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Mensagem do Ministro Mauro Vieira por ocasião da abertura do Módulo de Clima do Programa de Formação de Lideranças Indígenas na Política Global
É uma grande satisfação, uma grande honra, receber no dia de hoje aqui no Instituto Rio Branco – a mais antiga academia diplomática do mundo, e que esta semana completará 80 anos – a ministra Sonia Guajajara, juntamente com as lideranças indígenas, os candidatos ao curso que agora lançamos, bem como os recém-ingressos na Carreira Diplomática.
A realização da COP30, em Belém do Pará, esse ano, representa um marco histórico não apenas para o nosso país, mas para todos os povos da floresta. Pela primeira vez, uma Conferência das Partes da Convenção do Clima será realizada no coração da Amazônia. Essa escolha evidencia o papel central das florestas na agenda climática global e reconhece a Amazônia como o que ela é: um eixo vital da estabilidade planetária. Essa foi a razão que levou o Presidente Lula, ainda como presidente eleito, a lançar a candidatura do Brasil, e na cidade de Belém, para a realização da COP.
No entanto, o momento exige mais do que celebrações. Exige responsabilidade, coragem e ação.
A ciência nos alerta com cada vez mais urgência: a Floresta Amazônica corre o risco real de atingir um ponto de não retorno. A chamada “savanização” do bioma pode se tornar irreversível se dois fatores se combinarem — um desmatamento acumulado superior a 80% e o aquecimento global ultrapassando 1,5ºC. E, ainda que o Brasil não derrube mais nenhuma árvore, se cruzarmos esse limiar de temperatura, poderemos testemunhar o colapso da Amazônia até 2050.
Isso significaria mudanças drásticas no regime de chuvas em toda a América do Sul, afetando colheitas, rios, cidades. Significaria a perda de um dos maiores estoques de carbono do mundo, liberando ainda mais gases de efeito estufa na atmosfera. Significaria abrir as portas para uma cascata de efeitos climáticos, sociais e econômicos, com consequências imprevisíveis.
Como já expressado na Declaração de Belém, resultado da Cúpula da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, convocada pelo Presidente Lula em Belém do Pará em agosto de 2023, os países amazônicos estão unidos na preocupação com esse risco. Porém, mais do que preocupação, estamos determinados a agir.
Sabemos que a Amazônia não é apenas floresta. É também povo. Ou, devo dizer, “povos”. São vocês, guardiões da floresta, que há séculos mantêm vivas as práticas de proteção, manejo sustentável e respeito à vida em todas as suas formas. São os povos indígenas e as comunidades tradicionais os principais responsáveis pela conservação de vastos territórios que estocam carbono, abrigam biodiversidade e asseguram que a floresta se mantenha em pé.
Por isso, a COP30 será uma oportunidade sem precedentes para que as vozes indígenas estejam no centro do debate global. Queremos que as demandas, os saberes e as propostas dos povos originários possam ser ouvidos e conhecidos internacionalmente — influenciando compromissos em mitigação, adaptação, financiamento climático e transição justa.
Com esse espírito, o Governo brasileiro criou o programa Kuntari Katu — e agradeço à Ministra Sonia a explicação do sentido da expressão — um espaço de formação e protagonismo indígena em política externa, que integra o plano de ação do Ministério das Relações Exteriores do Programa Federal de Ações Afirmativas. Um passo concreto para garantir que a diplomacia brasileira continue a ser uma liderança global na governança climática, na proteção da biodiversidade e na promoção dos direitos dos povos indígenas.
O Kuntari Katu é uma expressão de nosso compromisso com uma diplomacia inclusiva, inovadora e transformadora. E representa um avanço na luta por justiça climática e ambiental, ao garantir que os povos indígenas não apenas participem, mas influenciem os rumos das negociações internacionais.
Sabemos que o tempo é curto. Cientistas vêm alertando que o ritmo do aquecimento global ultrapassou projeções anteriores. Combater a mudança do clima não é apenas uma questão ambiental — é uma questão de sobrevivência coletiva.
Apesar dos desafios geopolíticos e socioeconômicos, a COP30 precisa ser o momento decisivo de fortalecimento do multilateralismo e da cooperação entre os povos. Estamos determinados a garantir que, daqui a dez anos, os países, setores e comunidades que liderarem as transições energética, digital e da bioeconomia estejam na vanguarda de um novo modelo de desenvolvimento — justo, sustentável e inclusivo.
Agradecemos a presença e o engajamento de cada um de vocês. A participação ativa dos estudantes indígenas neste processo nos inspira e nos enche de esperança.
Nesse sentido, registro minha satisfação em aproveitarmos esta ocasião para assinar o Acordo de Cooperação técnica entre o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério dos Povos Indígenas e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que tem por finalidade conceder bolsas de estudo para candidatos indígenas ao Curso de Admissão à Carreira Diplomática. Trata-se de iniciativa fundamental, que segue o modelo que é aplicado para candidatos do Programa de Ação Afirmativa. Inicialmente, serão concedidas 2 bolsas a alunos indígenas, mas espera-se ampliar esse número em breve. A maioria dos diplomatas pretos e pardos das novas gerações se beneficiou do programa. O Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco foi o primeiro na esplanada e já inspirou iniciativas semelhantes em outros órgãos, o que esperamos seja mais uma vez replicado, agora para os candidatos indígenas. Mais uma vez, eu quero agradecer a presença de todos, quero agradecer a presença da Ministra Sonia Guajajara, que muito nos inspira e muito nos honra no dia de hoje.
Muito obrigado a todos.