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Povos Indígenas estão atentos às negociações por instrumento internacional que proteja seus conhecimentos e recursos genéticos
Lideranças indígenas de todo o país aguardam a conclusão das negociações da Conferência Diplomática de Genebra, que a Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) está realizando de 13 a 24 de maio em Genebra (Suíça). A expectativa é quanto à aprovação, após 24 anos de discussões, de um futuro instrumento internacional de proteção aos conhecimentos tradicionais e aos recursos genéticos dos povos indígenas e tradicionais.
São vários os produtos da biodiversidade brasileira que envolvem conhecimentos tradicionais e já foram objeto de pedido de patentes sem previsão de repartição de benefícios. Entre os exemplos estão a copaíba, andiroba, cupuaçu, açaí, estévia, guaraná e ayahuasca.
E exatamente esse um dos pontos de divergência das discussões na Conferência. Os representes dos povos indígenas querem a inclusão do requisito de divulgação da origem no pedido de patentes. Esse novo requisito permitiria a rastreabilidade, ou seja, possibilitaria identificar de onde vem o conhecimento tradicional ou o recurso genético utilizado no produto alvo do pedido de patente.
“A alteração do sistema de propriedade intelectual permitiria mais inclusão, mais transparência, mais segurança jurídica e representa bilhões de dólares envolvidos no uso de conhecimentos tradicionais e recursos genéticos em produtos que são sujeitos a patentes”, ressalta a diretora do Museu Nacional dos Povos Indígenas, Fernanda Kaingáng.
A vice-presidenta do Instituto Brasileiro de Propriedade IntelectuaI (Inbrapi), Geíse Parintintim, foi eleita co-presidenta do Caucus Internacional dos Povos Indígenas e manifestou a posição dos povos indígenas do Brasil a respeito do artigo 5º do texto em negociação na Conferência. Geíse expressou a preocupação dos povos indígenas e das comunidades locais do Brasil com a aplicação do princípio legal da não retroatividade ao futuro instrumento internacional.
“Consideramos problemática a continuidade da utilização de conhecimentos tradicionais e de recursos genéticos em violação aos princípios do consentimento livre, prévio e informado e da justa e equitativa repartição de benefícios sem os quais a concessão de direitos de patentes sobre esses conhecimentos tradicionais e recurso genéticos consiste em apropriação indevida. Nesse exato momento 80 comunidades indígenas estão em condições de vulnerabilidade extrema por efeitos negativos das mudanças climáticas e entre esses povos estão os Guarani, cujos conhecimentos tradicionais sobre Stevia foram alvo de mais de 1000 patentes. Os povos indígenas do Brasil não pode concordar com a legalização de apropriações indevidas que violam princípios legais já estabelecidos no cenário internacional”, diz Geíse.
Povos Indígenas entregam suas reivindicações
Os delegados indígenas do Brasil, tendo à frente a professora e assessora técnica na área de Patrimônio Cultura e Memória da Federação do Povo Huni Kui do Estado do Acre (FEPHAC), Joana Munduruku, fizeram a entrega oficial do documento final do Seminário Internacional Povos Indígenas e Diversidade Cultural ao embaixador Guilherme de Aguiar Patriota, eleito presidente da Conferência Diplomática. O seminário foi realizado, de 8 a 10 de abril, pelo Museu/Funai em parceria com a Fundação Casa de Rui Barbosa e cooperação da Representação da Unesco no Brasil.
Intitulado “Protegendo saberes, fazeres, sabores e dizeres para o futuro da sociobiodiversidade indígena”, o documento foi produzido coletivamente por representantes de povos indígenas dos seis biomas brasileiros num Caucus Indígena, e foi mencionado durante a Conferência pelo Diretor Geral da OMPI, Daren Tang. Imagens do seminário realizado pelo Museu/Funai ilustram a exposição no hall de entrada da OMPI.
É a primeira vez que a delegação brasileira conta com representantes de povos indígenas e eles estão falando em plenária, em português, sobre a necessidade de que sejam respeitados seus direitos sobre seus conhecimentos e sobre os recursos genéticos que aprimoram e ajudam a preservar. Além de Fernanda Kaingáng, do cacique Ninawa Huni Kuin e da professora Joana Munduruku, a integrante do Conselho Nacional de Cultura, Daiara Tukano, também integra a delegação brasileira.
Em entrevista à Agence France Presse (AFP), o cacique Ninawa Huni Kuin, que abriu a conferência com vestimenta e canto tradicionais, lembrou que patentes são concedidas para invenções que se baseiam no conhecimento tradicional sem que os povos indígenas sejam informados. “Como conhecedores e protetores desse conhecimento, temos muito a contribuir para a humanidade”, destaca o líder do povo Huni Kui da Amazônia.