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Brasil e China: uma reunião de concertação e cooperação (Valor Econômico,13/02/2012)
Tenho a satisfação de copresidir, até amanhã, juntamente com o vice-primeiro-ministro da China, Wang Qishan, a 2ª Reunião da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban), que constitui o mecanismo formal de mais alto nível nas relações bilaterais com a China.
A Cosban proporciona os canais institucionais necessários ao encaminhamento dos mais variados temas da parceria estratégica Brasil-China. Do diálogo político a temas de comércio e investimentos; da cooperação em energia, ciência e tecnologia à parceria no campo espacial e da educação e cultura, essa comissão envolve uma ampla gama de setores governamentais brasileiros, representando os interesses do empresariado, de instituições acadêmicas e de diferentes segmentos da sociedade brasileira.
Desde a primeira reunião da Cosban, realizada em 2006, quando a parte brasileira foi liderada pelo saudoso vice-presidente José Alencar, as relações sino-brasileiras apresentaram avanços expressivos, tornando-se crescentemente mais diversificadas e complexas. A face mais facilmente mensurável dessa relação nos mostra que, em 2006, o comércio bilateral era da ordem de US$ 16 bilhões, tendo crescido exponencialmente a cada ano, atingindo a cifra recorde de US$ 77,1 bilhões em 2011.
China e Brasil revelaram capacidade de reação rápida e consistente aos efeitos da crise de 2008 e de sua reincidência mais recente, centrada nos países da zona do euro. Os dois países têm importante papel a desempenhar na retomada da economia global e estão comprometidos a assegurar condições para manter seu crescimento interno de forma estável e robusta. Nossos respectivos programas domésticos de inclusão social foram intensificados, em benefício das camadas menos favorecidas de nossas populações.
Desde 2009, a China é um dos nossos principais parceiros comercial e fonte de novos investimentos no Brasil. Em 2011, nosso superávit com a China foi de US$ 11,5 bilhões, equivalente a 38% do superávit global brasileiro.
Com a visita de Estado da presidenta Dilma Rousseff à China, em abril de 2011, foram estabelecidas as bases para um salto qualitativo na parceria. O desafio é o de propiciar meios para irmos além da complementaridade que já caracteriza a relação bilateral. Precisamos, assim, diversificar os fluxos de comércio, de forma a aumentar a participação de produtos de maior valor agregado nas exportações brasileiras para a China.
No quadro da visita da presidenta Dilma Rousseff, houve também entendimentos com vistas a promover a diversificação dos investimentos nos dois sentidos. O Brasil empenhou-se com parceiros chineses no intuito de identificar novas áreas para investimentos, tendo presente a importância que atribui à agregação de valor às nossas cadeias produtivas.
Como resultado desse esforço, de acordo com dados do Conselho Empresarial Brasil-China, o perfil dos investimentos chineses no Brasil, antes concentrados nos setores de mineração, agricultura e petróleo, começou a mudar em 2011. De janeiro a outubro daquele ano, foram anunciados 16 projetos que representam US$ 7,14 bilhões de investimentos diretos chineses no Brasil, dos quais 74% destinados a manufaturas, semimanufaturas e pesquisa e desenvolvimento, além dos investimentos chineses nos setores alimentício, de defensivos agrícolas e de energia.
A parceria Brasil-China na área espacial, iniciada na década de 80, foi redimensionada por ocasião da visita da presidenta Dilma Rousseff, com a decisão do lançamento, até novembro de 2012, do satélite CBERS 3 e, até 2014, do CBERS 4. O projeto CBERS, sigla em inglês de Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres, representa marco pioneiro na cooperação em alta tecnologia entre dois países em desenvolvimento. Estima-se que mais de 50 cientistas brasileiros estejam vinculados ao projeto.
A China será também importante parceira do Brasil na implementação do Programa Ciência sem Fronteiras, devendo receber anualmente até 100 estudantes e pesquisadores brasileiros no nível de pós-graduação, em áreas de alta especialização. A distância física e cultural permanece um obstáculo a ser vencido. Estamos buscando meios de maior aproximação entre as sociedades brasileira e chinesa por meio do ensino do mandarim em universidades brasileiras e do português na China, do estímulo ao turismo, do estabelecimento de centros culturais nos dois países, e da cooperação no campo dos esportes. Em 2013, será organizado o mês da China no Brasil e, no ano seguinte, o mês do Brasil na China.
A relação Brasil-China transcende a esfera bilateral e ganha contornos de grande relevância, neste momento de redesenho da governança global. Os dois países são parceiros no Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul); no G-20 - onde alinham interesses quanto à reforma das instituições financeiras internacionais; e no Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China), onde coordenam posições sobre a temática da mudança do clima. A promoção do desenvolvimento sustentável é tema em que Brasil e China compartilham interesses.
Acolheremos com satisfação a delegação da China à Conferência Rio+20 sobre Desenvolvimento Sustentável, que terá como foco o desenvolvimento da economia verde em contexto de erradicação da pobreza.
Com o objetivo de sistematizar os avanços alcançados e projetá-los em um horizonte de longo prazo, a presidenta Dilma Rousseff acolheu muito positivamente a proposta do primeiro-ministro Wen Jiabao de elaborar um Plano Decenal, que começaremos a elaborar a partir dos resultados da 2ª Cosban, com vistas a sua assinatura por ocasião de visita ao Brasil do primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, prevista para este ano.
As relações entre o Brasil e a China são tão amplas quanto diversificadas. A Cosban nos permitirá revisitar os diferentes setores que compõem o mosaico dos interesses bilaterais, sempre dentro da perspectiva de longo prazo e do caráter estratégico que norteia nossa parceria.
Michel Temer é Vice-Presidente da República.