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O Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, explicou ao analista da Newsweek Leonid Ragozin que os BRICs não podem ser classificados como aliança política já que não têm inimigo e duvidou da suposta fraude nas eleições iranianas.
NW - A concepção dos BRICs surgiu a partir da hipótese de que, até o final do século, esses quatro países passem a controlar a maior parte da economia mundial. Para que existe a organização política dos BRICs? Para dominar o mundo?
CA - Para dominar o mundo, não. Vamos dizer que isso se faz para gerir o mundo de uma forma mais democrática e diversificada. A história conhece muitos casos em que grupos de países se apresentaram como uma espécie de aristocratas de política mundial. Não considero útil a reprodução dessa prática.
Porém, se um maior número de países tiver maior importância, teremos uma ordem mundial melhor.
NW - A respeito da democracia: pelo menos, dois países membros dos BRICs têm problemas nesse aspecto. Como se sente nessa companhia?
CA - Respeitamos os processos que se desenvolvem em cada país. Com certeza, somos uma sociedade muito aberta e democrática. Mas isso não se fez de um dia para outro. Apenas há 20 ou 25 anos estávamos com junta militar. Não só passamos a ser um país democrático, mas também estamos solucionando problemas sociais extremamente complexos que se iam acumulando ao longo dos séculos. Penso que um diálogo entre os países favorece a um diálogo dentro desses países. Que traz resultados positivos. Ou seja, sentimo-nos em boa companhia.
NW - Muitos dizem que os BRICs representam uma maneira de diminuir o papel dos Estados Unidos no mundo. Está de acordo?
CA - Estamos vivendo num mundo em mudança constante. Fazemos parte de outras reuniões de países, por exemplo, IBAS, que inclui a Índia, o Brasil e a África do Sul. São também três países em desenvolvimento e três grandes democracias, cada em seu continente. Além disso, estamos envolvidos em processo de integração no continente Sulamericano. E, evidentemente, temos uma parceria estratégica com a União Européia. Tudo isso é necessário para a criação de uma ordem mundial mais diversificada. Ao mesmo tempo nossas relações com os Estados Unidos são simplesmente excelentes. Após a queda do Muro de Berlim houve receios de que poderia surgir um mundo monopolar sujeito à vontade dos Estados Unidos, mas esses receios não se concretizaram. O mundo está se tornando cada vez mais diversificado e os BRICs são parte desse processo, mas não a parte única.
NW - Como serão os BRICs em 2050? Estão caminhando na direção de aliança política?
CA - É muito cedo falar de aliança. Uma aliança pressupõe existência de um inimigo. Nós não temos inimigo. Simplesmente queremos construir um mundo melhor e mais multifacetado.
NW - Qual foi a agenda brasileira em Ecaterimburgo?
CA- Discutimos a coordenação de ações [dos BRICs] nas Nações Unidas e, o que é mais importante, no quadro do G-20. Embora os BRICs tenham sido inventados por economistas da Goldman Sachs, quando começamos a encontrar-nos nesse formato em nível de chefes de chancelarias e ministros de economia nem podíamos prever essa crise. E aí os BRICs serviram de grande instrumento para a coordenação de posições das maiores economias em desenvolvimento do mundo, que têm papel-chave para tirar o mundo da crise.
NW- No âmbito dos BRICs, discute-se a questão de nova moeda de reserva mundial?
CA- Essa questão tem surgido periodicamente. Não penso que isso possa acontecer imediatamente e duvido que alguém de nós queira enfraquecer o dólar, simplesmente porque muitos de nós têm reservas em dólares. Mas penso que pouco a pouco vamos passar para soluções de pagamento mais internacionais. Será um longo processo que não queremos que seja doloroso. Se o fizermos instantaneamente haverá crise.
NW - Qual a probabilidade de que os BRICs tenham mais votos no FMI? Trabalham sobre esse tema como um time?
CA -Com certeza, nossos ministros de economia trabalham conjuntamente sobre esse tema. Quando estava lendo o Financial Times chamou minha atenção o fato de que à reunião de ministros dos BRICs foi dedicado quase o mesmo espaço que à reunião de ministros do G-20. Por isso, com certeza, estamos agindo conjuntamente e queremos reformar a estrutura do FMI e do Banco Mundial, de modo a melhor refletir a estrutura do mundo real.
NW - Qual a posição brasileira diante dos acontecimentos no Irã? Considera legítima a vitória de Ahmadinejad nas eleições?
CA - É preciso ainda ver isso com mais atenção. Eu próprio não posso dar avaliações. Nossa embaixada comunica que lá houve protestos. Mas seria muito difícil supor que tal vantagem - 62 % [Ahmadinejad] e 33 % [Musavi] - se explique com falsificações. Outra coisa é que há vários métodos de influência sobre os eleitores. Mas é positivo o próprio fato de que as eleições se tenham realizado e tenha havido discussão aberta.
NW - É possível o encontro entre o Presidente Lula e o Presidente Ahmadinejad em Ecaterimburgo? (o encontro acabou não se realizando. - Newsweek)
C - Não sei se suas agendas vão convergir. Mas não acho que ele tenha objeções se tal encontro fosse possível.