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Brasil e Asean: um novo olhar ao Sudeste Asiático (Correio Braziliense, 7/10/2023)
Embarco hoje em um périplo internacional pelo Sudeste Asiático, que incluirá passagens pela Indonésia, Camboja e Filipinas. Além de reuniões com esses três importantes parceiros, manterei diálogo com a Associação dos Países do Sudeste Asiático (Asean), agrupamento que reúne as economias mais dinâmicas do mundo na atualidade.
Minha viagem é parte do reencontro do Brasil com sua política externa universalista e com seus parceiros do mundo em desenvolvimento, iniciado em janeiro. Mas ela é também muito mais do que isso, sob a orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estamos construindo uma diplomacia que molde não apenas o nosso presente, mas que sobretudo prepare o Brasil para o futuro que se anuncia.
Os números desse relacionamento falam por si: o Brasil exporta hoje para cinco economias da Asean (Singapura, Malásia, Tailândia, Indonésia e Vietnã) mais do que o total que vende para cinco das economias do G7 (Japão, Alemanha, Reino Unido, França e Itália). O comércio com o Sudeste Asiático, que em 2002 era de US$ 2,9 bilhões, ampliou-se para US$ 34 bilhões em 20 anos. As trocas comerciais com a Asean respondem hoje por quase um quarto do superavit da balança comercial brasileira. São dados de impacto, desconhecidos pela grande maioria. Dados que ilustram a importância estratégica da região para o Brasil.
Com uma economia combinada de US$ 3,6 trilhões e população de 680 milhões de pessoas, a Asean cresce há décadas como nenhuma outra região do mundo. Com uma média de expansão do PIB de 5,7% entre 2000 e 2019, a Asean responderá neste ano por 10% de todo o crescimento da economia mundial, e sua estrutura demográfica permite antever grande potencial no futuro previsível.
Esse cenário requer do Brasil atenção às oportunidades que surgem do acelerado desenvolvimento vivido pelo Sudeste Asiático. A tarefa de desenvolver plenamente esse potencial exigirá da diplomacia e da sociedade brasileira, necessariamente, ir além do aspecto puramente comercial e construir relacionamentos genuinamente políticos, com base em laços humanos fortes. Em Jacarta, participarei da primeira reunião Brasil-Asean, que marca o lançamento da Parceria de Diálogo Setorial entre o Brasil e a Associação. Inaugurarei também a Missão do Brasil junto à Asean, criada para melhor posicionar nossa diplomacia na interlocução com essa região estratégica, a exemplo do que já fazem 11 dos países do G20.
Nas conversas preliminares com a Aseba, identificamos que o Brasil tem muito a se beneficiar, em especial na cooperação científica e tecnológica. O Itamaraty mapeou os sistemas de inovação das cinco principais economias da Asean e está promovendo, desde agosto, o “Brazil-Asean Innovation Sessions”, série de eventos on line de ciência, tecnologia e inovação em temas como startups, semicondutores e mobilidade sustentável. A partir das demandas da Asean, em áreas diversas como energias renováveis, agricultura sustentável e saúde pública, tornou-se claro que também temos muito a oferecer por meio de projetos capitaneados pela Agência Brasileira de Cooperação (ABC), que é instituição de referência na cooperação entre países do Sul Global.
Na capital indonésia, abrirei o seminário Ethanol Talks, organizado em parceria entre o Itamaraty e a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Única), que levará àquela região do mundo soluções brasileiras para a transição energética. Levarei também a disposição brasileira de cooperar com a Indonésia na construção de sua nova capital, Nusantara, com base na experiência da construção de Brasília.
A viagem ao Sudeste Asiático contará com significado político adicional, pois farei também as primeiras visitas de um chanceler brasileiro às Filipinas e ao Camboja, país que acaba de abrir sua embaixada residente em Brasília, em sinal do interesse que nosso país — com seu potencial econômico, ambiental e diplomático — voltou a despertar em nossos parceiros. Minha visita servirá também para preparar a primeira missão empresarial oficial brasileira a Phnom Penh. Em Manila, firmaremos acordos na área de cooperação técnica e exploraremos oportunidades para diversificar as exportações brasileiras.
Encruzilhada de culturas e foco antigo de disputas geopolíticas, o Sudeste Asiático soube sobreviver de forma pragmática e bem sucedida a sucessivas transformações internacionais. Berço do movimento não alinhado, a região é ator central para promover o diálogo na região da Ásia-Pacífico, consolidando sua capacidade de dirimir tensões, sobretudo no Mar do Sul da China. No atual momento de reorganização política global, é ainda mais relevante a aproximação do Brasil com a Asean, no esforço de construção de uma coalizão de países em desenvolvimento que defendem, acima de tudo, o direito à própria autonomia.