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Discurso do Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de posse solene do Conselho de Representantes Brasileiros no Exterior, no âmbito da 3ª Conferência "Brasileiros no Mundo" - Rio de Janeiro, 3 de dezembro de 2010
Publicado em
03/12/2010 20h02
Atualizado em
08/11/2022 12h03
Meu querido companheiro Sérgio Cabral, governador do Rio de Janeiro,
Meu querido Eduardo Paes, prefeito da cidade do Rio de Janeiro,
Meu querido companheiro Celso Amorim, ministro “sainte” das Relações Exteriores. É porque eu fui falar com o Celso porque ele não falou um pouco mais. Ele falou: “Eu estou saindo, eu estou saindo”. Tem que falar mais, meu caro. Quando a gente está morrendo afogado, a gente grita para se salvar.
Quero cumprimentar o companheiro Juca de Oliveira, nosso ministro da Cultura. Juca Ferreira, Juca Ferreira, me desculpe, Juca. É que eu estou sempre vendo novela.
Quero cumprimentar o companheiro Gabas, ministro da Previdência Social,
A nossa companheira Márcia Lopes, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
O Marcio Fortes, ministro das Cidades,
O Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação Social,
O ministro Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência da República,
O nosso querido companheiro Pezão, vice-governador do Rio de Janeiro,
O senador Marcelo Crivella,
O deputado Luiz Sérgio,
O embaixador Eduardo Gradilone, subsecretário-geral das Comunidades Brasileiras no Exterior,
Todos os embaixadores aqui presentes,
O nosso querido Sussumu Shinoda, presidente do Conselho de Representantes dos Brasileiros no Exterior. E cumprimento ele, eu cumprimento todos os companheiros e companheiras que tomaram posse no Conselho.
Eu, habitualmente, falo de improviso, mas como eu sou um “sainte”, eu vou ser curto aqui, também, para dizer algumas palavras para vocês. Eu pedi aqui, para o Ministro da Previdência que preparasse todos os acordos que ele fez, com os países, sobre a Previdência Social, que não está no meu discurso. E ele, pelo menos, tem viajado muito e tem se justificado para mim: “Presidente, eu viajei não sei para onde, para fazer um convênio para tratar da Previdência Social”, e não tem nada no discurso. Eu estou desconfiado de que aquelas viagens não foram para cuidar de nada de interesse dos nossos companheiros.
Está aqui, olha, está no discurso paralelo: foram negociados, em conjunto com o Ministério da Previdência Social, acordos da Previdência com Cabo Verde, China, Espanha, Grécia, Itália, Luxemburgo, Mercosul, Portugal, todos em vigor; Alemanha, Bélgica, Ibero-Americana, Japão, assinados, aguardando a ratificação. Canadá, Quebec, Estados Unidos, já negociados. Coreia do Sul, França, Síria, Líbano, Israel, Colômbia, México, Ucrânia, Reino Unido, Suíça e Irlanda, processo em negociação. É verdade? Justificou a sua viagem.
Na verdade, o meu discurso deveria ter sido esse aqui, do Celso, não sei porque não me deram ele, já que você não ia ler. É isso mesmo.
Bem, utilizando o hábito da boa diplomacia brasileira, eu vou me ater ao discurso aqui, companheiro Celso. Vou falar com a alma, está aqui. Minha alma é o papel, meu filho.
É com grande satisfação que participo desta terceira edição da Conferência “Brasileiros no Mundo”, um evento que para mim tem um simbolismo muito grande, porque convivi com muitos de vocês quando eu não era presidente, quando era oposição, ou quando era dirigente sindical. E aí, viu, Celso, a minha gratidão ao Itamaraty é porque mesmo quando eu não era presidente da República, ou quando eu era dirigente sindical, que eu e o Marco Aurélio viajávamos pelo mundo afora, que a gente comunicava à embaixada, nós sempre fomos tratados e respeitados como cidadãos brasileiros e sempre recebemos muito carinho. Portanto, esse evento, para mim... eu espero que pelo menos aqueles que eu promovi me recebam bem agora, como ex-presidente.
Bem, aqui temos a oportunidade de trocar ideias sobre as diversas iniciativas, vocês já fizeram essas conversas com o companheiro Celso Amorim... Eu vou deixar o meu documento aqui, porque eu quero falar mesmo é (incompreensível).
Olhem, eu acho que... tem uma imagem na minha cabeça, que foi do ano passado, que foi quando eclodiu a crise econômica nos países ricos. A primeira leva de brasileiros que estavam no Japão, que vieram trabalhar no Brasil. E eu tive a oportunidade de encontrar um deles em Recife, trabalhando no Estaleiro Atlântico Sul. E eu pude sentir o orgulho que aquele companheiro estava, de poder ter vindo para o Brasil trabalhar, diferentemente do momento em que ele tinha saído do Brasil para poder sobreviver no Japão.
Nós, hoje, temos alguns milhões de brasileiros morando no exterior. E nós, hoje, podemos dizer, com muito orgulho, que o Brasil oferece hoje mais oportunidades do que alguns países que nós consideramos países ricos, países de Primeiro Mundo. E, certamente, haverá espaço, nas mais diferentes áreas, para que os brasileiros possam voltar, inclusive no mundo, eu diria, da pesquisa, no mundo da ciência, tem muita gente voltando para o Brasil. E eu acho que esse será um caminho que não tem mais retorno. Obviamente que ficarão lá fora as pessoas que constituíram família, que queiram ficar lá fora, ou que tenham alguma coisa muito vantajosa para ficar lá fora.
Mas se a economia brasileira continuar a crescer no ritmo que está crescendo, eu penso que não faltará lugar para que os milhões de brasileiros que estejam fora comecem a regressar para o nosso país e aqui prestarem o trabalho que estão prestando lá fora, quem sabe de forma muito mais prazerosa.
Eu estava, agora, dando uma entrevista para a imprensa estrangeira, e eu estava lembrando algumas coisas importantes que estão acontecendo no Brasil. A Dilma será uma presidenta que tomará posse, e ela não receberá nenhuma herança maldita, como eu disse que recebi e como outros presidentes recebem pelo mundo afora. Porque a Dilma ajudou a construir o Brasil que ela própria vai receber.
Mas eu estava dizendo na entrevista coletiva que a situação do Brasil, hoje, é uma situação altamente privilegiada, se comparado a muitos outros países do mundo. Eu não imaginei viver até o dia em que eu pudesse dizer isso e, muito menos, eu imaginei, em algum momento, que eu iria dizer isso no final do meu mandato na Presidência da República. Jamais imaginei, porque todas as vezes que eu concorri às eleições neste país, o país estava quebrado. O país estava tão quebrado que muitas vezes eu me perguntava se valia a pena, às pessoas que me diziam que o Brasil estava quebrado, se valia a pena eu ser candidato a presidente. Havia gente que dizia que o país não tinha jeito.
E, certamente, o Brasil não teria jeito se a gente olhasse o Brasil com os mesmos olhos que alguns olharam o Brasil durante muito tempo. Era preciso fazer algo diferente, e era preciso tentar incluir aqueles que estavam fora do mercado, fora da universidade, fora do consumo, no Brasil, para que essas pessoas pudessem contribuir com o crescimento do Brasil.
E hoje, quando a gente olha o mundo... e podem pegar a Alemanha, podem pegar os Estados Unidos, podem pegar qualquer país, possivelmente só a China é que pode ter coisas mais importantes. Mas de todas as hidrelétricas que estão sendo construídas no mundo, hoje, as três maiores estão sendo construídas simultaneamente no Brasil: Santo Antônio, Jirau e Belo Monte. De todas as ferrovias que estão construídas no mundo, certamente três das maiores estão sendo construídas no Brasil: a Ferrovia Norte-Sul, que estamos terminando e que vamos começar o trecho Anápolis-Estrela D’Oeste, em São Paulo; a Transnordestina, que é uma ferrovia de 1,9 mil quilômetros, ligando Pernambuco ao Ceará, Suape a Pecém, passando por Eliseu Martins, no Piauí; e a Oeste-Leste, que eu vou, no dia 14, dar início de obra na Bahia, ligando o Porto de Ilhéus à Ferrovia Norte-Sul, no estado de Tocantins, e com o projeto futuro para chegar até Belém.
Se você imaginar o que está acontecendo na área de energia, na área de combustível, possivelmente as quatro maiores refinarias do mundo, em construção, estão sendo construídas no Brasil, hoje: o Comperj, aqui no Rio de Janeiro, que é um projeto de 20 bilhões de dólares; a Refinaria do Maranhão, que é um projeto de uma refinaria de 600 mil barris/dia, que vai precisar de um investimento de US$ 19 bilhões; a Ferrovia do Ceará... a Refinaria do Ceará, que é para 300 mil barris/dia, com um investimento de quase US$ 15 bilhões; a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que está num estágio mais avançado, num custo de US$ 12 bilhões; e a Clara Camarão, lá no Rio Grande do Norte, que está pronta para inaugurar, essa é uma pequena, de 35 mil barris/dia. Ou seja, na verdade, os investimentos em refinarias, nesse período, vão chegar a quase US$ 60 bilhões para construir refinarias, que o Brasil não construía; desde 1980, o Brasil não fazia uma refinaria.
Além disso, vocês, brasileiros que moram no exterior, que haverão de um dia regressar de livre e espontânea vontade, não por necessidade, mas porque já cumpriram com aquilo que levou vocês para fora, e a perspectiva aqui dentro será muito melhor, nós temos... Além disso, nós temos um investimento previsto de US$ 224 bilhões pela Petrobras, na exploração do pré-sal. Acho que não existe, na indústria petrolífera do mundo, nenhum país que tenha um investimento programado em tão curto espaço de tempo, que vai transformar o Brasil em um dos países mais poderosos na indústria petrolífera.
Lembrando que foi exatamente no nosso governo que aconteceu, há três meses, a maior capitalização da história do mundo capitalista. Aí, sinceramente, é um paradoxo na minha vida, porque eu nasci metalúrgico, depois virei socialista, depois criei um partido socialista. E foi exatamente esse metalúrgico socialista que vai passar para a história como o Presidente que promoveu a maior capitalização da história da Humanidade. Ou seja, a Petrobrás, que valia apenas 15 “merrecas” de bilhões de dólares, hoje vale o equivalente... o valor dela é praticamente de US$ 203 bilhões, a segunda empresa de petróleo do mundo, a quarta empresa em energia do mundo.
E, portanto, é esse Brasil que vai ter, daqui a quatro anos, a Copa do Mundo. É esse Brasil que daqui a seis anos vai ter as Olimpíadas. Coisas que a gente jamais imaginava que fossem voltar para o Brasil, porque o pessimismo aqui era tão grande... Hoje eu vi no jornal, Celso, que o Brasil é o país de maior otimismo na América Latina. Olha só a cara do Presidente, para você ver o que é otimismo. Este país que, depois de eleger um metalúrgico, elegeu uma mulher presidenta da República. Este país merece tratar os nossos compatriotas que moram no exterior de forma mais humana, de forma mais civilizada.
A gente pode falar aqui, viu, Celso, porque não é demérito para ninguém, era uma visão. Eu cheguei a encontrar embaixador em alguns países em que ele tratava o brasileiro indocumentado como se fosse um marginal. Ele poderia ser um marginal para o país, mas não para o nosso embaixador. A nossa embaixada era o único refúgio que ele deveria ter. Eu me lembro de uma discussão que eu tive uma vez com um cônsul: “Não, porque os brasileiros que estão marginais”. Marginal não, meu filho, você não pode dizer isso. O governo do país pode dizer, mas você não; você tem que pegar esse brasileiro e trazer para dentro de casa. Essa é uma mudança de comportamento, é uma mudança política, é uma mudança cultural, que tem que acontecer.
Eu não me iludo, Celso, porque nós cumprimos tudo o que nós nos prometemos. Você está lembrado que eu fiz uma carta, uma carta aos brasileiros que moravam no exterior, em 2002. Portanto, o compromisso, Crivella, não é de agora não. E nós cumprimos tudo, não cumprimos, Celso – que estava na carta? Agora, também não me iludo. Não me iludo, porque acho que a vida é assim. Na medida em que vocês conquistaram tudo, em vez de vocês falarem “obrigado”, vocês vão apresentar uma pauta mais dura ainda, uma pauta com mais coisas... E é assim mesmo que tem que ser. E a gente não tem que ficar de cara feia porque vocês apresentaram uma nova pauta. E, se vocês apresentarem uma pauta e a gente atender, vocês vão fazer outra pauta. É assim que caminha a democracia, assim caminham as conquistas da Humanidade, e assim caminham as conquistas dos nossos brasileiros que estão no exterior.
Então, companheiros e companheiras, eu sei que eu ainda vou viajar o mundo, eu sei que eu ainda vou encontrar muitos de vocês, mas eu queria dizer para vocês: Eu sonho, eu sonho que não está longe o dia em que só estará no exterior o brasileiro que quiser estar no exterior. Ou porque ele foi trabalhar, ou porque ele foi convencido pelo salário, ou porque ele foi estudar, ou porque ele foi jogador de bola, qualquer coisa. Mas ele não estará mais fora fugindo daquele tempo tenebroso em que nós passamos 20 anos sem gerar emprego em lugar nenhum deste país. Muitos de vocês foram embora para poder adquirir o direito de comer outra vez, e nós queremos dizer para vocês: este país está pronto para garantir o direito de comer a todos os brasileiros, aqui dentro do Brasil.
Eu estou certo de que o Brasil tem pela frente alguns anos excepcionais. O que está acontecendo neste país é uma coisa que eu sonhei muito tempo, e que muitos vocês sonharam. Este país não pode mais ser governado para 30% da população.
Eu vi, nesses dias, em um jornal, fiquei até me deleitando de alegria, quando vejo que um jornal que sempre falou mal de mim é obrigado a dizer, numa manchete, que a classe D já é mais numerosa dentro das universidades do que a classe A. Na verdade, a classe D, nesses sete anos, cresceu cinco vezes o número de gente mais pobre na universidade. No ProUni, quarenta por cento dos estudantes são negros e negras. Certamente nós temos no ProUni hoje, no Brasil, Celso, mais estudantes do que tudo que a gente teve a vida inteira, na história deste país.
Então, eu acho que está perto do dia em que a gente vai chegar em um banco, o gerente vai ser negro, um dentista vai ser negro, um médico vai ser negro, o embaixador vai ser negro. Está chegando a hora, e eu acho que isso é uma conquista extraordinária de todos nós.
Eu queria lembrar a vocês que quando, na crise econômica de 2008, os países europeus, alguns começaram a perseguir os imigrantes, alguns começaram a perseguir até ciganos, outros começaram a perseguir não sei quem, aqui no Brasil, nós legalizamos mais de 150 mil paraguaios, bolivianos, companheiros que viviam na ilegalidade, nós trouxemos para a legalidade, para dizer que a gente não vai resolver o problema da incapacidade de governança dos dirigentes jogando a culpa nos coitados dos imigrantes, como se tenta jogar no mundo inteiro.
Então, parabéns. No meu discurso estava dizendo que eu ia dar posse, mas vocês já tomaram posse, já foram apresentados. Então, considerem-se empossados, vocês não vão ganhar nada, apenas mais responsabilidade e mais prazer de servir o Brasil lá fora.
Um beijo no coração, um grande abraço e até outro dia.