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Mosaico Gurupi aciona Conselho para tratar da lei de zoneamento
Agência Museu Goeldi - O Mosaico Gurupi protocolou junto ao Conselho de Meio Ambiente do Estado do Maranhão (Consema) um ofício de questionamento à Lei Estadual nº 11269, que aprovou o Zoneamento Ecológico- Econômico (ZEE) da Amazônia maranhense. Encaminhado também aos ministérios públicos Federal e Estadual, o documento enfatiza aspectos do ZEE que precisam ser revisados para que ele cumpra adequadamente os objetivos de sua criação.
O projeto de lei que institucionaliza o ZEE foi enviado à Assembleia Legislativa do Maranhão em abril e aprovado no dia 28 de maio deste ano, em meio à pandemia de Covid-19.
Fórum composto por 14 entidades governamentais, não-governamentais, representações indígenas e de comunidades tradicionais, o Mosaico Gurupi também aponta que, apesar da realização de discussões na etapa de formulação dos diagnósticos, o projeto final de ZEE não foi adequadamente submetido à apreciação pública.
“Nossa manifestação oficial se deu no intuito de mais uma vez tentar colaborar com o aprimoramento de alguns pontos do ZEE, de modo que possamos construir uma agenda efetiva de conservação e restauração dos meios naturais no Maranhão amazônico e, consequentemente, darmos atenção e valorização real aos modos de vida de povos indígenas e comunidades tradicionais diretamente vinculados a esses meios”, explica João Guilherme Cruz, do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), organização que atualmente ocupa a Secretaria Executiva do Mosaico.
Segundo ele, as sugestões elencadas pelos representantes do Mosaico Gurupi trazem perspectivas reais e eficientes para o aprimorar o zoneamento da Amazônia maranhense. “Reafirmamos que o processo de consulta sobre o ZEE Amazônia apresentou lacunas relevantes, que impossibilitaram uma apropriação adequada dos povos indígenas sobre a questão. Tendo em vista que já está em curso a continuidade de elaboração do ZEE, agora nos biomas costeiros e no Cerrado, é de suma importância que o Estado aprimore suas metodologias de debate público, de modo que povos indígenas e comunidades tradicionais possam participar e contribuir ativamente, conforme preconiza a Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário”, completa.
Questionamentos - Os principais questionamentos feitos pelo conjunto de organizações dizem respeito, principalmente, à indefinição das formas de conservação das áreas de cobertura florestal original.
Segundo o Código Florestal Brasileiro, 80% da vegetação contida nas propriedades rurais da região amazônica devem ser preservadas, sob a forma de reserva legal. Apesar da prerrogativa de redução desse percentual para 50% em áreas rurais consolidadas, essa diminuição seria inadequada para a maior parte das zonas definidas no ZEE.
A justificativa para manter os 80% de proteção é que, no Maranhão, os diagnósticos revelam que restam apenas 25% da área de vegetação original do bioma amazônico, com o restante convertido em terra para pastos, agricultura e silvicultura. O passivo de restauração de florestas do estado varia entre 20 a 90%.
A ecóloga Marlúcia Martins , pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), organização integrante do Mosaico do Gurupi, aponta que há também uma falta de orientação acerca das formas de proteção da vegetação secundária e aproveitamento do seu potencial na restauração desse passivo florestal do estado.
Outro problema, segundo ela, é a ausência de reconhecimento do Corredor Ecológico da Amazônia Maranhense no ZEE. A criação desse corredor foi reivindicada pelo Mosaico em nota técnica encaminhada ao Consema no decorrer das audiências públicas realizadas durante o planejamento do ZEE.
Corredor etnoambiental - Desde a sua criação, em 2014, o Mosaico do Gurupi desenvolve ações integradas para a conservação da Reserva Biológica (Rebio) Gurupi e as Terras Indígenas (T.I) Awá, Carú, Alto Turiaçu, Rio Pindaré, Araribóia e Alto Rio Guamá.
As florestas compreendidas por todo o território do Mosaico Gurupi abrigam 46 espécies de aves e mamíferos de especial interesse para conservação, incluindo espécies ameaçadas de extinção e endêmicas.
Como recomendação, o Mosaico Gurupi reitera a proposta de criação de um Corredor Etnoambiental, não incorporada no projeto final do ZEE. O propósito do corredor é restabelecer a conectividade entre os grandes fragmentos de floresta amazônica que se distribuem entre a Rebio Gurupi e as terras indígenas que o compõem.
“O estabelecimento desse corredor é essencial para a conservação da rica biodiversidade da Amazônia Maranhense e, em particular neste caso, é a solução encontrada para a conservação da onça pintada, conforme análise de modelagem”, aponta o texto enviado ao Consema, órgão consultivo para as políticas de meio ambiente do estado.
“Os corredores têm papel ecológico reconhecidamente fundamental por possibilitar o fluxo de animais/plantas/genes entre fragmentos de áreas naturais; ou seja, por estabelecer a conectividade da paisagem”, explica.
Além dos aspectos ecológicos e socioambientais, afirma o documento, a proposta de um corredor também tem o objetivo de potencializar a reconexão dos povos indígenas das T.I Awá, Carú, Alto Turiaçu, Rio Pindaré, Araribóia e Alto Rio Guamá, especialmente os Awá-Guajá, povo de recém contato com a sociedade envolvente, com parte da população disposta em aldeamentos nas Terras Indígenas Caru, Awá e Alto Turiaçu.
O corredor também deve assegurar a proteção de grupos indígenas isolados, cuja vida é baseada na caça e na coleta, nas Terras Indígenas Caru, Alto Turiaçu e Araribóia,
“E é com grande senso de responsabilidade que as diferentes etnias que compõem o Mosaico, buscam a proteção dos ‘parentes’ isolados. Os guerreiros e guerreiras da floresta vem desenvolvendo um grande trabalho de vigilância de seus territórios para a proteção da floresta e de seus povos, se constituindo nos maiores protagonistas da região no que se refere à conservação dos ecossistemas e da manutenção de suas florestas em pé”, reforça o ofício.
Mudanças na lei - Para ser efetivada, no entanto, essa proposta deve ser feita a partir de uma revisão ou complementação do projeto de lei do ZEE.
Na prática, a formação desse corredor deve envolver um programa de restauração e proteção da vegetação secundária, em consonância com a regulação ambiental das propriedades rurais da região. Ao invés dos 50% previstos pela lei do ZEE, essa regulação dentro do corredor precisa incorporar um percentual de proteção de 80% de reserva legal, conforme previsto pelo Código Florestal Brasileiro e, com base nesse percentual, efetuar a recuperação dos passivos.
Para o desenvolvimento socioeconômico da região, o documento sugere o incentivo às atividades que façam parte da vocação da população local, convergindo com a qualidade ambiental e a restauração de paisagens, fundamentais para a formação do corredor.
Entre essas atividades se destacam o manejo e o extrativismo florestal, a agricultura orgânica, o cultivo de agroflorestas e a restauração florestal.