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Discurso do presidente Lula na inauguração da 36ª Feira Internacional do Livro de Bogotá
Meu querido companheiro Gustavo Petro, presidente da República da Colômbia, e sua companheira Verónica Alcocer; minha querida companheira Janja; meu caro ex-presidente da República da Colômbia Juan Manuel; meu caro ex-presidente da Colômbia Ernesto Samper, e sua esposa Jacquin Lucena; companheiros ministros da Colômbia que participam desse evento; companheiros brasileiros e brasileiras que me acompanham, eu vou pedir “permiso” para não ler o nome de vocês aqui porque é muita gente e nós estamos um pouco atrasados na nossa agenda.
Eu queria… É com imenso prazer que hoje me dirijo a todos vocês, na abertura desta prestigiosa Feira Internacional do Livro de Bogotá, a FILBO, uma das mais importantes da América Latina.
O Brasil sente-se profundamente honrado por ser novamente o país homenageado, após nossa participação em 1995 e 2012.
Retribuiremos a gentileza homenageando a Colômbia na Bienal do Livro de São Paulo, em setembro deste ano.
No imaginário de muitas pessoas, o Brasil é sinônimo de natureza.
Talvez por isso seja tão característico da literatura brasileira retratar os diversos biomas do país como mais do que meros cenários.
A Caatinga e os Pampas foram não só panos de fundo, mas componentes centrais de épicos nacionais como "Os Sertões", de Euclides da Cunha, e "O Tempo e o Vento", de Érico Veríssimo.
Esse traço persiste em autores contemporâneos, como Paulliny Tort, integrante da delegação que me acompanha, que fez do Cerrado seu personagem.
O ano de 2024 marca o centenário da publicação de “A Voragem”, obra seminal do colombiano José Eustaquio Rivera, em que é a Amazônia que ocupa esse lugar.
Esse bioma compartilhado por Brasil e Colômbia tem sido o teatro de vivências comuns, inscritas em nossas culturas.
As marcas deixadas pelo ciclo da borracha e denunciadas por Rivera encontram paralelo na obra de autores brasileiros.
Rivera descreve um universo de penúria e brutalidade que, no livro “Orfãos do Eldorado”, de Milton Hatoum, é reflexo da ganância daqueles que fizeram fortuna às custas da floresta e de seus povos.
Eldorado, a mítica cidade de ouro cuja busca deixou um rastro de desolação, é possivelmente a palavra que melhor evoca a insanidade da exploração de que tem sido vítima não só nossa natureza, mas também nossa gente.
Há 28 anos, completados no dia de hoje, 17 de abril, 19 trabalhadores rurais foram mortos na cidade de Eldorado dos Carajás, no estado amazônico do Pará, enquanto marchavam por seu direito à terra.
Hatoum pergunta, em seu poema “O Fim que Se Aproxima”: “Qual Brasil se esconde atrás da humanidade amazônica?”
O Brasil que desejamos não é o da destruição e da violência.
Queremos substituir a devastação pelo desenvolvimento sustentável e transformar a exclusão em cidadania.
Queremos construir um país onde cuidar do meio ambiente e cuidar das pessoas não sejam metas excludentes.
O lema desta edição da FILBO – Ler a Natureza – expõe a insensatez da dicotomia ocidental entre o mundo dos homens e o mundo da natureza, que está nos conduzindo a uma catástrofe climática.
É esse o alerta que faz o nosso querido Aílton Krenak, aqui presente e participante desta feira e primeiro indígena, em mais de 125 anos, a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras.
Na literatura que emerge hoje no Brasil, aqueles que sempre foram marginalizados assumem o protagonismo para narrar suas experiências em primeira pessoa.
Estão na delegação brasileira autores como Luciany Aparecida, que acabamos de escutar, Daniel Munduruku, Daiara Tukano, Eliane Potiguara, Eliane Marques, Geovane Martins e Jefferson Costa, dando voz à identidade indígena e afrodescendente partilhada por nossos dois países.
Esse é o sentido do retorno à ancestralidade que nos propõe Ana Maria Gonçalves em seu magnífico romance “Um defeito de cor”.
A literatura não conhece fronteiras. Livros têm o poder extraordinário de nos transportar para outras realidades, ampliar horizontes e nos colocar no lugar do outro, como nos convidam as biografias do companheiro Fernando Morais, aqui presente.
O mestre Antonio Candido, crítico literário e sociólogo brasileiro, nos ensinava que a literatura é um direito humano porque é um bem indispensável à nossa humanização.
Ler é ser livre, mesmo quando fisicamente tentam nos isolar e prender, pois a luta por um país mais justo, uma vida digna e uma América Latina unida persiste apesar daqueles que buscam obstar o progresso da nossa região.
Precisamos de mais livros e menos armas. Mais conhecimento, educação, ciência e inovação.
A retomada das políticas culturais tem sido um dos pontos altos de meu governo, com a recriação do Ministério da Cultura, sob brilhante condução da nossa querida Margareth Menezes, expoente da cultura brasileira.
Hoje firmamos um acordo de cooperação cultural que vai multiplicar as pontes entre nossos países.
Gostaria de convidá-los a viajar conosco pelo pavilhão do Brasil. Nossa área de exposição conta com uma livraria com obras para adultos, jovens e crianças e uma área gastronômica com comidas típicas brasileiras.
Vamos oferecer uma programação artística e acadêmica diversificada, com samba, capoeira, cinema e aulas de português, mostrando o melhor que o Brasil tem a oferecer.
Esperamos, com grande entusiasmo, as oportunidades de intercâmbio, aprendizado e colaboração que surgirão desta feira.
Eu queria dizer a todos os escritores que estão aqui que, no Brasil, nós tomamos uma decisão muito importante: todo conjunto habitacional feito no Brasil, a partir de agora, terá uma biblioteca para que as pessoas não deixem de ler.
Muito obrigado.