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Seminário “Cooperação Técnica Brasileira: Agricultura, Segurança Alimentar e Políticas Sociais”
Discurso do Ministro Antonio de Aguiar Patriota - Roma, 24 de junho de 2011
"O Brasil logrou promover nos últimos anos uma enorme redução da pobreza em seu território. Tornou-se pela primeira vez um país majoritariamente de classe média. Nesse período, sua economia não só cresceu, mas o fez de forma a possibilitar uma melhor distribuição da renda. Essa inclusão social, em grande medida, se deve às políticas públicas formuladas e implementadas para a agricultura, o desenvolvimento agrário, o meio ambiente, a pesca e a segurança alimentar.
Tenho a satisfação de afirmar que, em um período equivalente ao de uma geração, mudamos nosso país. Mudamos nossa realidade e queremos contribuir para mudar a daqueles que são nossos vizinhos, nossos parceiros e compartilham conosco a idéia de que um mundo mais seguro é um mundo menos desigual, menos assimétrico e com menos insegurança alimentar.
Se, em uma geração, passamos a ser um dos maiores exportadores líquidos de alimentos do mundo, se logramos conjugar a produção de biocombustíveis com o aumento da segurança alimentar, se conseguimos expandir nossa produção de alimentos e melhorar a proteção do meio ambiente, foi porque soubemos inovar, incluir e compartilhar.
INOVAR
Inovar porque investimos em tecnologia, em pesquisa e em desenvolvimento. Criamos instituições como a EMBRAPA, os serviços de assistência técnica e extensão rural e diversas Universidades públicas.
A EMBRAPA, por exemplo, para contribuir para a criação de nossa agricultura tropical priorizou a formação de recursos humanos. Possui cerca de 9 mil funcionários, dos quais 2 mil são pesquisadores - 21% com mestrado, 71% com doutorado e 7% com pós-doutorado. Sob coordenação da EMBRAPA está o Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, que desenvolveu novas tecnologias e mudou a agricultura brasileira. Isso possibilitou, por exemplo, a incorporação do cerrado ao sistema produtivo, tornando essa região responsável por cerca da metade da produção de grãos do Brasil.
Esses investimentos em tecnologia, adaptando muitas vezes culturas de clima temperado às condições brasileiras, fizeram com que o Brasil se tornasse o segundo produtor mundial de soja. Fizeram com que, no período de 1975 a 2009, a produção de leite aumentasse em três vezes, a oferta de carne bovina e suína se multiplicasse por quatro e a de frango por 22. O desenvolvimento de soluções e de tecnologias específicas para a nossa realidade fez com que o Brasil se tornasse não só o maior exportador mundial de proteína, mas também conseguisse conciliar aumento de segurança alimentar com melhoria na qualidade dos alimentos. Saliento que atingimos essa situação apesar das barreiras tarifárias, técnicas, sanitárias e fitossanitárias dos países desenvolvidos, apesar dos subsídios das economias ricas que tanto afetam o comércio agrícola internacional.
INCLUIR
Incluir porque soubemos conjugar a competitividade do agronegócio com a solidez da agricultura familiar. Entendemos que ambas as formas de organização da produção agrícola são complementares e não mutuamente excludentes. Compreendemos que cada uma dessas modalidades se adapta melhor a um determinado tipo de cultura ou de mercado. Essa sinergia entre agronegócio e agricultura familiar desenvolvida no Brasil em muito decorre dos múltiplos contextos geográficos e sociais do país. Diante de problemas tão variados, precisamos sempre encontrar soluções criativas e conciliadoras.
Incluímos igualmente porque tornamos o campo não só um fornecedor de alimentos e matérias-primas para as cidades e a indústria, mas também um importante mercado consumidor de todo tipo de bens e serviços. Fizemos com que a agricultura servisse de catalisador do nosso desenvolvimento, reduzindo discrepâncias regionais e migrações sazonais. A agricultura passou a ser um importante fator de distribuição de renda, atraindo investimentos para o interior do país e gerando oportunidades e empregos para milhões de brasileiros.
Vale lembrar que o Professor José Graziano da Silva, hoje candidato a Diretor-Geral da FAO, criou, durante o Governo do Presidente Lula, o programa “Fome Zero”. Criamos também o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), cujo objetivo é garantir o acesso a alimentos em quantidade e regularidade às populações em situação de insegurança alimentar e nutricional. Essa iniciativa contribui para a formação de estoques estratégicos e permite aos agricultores familiares armazenar seus produtos para comercialização a preços mais justos.
Outra iniciativa importante brasileira é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que garante a alimentação a alunos de toda a educação básica matriculados em escolas públicas. Seu objetivo é atender as necessidades nutricionais dos alunos, contribuindo para o crescimento, o desenvolvimento, a aprendizagem e o rendimento escolar dos estudantes; promovendo a formação de hábitos alimentares saudáveis. Por motivos legais, 30% dos recursos para a alimentação escolar devem ser alocados na compra direta de produtos da agricultura familiar, o que estimula o desenvolvimento econômico das comunidades, inclusive daquelas mais distantes dos grandes centros urbanos no país.
Incluímos também porque soubemos expandir nossa produção de alimentos, matérias-primas e biocombustíveis de forma sustentável. Essa questão da sustentabilidade do desenvolvimento permeará os debates da Conferência Rio+20, que sediaremos no ano que vem.
COMPARTILHAR
Compartilhar porque, por meio da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), temos posto à disposição dos países que nos procuram as experiências bem sucedidas de nossas instituições. Essa cooperação, que visa semear capacidade para o desenvolvimento autônomo, tem sido uma das formas que melhor expressa o compromisso de longo prazo da política externa brasileira com os países em desenvolvimento.
A cooperação técnica sul-sul brasileira caracteriza-se pela transferência de conhecimentos, pela ênfase na capacitação de recursos humanos e pela concepção de projetos que reconheçam as especificidades de cada país. Realiza-se com base na solidariedade que marca o relacionamento do Brasil com outros países em desenvolvimento. A cooperação técnica brasileira é livre de condicionalidades e não prevê lucros. Responde a demandas de países em desenvolvimento que acreditam que nossas soluções podem servir de referência para suas políticas e práticas.
O Brasil foi capaz de encontrar soluções próprias que podem aplicar-se outros países em desenvolvimento. A formação multicultural e multi-étnica do Brasil contribui para a adaptação de nossas propostas às características de outros países da América Latina, África, Oriente Médio, Ásia e Oceania.
O Brasil não se considera, no entanto, um "emerging donor". O Brasil considera que a cooperação sul-sul não deve ser concebida como uma ajuda (“aid”), mas sim como uma parceria. Os projetos de cooperação, dessa forma, são elaborados pelas autoridades brasileiras em conjunto com as dos nossos parceiros.
A ABC tem, nos últimos anos, buscado implantar uma nova estratégia de ação, que prioriza os projetos ditos “estruturantes”, que tendem a ter um impacto socioeconômico mais significativo.
Nossos projetos estruturantes contemplam desde fazendas experimentais para teste de variedades agrícolas brasileiras em solo africano até centros de formação profissional. Instalações permanentes de capacitação permitem a formação de um maior número de técnicos. Alguns projetos estruturantes têm alcance regional e recebem participantes dos países vizinhos. A estação experimental de algodão no Mali, por exemplo, recebe técnicos de Burkina Faso, do Chade e do Benim, enquanto a estação de arroz no Senegal receberá técnicos do Mali, da Mauritânia e de Guiné-Bissau.
A cooperação técnica brasileira contempla atualmente projetos em 81 países. Cerca de 45% dessa cooperação técnica se dá na América Latina e no Caribe e os demais 55% estão distribuídos entre África, Ásia e Oceania.
Diversos países desenvolvidos e organismos internacionais têm procurado o Brasil por suas capacidades técnicas, por sua identidade multicultural e por sua forma de atuar. Isso nos tem possibilitado agir também de modo trilateral em projetos de cooperação técnica. Seja com países desenvolvidos, seja com organismos internacionais, os projetos de cooperação técnica trilateral devem incluir nossos princípios, isto é, devem ser “demand driven”, destituídos de condicionalidades e sem fins lucrativos.
O Brasil desenvolve cooperação técnica trilateral com o Japão, a Alemanha, os Estados Unidos, a Itália, a França, a Austrália, o Reino Unido, a Espanha, entre outros. Assinou recentemente Memorando de Entendimento sobre cooperação técnica trilateral com Israel e Egito.
No caso dos organismos internacionais, nossa cooperação trilateral não se baseia na doação de recursos, mas sim na elaboração de projetos conjuntos. Nessas situações, as vantagens comparativas da cooperação técnica brasileira somam-se à experiência dos organismos internacionais. Esses, por possuírem representantes no Brasil, conhecem as práticas nacionais e podem recomendá-las para outros países em desenvolvimento. Na cooperação técnica trilateral com organismos internacionais, são sempre instituições brasileiras que transferem conhecimentos.
O Governo brasileiro, no intuito de cumprir com os compromissos que assumiu no ano passado por ocasião do "Diálogo Brasil-África sobre Segurança Alimentar, Combate à Fome e Desenvolvimento Rural”, não só ofereceu cursos de capacitação a técnicos africanos, mas também celebrou três programas de parceria com a FAO e o PMA em matéria de cooperação técnica. Os projetos a serem identificados no âmbito dessas iniciativas serão elaborados pelas instituições brasileiras, com o objetivo de replicar políticas públicas bem sucedidas no Brasil com as adaptações necessárias e sem perder de vista os objetivos da inclusão social e o combate à fome e à pobreza.
Nesse contexto, o Brasil e a FAO estão desenvolvendo um programa de parceria para o fortalecimento da agricultura e de promoção de segurança alimentar e nutricional em vários países da África. Essa iniciativa, financiada com recursos da ABC, contempla, entre outras ações, a implementação de projetos-piloto baseados no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
O Brasil, em parceria com a FAO e o PMA, também tem desenvolvido programas que visam ao fortalecimento das políticas de segurança alimentar e nutricional relacionadas à alimentação escolar. Esses programas contam com recursos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) e da ABC.
Os recursos destinados ao PMA deverão também contribuir para o funcionamento em Brasília do Centro de Excelência para Alimentação Escolar, Nutrição e Segurança Alimentar do PMA, que se dedicará à capacitação de pessoal de todas as regiões do mundo em desenvolvimento.
No intuito de apoiar a transferência de conhecimento, a EMBRAPA vem estabelecendo escritórios no exterior e conta hoje com representação em Gana, na Venezuela e no Panamá.
Em parceria com a ABC, a EMBRAPA vem desenvolvendo diversos projetos de cooperação técnica na área agrícola. Do início de 2010 até hoje, foram enviados por meio dessa parceria 262 técnicos para participar de atividades de cooperação técnica sul-sul, dos quais 92 à África, 165 à América Latina e 5 à Ásia.
O Governo brasileiro criou, em 2009, o Centro de Estudos Estratégicos e Capacitação em Agricultura Tropical (CECAT), onde técnicos podem ser formados em sistemas de produção sustentáveis concebidos para regiões com as características da Amazônia, do Cerrado, do Pantanal, do Semi-Árido e dos Tabuleiros Costeiros. Em 2010, o CECAT ofereceu cursos para 43 alunos estrangeiros. Para o período 2011 e 2012, o número de estudantes estrangeiros formados deverá ser superior a 300. Esses alunos terão acesso a cursos que contemplam os mais diversos temas, como produção de oleaginosas e carnes, agroenergia, agroecologia, biotecnologia, economia rural, informática na agropecuária, meio ambiente, monitoramento por satélite, processamento de alimentos e recursos genéticos.
Senhoras e Senhores,
Tudo o que o Brasil apresentará hoje no seminário “Cooperação Técnica Brasileira: agricultura, segurança alimentar e políticas sociais” já é realidade. Falaremos daquilo que sabemos fazer. Abordaremos políticas e soluções que já foram implementadas com êxito. Nesse contexto, teremos hoje três painéis temáticos, intitulados: Agricultura e Desenvolvimento Rural; Agricultura e Meio Ambiente; e Agricultura Familiar e Desenvolvimento Social.
Organizamos esse seminário porque acreditamos que as soluções que encontramos para alimentar 190 milhões de brasileiros podem de alguma forma contribuir para que todos os países possam conjuntamente alimentar mais de 7 bilhões de pessoas.
Em um mundo marcado por um descompasso entre o crescimento populacional e o crescimento da produção de alimentos, por restrições de acesso à água e à expansão da área cultivável, por severas condicionantes climáticas e ambientais, por assimetrias econômicas e carência de liderança política, acreditamos que podemos contribuir para a segurança alimentar de um número crescente de parceiros.
Para promovermos o desenvolvimento sustentável e atingirmos nossos objetivos de prosperidade coletiva em muito dependeremos da capacitação de recursos humanos. Nesse contexto, pomos nossa cooperação técnica à disposição de todos. Ofereceremos hoje vagas em 24 cursos porque acreditamos que somente faremos frente aos desafios do desenvolvimento se soubermos conjuntamente inovar, incluir e compartilhar. E porque acreditamos que a paz se constrói com o desenvolvimento e não há desenvolvimento sem progresso no âmbito da agricultura.
Muito obrigado."