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HOMENAGEM
Ministra Cida Gonçalves participa de homenagem à Mãe Bernadete em quilombo na Bahia, um ano após sua morte
“Mãe Bernadete foi vítima de um feminicídio político”. A afirmação foi feita pela ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, durante celebração da missa de um ano da morte de Maria Bernadete Pacífico no Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho, região metropolitana de Salvador (BA). Conhecida como Mãe Bernadete, a liderança comunitária e religiosa foi assassinada violentamente aos 72 anos, com ao menos 25 tiros dentro de sua própria casa. “Esse crime não pode ser tratado como uma questão regional, mas sim como uma questão política”, acrescentou a ministra.
A cerimônia fez parte da 7ª edição do Festival de Cultura e Arte Quilombola, realizado pelo Quilombo Pitanga dos Palmares e pela Associação Etno Desenvolvimento Muzanzu. A comunidade de Pitanga dos Palmares conta com 2.638 pessoas e 598 famílias.
“Era uma mulher forte, que resistia, uma educadora de sua comunidade e do seu povo. Uma mulher que fazia a diferença no quilombo e no Brasil”, disse ainda a ministra. Cida Gonçalves apontou para a questão de gênero na violência contra lideranças políticas, em que as mulheres são os alvos principais. E lembrou que a maioria das lideranças nos quilombos é formada por mulheres. Para a ministra, precisamos falar em crime de ódio quando tratamos do caso de Mãe Bernadete. “Mesmo ela já estando morta, dispararam mais de 20 tiros, para desfigurá-la, desfazer sua identidade e fazer com que o mundo esquecesse, mas não é isso o que vai acontecer”.
Atual liderança do quilombo, Wellington Jurandir Pacífico, filho de Mãe Bernadete, contou mal ter vivido o luto da mãe, depois de já ter perdido o irmão, e logo foi avisado que “seria o próximo”. Fábio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, foi assassinado em 2017, à época aos 36 anos. “Eu tenho o DNA da família de mãe Bernadete, e é o DNA de quem não pode desistir nunca. O legado de Mãe Bernadete irá continuar, sob minha responsabilidade e de meus irmãos. Vou buscar políticas públicas e desenvolvimento para essa população, essa era a meta de Mãe Bernadete. Podem ameaçar, mas eu não vou desistir, assim como minha mãe não desistiu, ela morreu lutando”, afirmou.
Filho de Binho, Wellington Gabriel Pacífico, de 23 anos, usou sua fala para apontar a falta de políticas públicas para as comunidades quilombolas. “Quero aproveitar as autoridades aqui presentes para lembrar que a juventude de Pitanga dos Palmares infelizmente está mais próxima de uma ficha criminal do que de um certificado de conclusão do Ensino Médio, porque tem um presídio dentro da nossa comunidade, mas não tem uma escola do Ensino Médio”, denunciou. Ele pede à Justiça, no âmbito estadual e federal, para que “tudo venha a ser reparado, inclusive a violência institucional que vem ocorrendo contra a nossa comunidade”.
Estiveram presentes na cerimônia como representantes do governo federal, além da ministra, o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Bruno Renato Teixeira; o secretário nacional de Territórios e Sistemas Produtivos Quilombolas e Tradicionais do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Edmilton Cerqueira; além de autoridades e lideranças locais.
O primeiro Festival sem Bernadete
O Festival, que acontece até este domingo (18), reúne sete comunidades quilombolas da Região Metropolitana de Salvador. Com o mote “Mãe Bernadete, o legado continua”, esta edição tem como grande homenageada a líder comunitária e religiosa, principal mobilizadora do evento e uma das mais respeitadas lideranças negras do Brasil. Nesta edição, o projeto realizou de forma inédita o Prêmio Mãe Bernadete - Reconhecimento e Ancestralidade, que homenageia personalidades negras cujos trabalhos ou ações são voltados para reconhecer, valorizar e estimular a cultura negra no Brasil. A ministra Cida Gonçalves foi a primeira personalidade a receber o prêmio.
A programação abrange apresentações musicais e de danças tradicionais, além de oficinas culturais, feira de produtos artesanais e gastronômicos. Pela memória de Mãe Bernadete e das comunidades que sofrem ameaça por sua cultura, raça, etnia e religião, foi realizada a Caminhada da Diversidade Cultural, com um apelo de paz, respeito e tolerância religiosa e às diversidades culturais.
Mãe Bernadete e seu legado
Durante a cerimônia deste sábado, foi feita a inauguração do “Museu Rústico Mãe Bernadete”. Para a ministra Cida Gonçalves, o espaço “traz a preservação da memória e da história das pessoas que lutam. Ali tem a memória do Binho, da Mãe Bernadete e a expectativa é que essas memórias não se percam”.
Na ocasião da morte de Bernadete, em 17 de agosto de 2023, o Ministério das Mulheres emitiu uma nota oficial sobre o crime e destacou uma comitiva da equipe da Ouvidoria e da Secretaria de Enfrentamento à Violência Contra Mulheres, que se reuniram com representantes do Ministério Público e da Defensoria Pública do Estado para tratar do caso no território.
“Liderança da comunidade quilombola Pitanga dos Palmares, do município de Simões Filho, Região Metropolitana de Salvador, onde também foi Secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Mãe Bernadete foi vítima de racismo religioso, racismo ambiental e de violência política de gênero, que atinge lideranças em espaços de poder e decisão”, dizia a nota da pasta.