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Evento celebra volta do Manto Sagrado Tupinambá, considerado pelo povo um entidade viva
Dezenas de representantes do povo Tupinambá de Olivença, da Bahia, se reuniram, no dia 12 de setembro, no Museu Nacional/UFRJ, no Rio de Janeiro, numa cerimônia de celebração da volta do Manto Tupinambá ao Brasil, depois de quase 400 anos.
A cerimônia contou com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da primeira-dama Janja Lula da Silva, da ministra do Ministério dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, da presidenta da Funai, Joenia Wapichana, e diversas outras autoridades e lideranças indígenas. A diretora do Museu, Fernanda Kaingáng, representou a presidente da Funai, quando ela teve de se retirar.
O presidente Lula classificou o manto como uma obra artística de rara beleza e pediu ao governador da Bahia, Jerônimo Rodrigues, a construção de um espaço para que ele volte ao estado do Povo Tupinambá.
“O momento de hoje é sumamente extraordinário para que a gente reflita sobre o que acontece no nosso Brasil, desde a descoberta desse país, com os povos indígenas. O retorno do Manto para o Brasil representa a retomada de uma história que foi apagada, uma história que precisa ser contada e preservada, assim como esse manto que muitos indígenas só conhecem pela memória de seus ancestrais”, destacou.
Em seu pronunciamento, a ministra Sônia Guajajara ressaltou: “Estamos diante de um momento em que a história está sendo revista. Enxergo o retorno do manto como o início de um processo que tem tudo para instituir protocolos de acesso a inúmeras peças sagradas para nós, indígenas, tanto dentro como fora do Brasil”.
A reparação de dívida representada pela repatriação foi destacada pela presidenta da Funai, Joenia Wapichana. “É um desafio para todos os povos do Brasil, que tiveram seus bens levados sem qualquer consulta, consentimento prévio ou liberdade de opinar. Estamos hoje recebendo o Manto Tupinambá. Isso é motivo de alegria não somente para os povos que estão aqui, mas para todos os povos indígenas do Brasil. A repatriação é importante para o nosso país, a repatriação é uma reparação de dívidas com os povos indígenas, porque traz de volta a fortaleza, a intensidade, a cultura”, frisou.
Ao se pronunciar, a cacica Jamopoty, do povo Tupinambá de Olivença, ressaltou: ““Hoje é um dia especial. O dia em que o Brasil conheceu o Manto Tupinambá, que volta para o Brasil com todas as forças dos nossos ancestrais. Ele volta para nós com direito de vida não só para o povo Tupinambá, mas para todo o povo originário do Brasil, recontando essa história”. Depois ela aproveitou para pedir ao presidente Lula de faça a desintrusão da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença que abriga 23 aldeias, distribuídas entre os municípios de Ilhéus, Uma e Buerarema. A TI foi delimitada pela Funai e aguarda portaria declaratória.
A anciã Yakuy Tupinambá também participou da cerimônia e leu um manifesto do seu povo. Ela criticou a falta de transparência no processo de repatriação e no acesso ao manto, e reivindicou a demarcação do território.
Política de Reparação Cultural
Em uma entrevista antes da cerimônia, a diretora Fernanda Kaingáng lembrou que a política de reparação cultural é mais ampla que a repatriação. “Não basta retornar as peças. É preciso fortalecer o museu no território, é preciso investir em políticas públicas de cultura e consultar cada povo indígena para que haja um protocolo de gestão e uma reparação cultural com protagonismo dos povos indígenas”, afirmou.
O reencontro com o manto
Desde o dia 7 de setembro, representantes do povo Tupinambá estavam alojados no Museu Nacional, próximo ao local em que o manto está acondicionado. O primeiro contato de representantes do povo com a peça sagrada foi no dia 10, quanto ele puderam realizar rezas e rituais para o manto, que consideram uma entidade viva. No dia seguinte, um grupo de anciãos também realizou um ritual sagrado de conexão com seu sagrado.
A vinda dos Tupinambá ao Rio de Janeiro para reencontro com o manto sagrado foi viabilizada por uma articulação e um processo de escuta realizados pelo Ministério dos Povos Indígenas, com apoio da Funai e do Museu Nacional dos Povos Indígenas.
Representantes do ministério visitaram Olivença e Serra do Padeiro, na Bahia, para dialogar com os indígenas e aproximá-los do Museu Nacional/ UFRJ para que tivessem condições de rever a vestimenta sagrada e realizar seus rituais tradicionais nesse reencontro.
Essa consulta aos povos indígenas atende o estabelecido na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário, e determina que os povos indígenas sejam consultados sempre que houver ações, políticas, obras ou programas que possam afetá-los diretamente.