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VIOLÊNCIA POLÍTICA
Caso Mãe Bernadete: Ministério das Mulheres reúne-se com autoridades na Bahia
Uma comitiva do Ministério das Mulheres esteve em Salvador/BA, nos dias 18 e 19 de agosto, para acompanhar as investigações do assassinato da líder quilombola e ialorixá Bernadete Pacífico. Acompanhadas da secretária de Políticas para Mulheres do Estado da Bahia, Elisangela Araújo, as autoridades também estiveram no velório, ocorrido no Quilombo dos Pitangas, e no sepultamento realizado por familiares e por sua comunidade de terreiro no Cemitério da Quinta dos Lázaros.
“A ministra Cida Gonçalves pediu para irmos ao local primeiramente para prestar solidariedade à família. Falamos com o filho de mãe Bernadete, Jurandir Pacífico, para pedir desculpas em nome do Estado brasileiro, porque se estávamos ali, como representação do Estado brasileiro, é porque não havíamos estado antes. Mas também fomos para dizer que vamos acompanhar de perto o andamento das investigações para não deixarmos que seja mais um crime contra uma liderança feminina impune”, ressaltou a Ouvidora do Ministério das Mulheres, Thaís dos Santos Lima.
Misoginia, racismo ambiental e religioso
Devido às ameaças que vinha sofrendo em razão da sua luta política, Mãe Bernadete estava inserida no Programa Estadual de Proteção de Defensores de Direitos Humanos.
Para o Ministério das Mulheres, trata-se de um feminicídio, porque é o assassinato de uma mulher e pela força que Mãe Bernadete tem como mulher; e de violência política de gênero, uma vez que foi eliminada por ser uma liderança política que estava denunciando a permanente injustiça e retirada de direitos adquiridos. Também é um ato de misoginia, porque é o fenômeno do ódio às mulheres que cria base para esses tipos de crimes.
“Há uma violência decorrente do racismo ambiental e religioso, mas que é potencializada pelo fato da liderança ser mulher. Mãe Bernadete foi morta com vários tiros, sendo 12 tiros no rosto. Isso significa ódio, não é apenas matar, mas querer desfigurar o rosto de uma mulher negra. Então é misoginia e é racismo. É crime de racismo religioso, de racismo ambiental e ao fim podemos dizer que é também um feminicídio, porque é um crime de violência política contra mulheres”, defende Thaís dos Santos Lima.
A coordenadora-geral de Acesso à Justiça, da Secretaria de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, Denise Teixeira, explica que o histórico de conflitos fundiários, de tentativas de ocupações ilegais do território, que eram denunciadas por Mãe Bernadete, também demonstram que seu assassinato se trata de um crime ambiental. “Estamos diante de uma ação criminosa contra uma mulher que liderava uma comunidade com centenas de famílias, que sabia viver em seu ambiente segundo a sua cultura e suas formas de ver o mundo, em harmonia com a natureza”, destaca Denise Teixeira.
Diálogo com instituições locais
A comitiva do Ministério das Mulheres dialogou com outras instituições locais que atuam no enfrentamento da violência contra a mulher, para demandar que acompanhem as investigações e apresentem a relação das lideranças femininas da Bahia que estão inseridas nos programas de proteção ou que estejam recebendo ameaças, com o objetivo de colaborar com o suporte necessário para a garantia da segurança dessas mulheres.
Foram realizadas reuniões com a secretária de Políticas para as Mulheres da Bahia, Elisangela dos Santos Araújo, com a promotora de Justiça e coordenadora do Núcleo de Enfrentamento às Violências de Gênero em Defesa dos Direitos das Mulheres (Nevid), do Ministério Público do Estado da Bahia, Sara Gama, e também com a defensora pública e coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa da Mulher (Nudem), da Defensoria Pública do Estado da Bahia, Lívia Almeida.
“Fomos solicitar que essas instituições também acompanhem de perto as investigações, porque é um crime de violência contra a mulher. Pedimos também a colaboração dessas instituições para mapear a situação das lideranças femininas dos quilombos. Não existe luta quilombola sem a participação feminina. E essas mulheres são protagonistas”, explica a Ouvidora.
Escuta de lideranças
A ida da comitiva do Ministério das Mulheres a Salvador também foi uma oportunidade para a pasta ouvir lideranças quilombolas que vêm sofrendo ameaças. “Uma liderança quilombola nos falou que escuta dos agressores, grileiros da região, frases como ‘você é muito ousada porque não tinha um cabra macho para lhe dar uma surra’. Isso é violência política contra mulheres”, relata a Ouvidora da pasta. “Ela nos contou o quanto de ódio esses agressores têm porque não suportam o fato de mulheres estarem a frente dessa luta. Então, além do racismo, há misoginia, há um ódio muito grande a essas mulheres”, complementa.
O Ministério das Mulheres também está em diálogo com o coletivo de mulheres da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) para realizar uma escuta das mulheres líderes dos quilombos alvo de ameaças. “Vamos mapear a situação dessas mulheres, saber se estão inseridas em programas de proteção, saber se há e quais medidas de proteção foram dadas a elas, e saber quais lideranças estão sob risco e não possuem nenhuma proteção”, finaliza a Ouvidora do MMulheres.