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Discurso do presidente Lula na sessão de abertura do Urban 20
Eu quero, primeiro, dizer da minha alegria de poder receber tantos prefeitos e prefeitas importantes do Brasil e do mundo na cidade do Rio de Janeiro. Eu espero que vocês que chegaram ontem, que chegaram na sexta-feira, que pegaram o Rio de Janeiro com muita chuva, por favor, não levem essa imagem do Rio de Janeiro para os países de vocês.
Tenham um pouco de paciência porque a partir de hoje vai fazer sol, amanhã vai fazer sol, terça-feira vai fazer sol. Embora os presidentes do G20 estejam trancados numa sala, significa que os prefeitos poderão conhecer o Rio de Janeiro e saber por que o Rio de Janeiro é tratado e chamado de cidade maravilhosa.
Vale a pena vocês conhecerem o prêmio que Deus nos deu quando desenhou a geografia do Rio de Janeiro. Portanto, parabéns a todos vocês.
Quero cumprimentar a minha companheira Janja [Janja Lula da Silva, primeira-dama do Brasil] e cumprimentando ela eu quero cumprimentar todas as mulheres presentes aqui. Cumprimentar a minha companheira prefeita de Contagem [Marília Campos]. Quero cumprimentar todas as prefeitas que vieram de vários países do mundo.
Cumprimentando o nosso querido companheiro Boric [Gabriel Boric, presidente do Chile], quero cumprimentar todas as autoridades federais aqui presentes e quero cumprimentar especialmente o prefeito do Rio de Janeiro [Eduardo Paes] que tem a sorte de ser prefeito dessa cidade. Ele não quer mais nada na vida, ele não quer ser prefeito de Paris, não quer ser prefeito de Berlim, não quer ser prefeito de Amsterdã, não quer nem ser prefeito da minha cidade de Garanhuns.
Ele quer continuar sendo prefeito do Rio de Janeiro, sobretudo quando eu estou na presidência porque ele recebe muita ajuda do presidente Lula para transformar essa cidade naquilo que ela nasceu para ser, uma cidade maravilhosa.
Quero cumprimentar todos os ministros de Estado e as ministras do meu governo que vieram participar desse encontro. E quero dizer para vocês: sintam-se em casa aqui no Rio de Janeiro.
É fundamental que este encontro ocorra às vésperas da Cúpula de Líderes do G20.
Há milênios, os assentamentos urbanos atraem as esperanças de milhões de pessoas.
Seus mercados e comércios são pontos de contato entre sociedades muitas vezes distantes.
De suas universidades e bibliotecas, vieram grandes inovações.
Em suas ruas e suas praças, ideias se tornam realidade.
Os municípios são catalizadores de mudanças profundas.
Mais da metade da população mundial vive em cidades, que geram 80% do PIB global.
Algumas megalópoles como Nova York, Santiago, Paris e Rio de Janeiro produzem mais riquezas do que muitos países inteiros.
Ao mesmo tempo, vilarejos empobrecidos lutam contra o êxodo de jovens para se manterem vivos e viáveis financeiramente.
Nas cidades, os adjetivos costumam ser superlativos. E os contrastes também.
Isso é particularmente verdadeiro na América Latina, que, segundo o PNUD, é o continente mais desigual do mundo e experimentou uma das urbanizações mais aceleradas da história.
A imensa riqueza gerada nas megalópoles não chega ao bolso dos trabalhadores que as habitam. O conhecimento criado muitas vezes não alcança suas crianças.
Os três eixos prioritários escolhidos pela presidência brasileira do G20 dialogam diretamente com os desafios que milhares de prefeitos de todo o planeta enfrentam no cotidiano de suas cidades.
O combate às desigualdades, à fome e à pobreza é essencial para a implementação do Objetivo do Desenvolvimento Sustentável 11 sobre cidades inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis.
Em sociedades cada vez mais desiguais, o lugar onde uma pessoa mora é determinante no seu acesso à educação, à saúde, ao trabalho e à segurança pública.
Deste Armazém da Utopia vemos o Morro da Providência, a favela mais antiga do Brasil.
Estamos, também, a apenas dez quilômetros da favela da Maré, berço da vereadora Marielle Franco, barbaramente assassinada por sua luta pelo direito à cidade e pelos direitos humanos – a quem rendo a minha homenagem.
Um quarto dos habitantes do planeta vive em assentamentos precários.
No Brasil, as mulheres negras são maioria nesses territórios.
Seus filhos são as maiores vítimas da desigualdade e da violência urbana, que todos os anos cobra um número de vidas semelhante aos das guerras mais violentas.
Por essa razão, tenho defendido um novo pacto federativo, com o envolvimento de todos os Poderes, para colocar a segurança pública como prioridade nacional e manter nossa juventude viva.
Também estamos implementando uma nova etapa do nosso maior programa habitacional, o Minha Casa, Minha Vida, que articula modalidades inovadoras de incentivos a um mercado habitacional mais sustentável.
A luta de Marielle por uma cidade mais inclusiva, uma educação pública transformadora e pelo acesso a todos a um serviço público de qualidade é imperativa para criar cidades sustentáveis e que atendam às necessidades de todos.
O planejamento urbano também terá um papel crucial na transição ecológica e no enfrentamento à mudança do clima – segunda prioridade do nosso G20.
As cidades são responsáveis por 70% das emissões de gases de efeito de estufa e 75% do consumo global de energia.
Esses mesmos centros urbanos estão desproporcionalmente expostos às consequências das mudanças climáticas, à subida do nível dos oceanos, às ondas de calor, à insegurança hídrica e a enchentes avassaladoras, como as que vimos recentemente no Sul do Brasil, na Colômbia e na Espanha.
A ação climática pode servir como ferramenta para uma agenda urbana mais ampla de inclusão e justiça social.
A transição ecológica é uma oportunidade valiosa de gerar emprego e renda para a juventude nos grandes centros urbanos.
As cidades não podem custear sozinhas a transformação urbana.
Elas não podem ser negligenciadas nos novos mecanismos de financiamento da transição climática.
Infelizmente, os governos esbarram em uma enorme lacuna de financiamento no Sul Global.
Apenas uma parcela dos recursos necessários chega aos países em desenvolvimento e uma parte ainda menor alcança nossas metrópoles.
Existe um déficit no financiamento urbano, que não consegue acompanhar o ritmo da urbanização desordenada em muitas partes do mundo, como a África, a Ásia e a América Latina.
Por isso, a terceira prioridade da presidência brasileira do G20 é a reforma da governança global, inclusive de sua arquitetura financeira e dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento.
Não será possível construir uma Nova Agenda Urbana sem investimento e sem governança multilateral adequada.
Temos muito orgulho de ter a brasileira Anacláudia Rossbach à frente do ONU-Habitat. Sua liderança será central para apoiar governos nacionais e locais a enfrentar a crise urbana, com base em políticas públicas sólidas e amparadas na ciência. Bem-vinda, companheira Ana, e boa sorte para você.
Falar em reforma da governança também implica em repudiar a destruição das guerras.
A Faixa de Gaza, um dos mais antigos assentamentos urbanos da humanidade (4.000 a.C), teve dois terços de seu território destruídos por bombardeios indiscriminados. 80% de suas instalações de saúde já não existem mais.
Sob seus escombros, jazem mais de 40 mil vidas ceifadas.
Não haverá paz nas cidades se não houver paz no mundo.
Minhas amigas e meus amigos,
As cidades concentram desafios, mas nelas também encontramos as soluções que buscamos.
Elas são o lar dos agentes da mudança que almejamos realizar.
A presença de tantas prefeitas e prefeitos aqui hoje é prova de que os governos locais querem e podem fazer sua parte.
O C40, que hoje já conta com quase 100 cidades afiliadas, está empenhado em enfrentar a crise climática e contribuir para limitar o aquecimento global a um grau e meio e, ao mesmo tempo, construir comunidades saudáveis, equitativas e resilientes.
No Brasil, mais de cinco mil municípios. Todos os anos, essas lideranças locais vão a Brasília, na Marcha Nacional dos Prefeitos, fazer suas reivindicações.
É preciso escutar a voz das cidades e eu estou confiante de que os trabalhos desta reunião do U20 serão muito produtivos.
Como diz o compositor Hilton Acioli. Isso aqui é importante lembrar, que essa música foi feita para uma campanha da cidade de São Paulo em 1985. A música dizia assim: “Uma cidade parece pequena se comparada a um país, mas é na sua, é na nossa cidade, que a gente começa a ser feliz”.
E eu queria que vocês, prefeitos e prefeitas, saíssem daqui com uma imagem perfeita da importância da cidade. O Governo Federal simboliza o coração de um ser humano, ou da geografia de uma cidade, mas quem significa a artéria são vocês. E não é possível um coração saudável sem as artérias saudáveis. E para que um Governo Federal, para que um país seja bem-visto, seja rico e seja bem-sucedido, é preciso que as cidades também estejam bem, sejam ricas e sejam felizes, porque é na cidade que nós queremos escola, é na cidade que nós queremos saúde, é na cidade que nós queremos transporte, é na cidade que nós queremos lazer.
E o Boric disse com muita razão: nós precisamos colocar a prática do esporte no cotidiano da humanidade. Não é o esporte competitivo para ganhar medalha, é o esporte para ganhar qualidade de saúde, e as cidades podem dar o exemplo ao coração que é o Governo Federal.
Boa sorte, um grande abraço e parabéns, Eduardo, por essa extraordinária reunião do U20.