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Explorando as Formações Ferríferas: Uma Janela para o clima antigo e potencialmente para reconstruções geográficas do planeta
Rochas ricas em ferro pouco compreendidas, que só existiram no passado remoto da Terra, têm o potencial de nos ajudar a compreender melhor as mudanças climáticas que a Terra sofreu ao longo do tempo geológico. Ao estudar como essas rochas foram geradas, os cientistas poderiam usá-las para obter polos magnéticos antigos, o que por sua vez nos ajuda a reconstruir como eram os continentes no passado.
O estudo em questão foi o tema da tese de doutorado da nossa convidada de hoje, a pesquisadora Dra. Gabriella Fazio, que atualmente desenvolve seu projeto de pós-doutorado no Observatório Nacional.
Conforme explica Gabriella, sua tese de doutorado investigou as chamadas formações ferríferas, que são rochas sedimentares químicas/bioquímicas do Precambriano, período do tempo geológico mais antigo do que 500 milhões de anos. Essas rochas possuem relevância não apenas em termos econômicos, associado aos grandes depósitos de ferro, mas também abrigam informações valiosas sobre as mudanças paleoclimáticas do passado remoto do nosso planeta.
Gabriella explica que o sistema climático da Terra é composto pela interação pelas seguintes esferas: litosfera, hidrosfera, atmosfera, biosfera e criosfera. Ao longo da história da Terra, estas esferas passaram por diversas transformações como, por exemplo, os períodos de glaciação global, eventos de surgimento do oxigênio e de ausência deste, surgimento da vida e aumento da complexidade dos organismos. As rochas servem como registros geológicos dessas transformações e ao estudá-las, podemos adquirir informações cruciais sobre a evolução da Terra.
As rochas alvos do estudo, as formações ferríferas, apresentam minerais magnéticos que podem trazer informações valiosas não somente sobre as condições do sistema climático do passado, mas também sobre o campo magnético terrestre. Ao entender melhor os processos de formação dessas rochas, podemos contribuir também para o entendimento dos fatores que influenciam na magnetização desses minerais magnéticos contidos nas rochas e, assim, tentar validar análises paleomagnéticas para fins de obter polos magnéticos, auxiliando na reconstrução dos continentes no passado remoto.
Ao longo do seu doutorado, Gabriella utilizou diversas técnicas, incluindo a cicloestratigrafia, no âmbito da geofísica, para compreender a gênese dessas rochas, visando tentar utilizá-las como um objeto de estudo dentro do paleomagnetismo.
O doutorado teve três focos principais:
O primeiro foco constitui o estudo de um possível envolvimento de bactérias na formação dessas rochas, se baseando principalmente na análise de isótopos de ferro.
O segundo foi entender o mecanismo de deposição das formações ferríferas, por análises de comportamento de deformação dessas rochas em escalas macroscópicas a cristalográficas.
Por fim, análises cicloestratigráficas foram realizadas no intuito de entender se os ciclos orbitais da terra influenciaram na dinâmica de deposição dessas rochas.
“Gostaria de explicar brevemente a cicloestratigrafia para vocês, que constitui a minha principal linha de pesquisa atual. Esta se refere a uma área de estudo das Ciências da Terra que busca identificar padrões repetitivos (cíclicos) nos registros das rochas sedimentares ao longo do tempo geológico. Esses padrões são chamados de ciclos estratigráficos e são compostos por camadas sedimentares que se repetem de forma semelhante em intervalos regulares. Esses ciclos são resultado de processos geológicos que ocorreram repetidamente ao longo do tempo, como mudanças climáticas, variações no nível do mar, atividade tectônica ou eventos de deposição sedimentar. Dentre esses ciclos, destacamos os ciclos de Milankovitch, que se referem a padrões cíclicos de variações nos parâmetros orbitais da Terra ao redor do Sol, na escala de dezenas a centenas de milhares de anos. Esses são recorrentemente identificados em registros sedimentares por meio de análises espectrais, o procedimento analítico padrão da cicloestratigrafia.”
De acordo com Gabriella, todas as questões levantadas nas três frentes de estudo têm implicação direta para compreensão dos processos de aquisição de magnetização dos minerais magnéticos das formações ferríferas.
“Pensando na primeira frente de estudo, conseguimos apontar um envolvimento bacteriano na fonte de ferro disponível para formação das formações ferríferas. Essa conclusão foi resultado de uma observação de valores negativos dos isótopos de ferro, o que implica em atividade biológica no processamento desses íons.”
A partir de análises reológicas, de deformação, Gabriella pode entender melhor a precipitação dessa rocha química, cuja característica marcante é a alternância de camadas ricas em ferro e camadas ricas em sílica.
Por fim, a partir das análises cicloestratigráficas, foi possível concluir que os ciclos orbitais da Terra influenciaram na dinâmica de deposição dessas rochas. E, a partir da identificação desses ciclos no registro sedimentar, foi possível estimar uma taxa de deposição para essas camadas, em torno de 70 milímetros por mil anos.
“Com isso, a partir dos resultados do meu doutorado, pude contribuir para o avanço do conhecimento sobre as formações ferríferas, tanto nos fatores que influenciam sua deposição, na identificação de padrões rítmicos com hierarquia condizente com ciclos de Milankovitch, quanto nos seus mecanismos físico-químicos e biológicos para sua gênese. Esses estudos têm implicações diretas para o entendimento dos mecanismos de magnetização dessas rochas e, com isso, grandes aplicações nas áreas de paleomagnetismo e paleoclimatologia.”
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