Liuba – esculturas e relevos
29/10/2016 a 22/05/2017
Liuba – esculturas e relevos apresenta um conjunto de obras produzidas entre os anos 1960 e 1980, com ênfase nas peças da década de 1970. A seleção foi organizada objetivando a relação entre as características dos trabalhos e os espaços do Museu. Por isso, nesta mostra predominam as esculturas “verticais”. Com exceção da obra escultórica de Lasar Segall, exposta em 1991, é a primeira vez que o Museu abre os seus espaços para uma exposição individual e retrospectiva de esculturas.
Inicialmente figurativa, a artista passa a operar a partir dos anos 1960 uma relevante mudança formal, com isso a modelagem ganha, de modo progressivo, novos contornos e surgem “seres” e formas orgânicas, entre a figura e o abstrato, entre o real e o surreal. As peças são mais rústicas e irregulares valorizando o gestual e a expressividade. Segundo Antônio Gonçalves Filho, os anos de 1960 e 1970 são os da fase mais angulosa. “Seria possível antever um futuro que não desprezasse a influência de Archipenko, particularmente no que diz respeito à assimilação do estilo algo eclético do escultor russo, um pioneiro no trânsito entre a modernidade e as culturas arcaicas.”
Liuba está inserida na tradição da escultura moderna, em que o processo criativo obedece a determinadas regras universais da arte, seguindo padrões nos quais volumes, contornos, cheios e vazios e articulação rítmica dos planos são condicionantes para organizar suas ideias e para sua formalização. Liuba é uma das principais escultoras brasileiras, pioneira entre as poucas artistas mulheres que se dedicaram à arte de esculpir, como Pola Rezende, Maria Martins, Mary Vieira, Felícia Leiner, Sonia Ebling e Zélia Salgado.
Não cabe aqui apresentar ou contextualizar essa significativa produção da arte brasileira. Para isso podemos recorrer a vários ensaios críticos ou a uma historiografia já consolidada por nomes como Herbert Read, Rosalind Krauss, Reinhold Hohl e Mario de Micheli, Walter Zanini, Mário Pedrosa, Frederico Morais e Annateresa Fabris, os quais brilhantemente analisam a produção escultórica moderna.
Da historiadora e crítica de arte Annateresa Fabris, podemos citar, de seu ensaio Recontextualizando a escultura modernista, um trecho em que descreve a produção da artista: “O fato de ser discípula de Germaine Richier coloca Liuba numa posição, a princípio, peculiar. O conjunto da obra de Germaine Richier é considerado por Hohl uma súmula da evolução da escultura moderna, por incluir a tradição do modelado (sobretudo graças a Bourdelle), uma certa relação com as convenções de Maillol e Despiau e a força mítica do surrealismo. O organicismo essencialista de Liuba não deixa, de um certo modo, de inserir-se na mesma linha de sua professora, com a qual partilha ainda um interesse bastante manifesto por algumas soluções de derivação construtivista”, o que Walter Zanini chama de “estado de essencialidade”.
A artista intitulava genericamente suas obras de “animais”. No entanto, dentro dessa proposital imprecisão, o mais importante é apreender de todo um conjunto de formas seu estado primordial, a essência de um imenso imaginário que se expressa e nos remete a um arcaísmo, muitas vezes surreal, dos estados subjetivos da mente e de um “primitivismo” muito valorizado e explorado pela artista e pelas vanguardas históricas pós-impressionista, cubista, surrealista, dadaísta e expressionista.
É dessa unidade conceitual e formal, desse estado de essencialidade que a artista extrai a síntese de seu trabalho, como aponta Frederico Morais: “Liuba alcança, em suas esculturas, graças à depuração e ao despojamento com que trata essa forma-matriz, o estatuto do signo, que integra, no dizer de Denys Chevalier, uma escritura elementar e rude, uma espécie de caligrafia intrinsecamente monumental”.
Assim como seus relevos, gráficos e simbólicos, para além de um significado imediato, permanecem em estado latente desejando sair do plano e ocupar o espaço. Híbridos, entre o bi e o tridimensional, parecem estar em gestação para se tornarem, quem sabe, novos bichos.
Curadoria: Jorge Schwartz e Marcelo Monzani