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‘Vento da Terra’ gerando água na Lua? Geofísicos do ON explicam
A superfície da Lua está mais hidratada do que se pensava. Foi o que revelou um estudo recente publicado no Astrophysical Journal Letters.
Um grupo de pesquisadores encontrou evidências de água na superfície lunar cuja origem ainda é um mistério. Uma das hipóteses é que essa água seria proveniente do chamado “vento terrestre”, provocado pelo campo magnético da Terra.
Não é que a água seja uma substância rara no espaço. Ela pode ser encontrada dentro de asteroides, em cometas e até mesmo nas crateras de planetas como Mercúrio.Contudo, devido ao calor do Sol, e à falta de proteção contra o vácuo, a expectativa é que essa água rapidamente evapore.
No estudo em questão, os cientistas analisaram dados do Moon Mineralogy Mapper (Mapeador de Mineralogia Lunar, em tradução livre) que é um dos dois instrumentos da NASA que contribuíram para a primeira missão da Índia à Lua, a Chandrayaan-1, e que mede a luz solar refletida pela superfície lunar.
No estudo, os pesquisadores destacaram que a umidade encontrada da superfície lunar pode ter sua origem nos ventos solares, que consiste na emissão de partículas carregadas provenientes da coroa solar, incluindo moléculas de hidrogênio.
De acordo com o trabalho, a água lunar é gerada através da interação entre o hidrogênio do vento solar e a superfície dos grãos do solo da Lua. Nessa interação, há uma reação espontânea que forma moléculas hidroxila (OH-) e água molecular (H2O).
Ocorre que, durante um período de 3 a 5 dias por mês, a Lua fica dentro da magnetosfera da Terra, que é essencialmente a região sob influência do campo magnético terrestre. Nesse período, a Lua fica “protegida” da maioria das partículas do vento solar.
Conforme explicou o pesquisador do Observatório Nacional e doutor em Geofísica Daniel Franco, a magnetosfera é gerada pelo movimento convectivo do fluido essencialmente constituído por ferro e níquel, eletricamente carregado e sob temperaturas similares à da superfície solar, na região do núcleo externo da Terra (entre 2900 km e 5150 km de profundidade).
“Sua produção promove um bom grau de ‘blindagem’ ao nosso planeta, defletindo partículas cósmicas de alta energia, e mitigando o processo de ‘erosão atmosférica’, causada pelo vento solar. É possível que Marte tenha tido sua atmosfera progressivamente rarefeita ao longo de eras pela sua incapacidade de sustentar a produção de um campo magnético global”, explicou Franco.
Assim, quando a lua fica dentro da magnetosfera, não há outras fontes de hidrogênio, portanto, seria esperada uma diminuição da hidratação na Lua, mas isso não foi observado.
Os pesquisadores explicaram que a magnetosfera da Terra não está vazia. Em vez disso, está ocupada pelo chamado “vento terrestre”, que difere do vento solar, e é composto por diversas partículas, que já foram inclusive detectadas nas proximidades da Lua.
O Dr. André Wiermann, pesquisador em Geofísica do ON, explicou que a magnetosfera contém não apenas íons de hidrogênio e hélio provenientes do Sol, mas também íons de hidrogênio e oxigênio liberados continuamente pela atmosfera terrestre, principalmente a partir das regiões polares.
“O ‘vento terrestre’ é uma consequência do arraste destes íons para fora de nosso planeta, pelo vento solar, e que podem eventualmente chegar à Lua, quando esta se encontra atrás da face noturna da Terra”, esclareceu Wiermann.
Para confirmar a influência do vento terrestre na umidade da Lua, o grupo estudou a distribuição espacial e as variações temporais da água lunar em altas latitudes, comparando os intervalos quando a Lua está dentro e fora da magnetosfera.
Eles descobriram que não há diferenças significativas na abundância de água para os intervalos em que a Lua está localizada dentro ou fora da magnetosfera da Terra.
“O fato de que uma redução de OH/H2O na superfície não é observada implica que outras fontes possíveis além do vento solar podem existir, por exemplo, o vento da Terra”, concluíram.
Para o Dr. Daniel Franco, a compreensão da origem da água lunar é importante para prover meios mais adequados para a colonização da Lua e, posteriormente, para a expansão das atividades de exploração do Sistema Solar a partir do nosso satélite natural.