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Astrônomos investigam estrelas peculiares com planetas e discos de poeira ao seu redor
Algumas poucas estrelas no universo, com massas similares à do Sol, possuem, simultaneamente, planetas e discos de detritos ao seu redor, estruturas que são uma espécie de “sobras” de quando o Sistema Solar se formou. No entanto, a natureza desses astros peculiares ainda é um mistério.
Vários trabalhos já mostraram que essa condição não depende das massas planetárias e nem da idade da estrela. Mas, até agora, ninguém havia estudado a fundo possíveis correlações com a cinemática (estudo do movimento das estrelas) e com a metalicidade estelar (proporção de matéria constituída de elementos químicos diferentes do hidrogênio e hélio).
Concepção artística do sistema planetário DDP em torno da estrela solar Tau Ceti, mostrando seus cinco supostos planetas e seu disco de detritos. A Tau Ceti foi o primeiro alvo do telescópio SETI que procurava sinais de civilizações extraterrestres. Crédito: NASA
Com o objetivo de compreender melhor essas raras estrelas rodeadas por planetas e discos de poeira, que também é o caso do nosso sistema solar, uma equipe de cientistas liderada pelo pesquisador emérito em Astronomia do Observatório Nacional (ON/MCTI), Dr. Ramiro de la Reza, analisou um seleto grupo de astros desse tipo buscando possíveis correlações entre a massa do disco de poeira e a metalicidade da estrela.
A pesquisa resultou no artigo “ Searching for the nature of stars with debris disks and planets ” (“Procurando a natureza das estrelas com discos de detritos e planetas”, em português), aceito para publicação na importante revista Astronomy & Astrophysics neste mês de fevereiro de 2023.
Impressão artística de um disco de detritos em torno de uma estrela em Scorpius-Centaurus. Crédito : NRAO/AUI/NSF; D. Berry / SkyWorks
Estrelas com discos de poeira e planetas
Nos estágios evolutivos iniciais das estrelas do tipo solar, alvo do estudo, elas geralmente são cercadas por discos de gás e poeira. Com o tempo, esta primeira geração de discos se condensa em corpos rochosos, os “planetesimais”. Esses corpos se agregam para produzir planetas de menor massa e cometas que, por fim, produzem estruturas sólidas massivas que se tornam o núcleo de planetas gigantes. Este primeiro estágio dura de 3 a 10 milhões de anos.
Após esse período, um novo tipo de disco pode emergir da poeira produzida nas colisões planetesimais. Esses discos são formados por asteroides e pequenos planetesimais com tamanhos que variam de alguns milímetros a várias dezenas de quilômetros. Por isso, algumas poucas estrelas podem ter ao seu redor tanto planetas quanto discos de poeira.
Impressão artística de objetos de disco de detritos colidindo e reabastecendo os pequenos grãos em um disco. Crédito: ESA, NASA e M. Kornmesser
De acordo com os pesquisadores, na literatura, existem apenas cerca de 30 estrelas conhecidas contendo simultaneamente discos de detritos e planetas (rotuladas como DDP). Eles afirmam que não está claro por que o número desses objetos é tão pequeno, dadas as centenas de estrelas observadas com discos de detritos sem planetas confirmados (DD), ou as milhares de estrelas contendo apenas planetas (CP).
Em estudos anteriores, foi demonstrado que as estrelas DDP contêm uma ampla gama de massas planetárias. Além disso, elas exibem idades estelares muito variadas. Ou seja, nem as massas planetárias e nem as idades estelares parecem ter relação com a presença de planetas e discos de poeira que circundam essas estrelas.
Por outro lado, quanto à metalicidade, já se sabe que o material metálico é necessário para formar planetas, e hoje se sabe que quanto maior a metalicidade da estrela central, maior a probabilidade de haver planetas no entorno.
No estudo em questão, os pesquisadores analisaram esse grupo de estrelas DDP e mostraram que a maioria delas pertence ao disco fino galáctico rico em metais (elementos químicos diferentes do hidrogênio e hélio), onde estão as estrelas mais jovens de uma galáxia.
As poucas exceções foram três estrelas DDP que parecem ter se formado em épocas de formação de discos galácticos espessos (onde estão as estrelas mais ‘velhas’), ou seja, entre 11 e 8 bilhões de anos atrás.
Conceção atual da Galaxia, indicando o disco fino, disco espesso, bojo e halo.
“A massa do disco de poeira dessas três estrelas é muito pequena, mas esses resultados não são surpreendentes, pois permanecem dentro dos valores esperados para a evolução do disco estelar dessas estrelas primitivas. Ou seja, essas estrelas mais antigas, que se formaram durante um período de baixo teor de metal no disco galáctico espesso, hospedam discos de detritos de baixa massa”, disseram os pesquisadores. “Paralelamente, encontramos outras seis estrelas do disco espesso contendo apenas discos de detritos ou planetas.”
Estes resultados permitiram aos pesquisadores estabelecer uma correlação entre a metalicidade estelar e a massa do disco de poeira, que varia de acordo com as diferentes épocas de formação dos discos galácticos grossos e finos.
Conforme destacou o líder da pesquisa, Dr. Ramiro de la Reza, nós vivemos em um sistema DDP, com o Sol como estrela central, com os planetas e o disco de poeira. Portanto, compreender a formação desses sistemas nos ajuda a entender melhor a própria formação do sistema solar em que vivemos.
“O sistema tem planetas e tem detritos de um lado, como aqueles do Cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter, e de um outro lado, uma vasta zona de detritos que contém até planetas anões como Plutão e outros no exterior do sistema.”
Também participaram do estudo uma pesquisadora do Observatório Astronômico de Córdoba, na Argentina, e quatro pesquisadores de vários centros de investigação da Espanha.