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Novo estudo investiga capacidade de cientistas encontrarem o fenômeno raro de lentes gravitacionais em mapeamento digital do céu
Especialistas são capazes de identificar fenômenos raros em imagens produzidas por telescópios – e a performance desses especialistas independe da experiência, confiança ou posição acadêmica. É o que mostra um artigo internacional publicado no repositório ArXiv no dia 11 de janeiro, com a participação do Observatório Nacional.
O trabalho investigou a capacidade humana de identificar as chamadas " lentes gravitacionais ", fenômenos raros causados pela deformação da luz proveniente de galáxias distantes ao passar por galáxias massivas – ou aglomerados de galáxias – no meio do caminho até o telescópio. A identificação desse fenômeno requer a análise cuidadosa de milhares de imagens de galáxias e aglomerados de galáxias.
Lente gravitacional em torno do aglomerado de galáxias Abell 383 visto pelo Telescópio Espacial Hubble. Crédito: NASA, ESA, J. Richard (CRAL) and J.-P. Kneib (LAM) .
O desafio em questão usou quase 1.500 imagens simuladas e reais do Dark Energy Survey – DES (em português: Levantamento da Energia Escura). Trata-se de uma colaboração internacional, com participação do Brasil, que mapeou cerca de um quarto do Hemisfério Sul a partir do telescópio Blanco, de 4 metros, no Chile, usando uma câmera de 570 Megapixels. Suas imagens profundas e de alta definição permitem mapear a distribuição de matéria no universo com grande precisão.
De acordo com os pesquisadores envolvidos no estudo, a observação de lentes gravitacionais por telescópios terrestres como Blanco é desafiadora. Isso porque suas imagens são afetadas pela atmosfera, que absorve e espalha a luz vinda de fontes astronômicas. O estudo, no entanto, revelou que é possível encontrar lentes gravitacionais com confiança a partir de um pequeno time diverso para realizar as classificações.
Essa revelação é importante porque tem sido cada vez mais difícil para um ser humano analisar bilhões de imagens de forma eficiente tendo em vista o aumento das observações do Universo promovido por grandes mapeamentos digitais do céu , como o DES. Cabe aos humanos, então, treinar algoritmos de Inteligência Artificial (IA) para identificar fenômenos astronômicos em imagens e validar as identificações feitas pelas máquinas.
Ilustração de lente gravitacional de uma galáxia distante (esquerda) sendo deformada por um aglomerado de galáxias no meio do caminho até nós na Terra (direita). Crédito: NASA, ESA & L. Calçada
O estudo foi liderado pela astrofísica Karina Rojas, que realiza estágio de pós-doutorado na Universidade de Portsmouth, no Reino Unido. A pesquisadora é especialista no uso de IA para encontrar novas lentes gravitacionais fortes. Além dela, um time internacional de mais de 50 cientistas dos Estados Unidos, Suíça, Espanha, Itália, Suécia, México, Alemanha, Austrália, França e Brasil participaram do desafio de encontrar sinais de lentes gravitacionais fortes nas imagens.
No Brasil, participaram o astrofísico Dr. Ricardo Ogando, do Observatório Nacional, dois estudantes de mestrado orientados por ele, Filipe Silva e Gabriel Calçada, e a cientista-cidadã Micaele Gomes, que na época do desafio cursava o Ensino Médio em São José dos Campos, interior de São Paulo.
Dr. Ricardo Ogando e os estudantes de mestrado orientados por ele, Filipe Silva e Gabriel Calçada
"O trabalho mostra que nossos olhos ainda desempenham um papel importante em verificar a qualidade dessas classificações feitas pelos computadores, além de proporcionar um ponto de vista diferente das classificações", diz Ogando .
"Estou muito feliz com esse trabalho, especialmente pelo envolvimento da estudante Micaele Gomes, que na ocasião cursava ainda o ensino médio. Micaela queria muito participar de um trabalho científico no ON e o Dr. Ricardo Ogando acolheu seu sonho e o conduziu com brilhantismo. Acredito que seja o nosso primeiro passo para a implementação de uma iniciação científica júnior", afirma Dra. Josina Nascimento , atualmente gestora da Divisão de Comunicação e Popularização da Ciência (DICOP) do ON.
Acesse aqui o artigo The impact of human expert visual inspection on the discovery of strong gravitational lenses
Imagens de lentes gravitacionais observadas em dados iniciais do DES. Note como a qualidade das imagens é pior do que as produzidas no espaço pelo Hubble. Crédito: DES