nacional (ON/MCTI), Suze Guimarães, o núcleo da Terra está localizado a quase 3.000 km de profundidade da superfície terrestre e tem raio de aproximadamente 3.500 km. Suas altas temperaturas são similares às da superfície do Sol, podendo variar de 4.400° C a 6.000° C. Essas altas temperaturas garantem a vida no planeta. Se elas fossem baixas, o planeta se transformaria em uma gigantesca rocha fria e inerte.
No núcleo, há a parte interna, que consiste em uma esfera sólida, composta majoritariamente por ferro. Já o núcleo externo é formado por um líquido maleável, composto basicamente por ferro e níquel. Nos limites do núcleo ocorre o processo de convecção do manto terrestre que é exatamente a transferência de calor para o manto.
A energia geotérmica que emana do interior do planeta é responsável por diversas atividades, tais como a dinâmica das placas tectônicas e a atividade vulcânica.
Segundo a geofísica, investigar o interior da Terra e esses processos naturais é fundamental para compreender melhor a evolução do planeta e os fenômenos que ocorrem aqui e que afetam a vida no planeta.
“Primeiramente, estudar o planeta é primordial para conhecermos o lugar onde moramos e entender como ele funciona. Segundo, entender o interior do planeta pode trazer respostas para fenômenos que nos atinge diretamente aqui na ‘superfície’ e até mesmo nos auxiliar na minimização dos impactos causados por fenômenos naturais. Assim, garantimos nossa existência, pois utilizamos recursos ‘internos’ do planeta para tal, como o uso da energia geotérmica que vem do interior da Terra por exemplo, que neste caso é um recurso interno ao qual aproveitamos para nossa sobrevivência”, explicou Suze.
No estudo em questão, os pesquisadores investigaram os minerais que compõem a região transfronteiriça entre o núcleo e o manto. Mais precisamente, o mineral conhecido como bridgmanita (silicato de magnésio). Por meio de um experimento simulado, foi desenvolvido um método para medir a quantidade de calor que esse mineral pode conduzir. O sistema de medição permitiu mostrar que a condutividade térmica da bridgmanita, ou seja, sua capacidade de transportar calor, é cerca de 1,5 vezes maior do que se supunha anteriormente. Em outras palavras, o núcleo está esfriando mais rápido do que se esperava.
Os cientistas do estudo também acreditam que esse esfriamento seria capaz de mudar a composição dos minerais do manto. A bridgmanita, por exemplo, quando esfria, se transforma em “pós-perovskita”, um outro mineral que conduz calor com muito mais eficiência. Então, conforme a bridgmanita for se convertendo em pós-perovskita, a Terra esfriará ainda mais rapidamente.
Importante destacar que esse processo de esfriamento é bem lento e ocorre em escalas de milhares de milhões de anos. Portanto, mesmo que seja acelerado, nenhum de nós estará vivo para ver.
Também não se sabe com exatidão quanto tempo levará para que o planeta esfrie a ponto de interromper os fenômenos naturais. Para isso, será necessário entender melhor a dinâmica do manto e os elementos que o compõem.
“Como entendemos, todo processo interno da Terra é dinâmico, e o calor está associado a energia, ou seja, esse dinamismo interno mostra que o planeta está ‘vivo’, garantindo fenômenos naturais associados, como a formação do campo geomagnético e do próprio campo geotérmico”, ressaltou a pesquisadora do Observatório Nacional.
Suze disse ainda que uma das consequências diretas da perda de calor interno do planeta pode ser observada no movimento das placas tectônicas na superfície da Terra.
“Deixando de existir a energia interna, as placas tectônicas não se movimentariam e até mesmo fenômenos vulcanológicos e sismológicos também deixariam de existir, evidenciando a ‘morte’ do planeta”, concluiu Suze.
Pesquisa citada:
Murakami, M., Goncharov, A. F., Miyajima, N., Yamazaki, D., & Holtgrewe, N. (2022). Radiative thermal conductivity of single-crystal bridgmanite at the core-mantle boundary with implications for thermal evolution of the Earth. Earth and Planetary Science Letters, 578, 117329.