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Museu/Funai presta homenagem à antropóloga Berta Ribeiro pelo seu centenário de nascimento
O Museu/Funai recebeu as historiadoras Bianca França e Maria Elizabeth Brêa Monteiro, no dia 1º de novembro, para exibição do documentário “Para Berta com amor”, seguido de uma roda de conversa. O evento foi uma homenagem ao centenário da antropóloga, etnóloga e museóloga Berta Gleizer Ribeiro, comemorado em 2 de outubro.
Além de ter deixado um grande legado sobre a cultura material dos povos indígenas, Berta foi responsável pela catalogação de cerca de 8 mil itens do acervo etnográfico do Museu/Funai, onde atuou como museóloga nos anos 1980.
O filme é um dos frutos da pesquisa acadêmica de Bianca França e apresenta depoimentos de amigos, ex-alunos e colegas de trabalho de Berta, mostrando seus processos pesquisa e sua parceria com o antropólogo Darcy Ribeiro, com quem foi casada e colaborou profissionalmente.
Durante a roda de conversa, Bianca e Bethinha, como é conhecida, falaram sobre suas impressões sobre Berta e suas contribuições em diversas áreas. Bianca falou a partir de suas pesquisas e Betinha com base nas lembranças de sua convivência com a antropóloga.
Elizabeth Brêa veio trabalhar Museu/ Funai a convite de Darcy Ribeiro, depois que ele voltou do exílio. Ele a convidou para contribuir num projeto que havia iniciado no final dos anos 40, e que visava o mapeamento dos povos indígenas. O projeto não teve continuidade, mas ela permaneceu no Museu, colaborando para constituição do Centro de Documentação Etnológica. E foi no Museu que conheceu Berta, que frequentava muito a instituição por ter vários amigos que por aqui circulavam. Posteriormente, ambas trabalharam juntas no órgão.
Bethinha destacou que Berta sofreu um apagamento histórico, ficando muito à sombra de Darcy Ribeiro, não apenas por ser mulher, mas também porque sua pauta de pesquisa acadêmica foi a cultura material, “que sempre foi o ‘patinho feio” da Antropologia”. Ela destacou também a atuação política de Berta e o fato de ela ter se mantido, ao longo da vida, muito coerente com aquilo que pensava.
Bianca e Elizabeth lembraram que Berta antecipou muitos temas que hoje estão presentes no mundo acadêmico e nos debates nacionais e internacionais. Um exemplo é uso social da tecnologia indígena para uma exploração mais sustentável dos recursos naturais e defesa da natureza, tema que teve relevância na 16ª edição da Conferência da Convenção sobre Diversidade Biológica, que se encerrou no dia 1/11 em Cáli, na Colômbia. Bethinha recorda que Berta já via o indígena como um ecólogo e que, muitos anos depois, estudos do IBGE confirmaram isso ao apontar que as áreas mais preservadas do país são as terras indígenas.
Outro aspecto destacado da atuação de Berta foi a valorização dos saberes indígenas. Elizabeth Brêa conta que Berta dizia que não teria conseguido realizar boa parte de sua produção científica sem os conhecimentos que recebeu dos povos indígenas. Na mesma linha, Bianca França explica que no livro “Diário do Xingu”, de 1979, Berta afirma que os indígenas são seu colaboradores. “E quando lemos a obra vemos que os indígenas retratados têm nome, têm uma descrição, têm personalidade. Berta escreve de uma forma que nos leva a imaginar as pessoas do jeito que são. É uma etnografia muito bem feita”, destaca.
A capacidade de Berta de compartilhar conhecimentos também foi destacada pelas duas debatedoras. A antropóloga trabalhou por muitos anos com os indígenas Desana Firmiano Arantes Lana e Luiz Gomes Lana, pai e filho, apoiando-os no projeto de escrever e ilustrar um livro sobre os mitos de seu povo. Ela datilografou, revisou e facilitou a publicação do livro “Antes o mundo não existia”, considerado o primeiro de autoria indígena do Brasil. O gesto levou o antropólogo André Demarchi a considerá-la como precursora da “antropologia compartilhada”.
Bianca ressalta que Berta escrevia e se comunicava muito bem. “Ela já fazia uma divulgação científica muito bem feita na década de 70 e 80. Ela também brincava com o audiovisual e não tinha medo de trabalhar de forma inter e multidisciplinar”, conta.