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Uma espécie asiática nos lares de Belém
Agencia Museu Goeldi - O cotidiano é fonte interminável de questionamentos para a ciência. Observar inclusive nossas próprias casas com curiosidade pode reservar surpresas. Pesquisadores do Museu Paraense Emilio Goeldi, por exemplo, descobriram uma nova espécie de osga circulando na cidade de Belém (PA), a partir de uma observação inicial de um espécime na varanda de um apartamento. É o primeiro registro do pequeno lagarto no Brasil.
A osga tem origem em algumas regiões da Ásia e, à primeira vista, não e muito diferente de outras osgas ou lagartixas já presentes na região. Ela pertence à família cosmopolita Gekkonidae, famosa por sua capacidade de se dispersar por longas distâncias, em parte por sua capacidade de flutuação utilizando detritos e, mais recentemente, pela possibilidade de acompanhar fluxos de transporte humano pelos mares e por via aérea. As espécies dessa família geralmente se alimentam de pequenos insetos e do néctar de flores.
A descoberta – Nos dias 27 e 28 de julho de 2014, os pesquisadores do Museu Goeldi Teresa Cristina Avila-Pires e Marinus Hoogmoed observaram um exemplar da espécie de Lepidodactylus lugubris na varanda de seu apartamento, em uma esquina da Av. Pedro Álvares Cabral, próximo à zona portuária de Belém.
No dia 27 de agosto do mesmo ano, outro espécime foi observado em outra varanda do apartamento, quando pode ser coletado e fotografado, bem como preservado pela coleção herpetológica Osvaldo Rodrigues da Cunha do Museu Goeldi. A partir desses primeiros contatos com a espécie, os pesquisadores alertaram colegas que ficaram atentos para novos aparecimentos, já que a espécie, onde é introduzida, vive geralmente em casas e ambientes compartilhados com humanos.
Em 12 de setembro de 2014, os estudantes André Nunez e Jorge Cosenza coletaram outro espécime em um dos prédios da Universidade da Amazônia, na Avenida Alcindo Cacela, e posteriormente, no dia 10 de janeiro, um colega, Giovanni Palheta, coletou outro exemplar no mesmo local.
No mesmo mês, outros espécimes voltaram a ser observados no apartamento dos pesquisadores Teresa e Marinus e nos meses que se seguiram, alguns outros exemplares foram capturados em diferentes localidades da cidade e levados ao Museu. Eles puderam então ser comparados com espécimes da coleção do Centro de Biodiversidade Naturalis - RMNH, de Leiden, nos Países Baixos. As coletas tornam possível concluir que a espécie já está espalhada por boa parte de Belém, mas ainda não havia sido detectada por ser confundida com a espécie Hemidactylus mabouia, uma espécie exótica introduzida há muito mais tempo e que já alcançou grande distribuição no Brasil.Os resultados da identificação ajudam a atualizar os registros de presença da L. lugubris nas Américas e foram publicados na revista científica Zootaxa.
Lepidodactylus lugubris - E um pequeno geconídeo com corpo longo e achatado, e patas curtas (membros pentadáctilos) e com cinco dedos também achatados, que se conectam por uma pequena membrana em sua base.
Em Belém, um número grande de lagartixas de outras espécies pode ser encontrado, a maioria delas pertencente à familia Neotropical Sphaerodactylidae, como as das espécies Chatogekko amazonicus, Gonatodes humeralis e Lepidoblepharis heyerorum.
Em relação a essas e outras lagartixas, algumas diferenças podem ser usadas para diferenciá-las de Lepidodactylus lugubris, como o fato de ela possuir uma pupila vertical, ter hábitos noturnos e viver em casas ao invés de ambientes silvestres. Lepidodactylus lugubris possui também lamelas escansoriais em seus dedos (estruturas que lhe permitem escalar superfícies) dentre outros detalhes.
Já a outra espécie também vinda de fora, a Hemidactylus mabouia, igualmente da família Gekkonidae e encontrada principalmente em casas em perímetro urbano, pode ser distinguida da Lepidodactylus lugubris pelo corpo e cabeça mais delgados, além de apresentar uma listra escura na lateral da cabeça. Possui ainda o hábito de enrolar e desenrolar a cauda lateralmente em situações de estresse, característica não apresentada por Hemidactylus mabouia. É possível que Lepidodactylus lugubris tenha chegado à cidade pelo porto de Belém, a partir de navios vindos do Caribe, onde ela já é encontrada.
Texto: Uriel Pinho