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Discurso do Ministro Antonio de Aguiar Patriota por ocasião da cerimônia do Dia do Diplomata – Brasília, 17 de junho de 2013
É uma honra novamente contar com a presença da Senhora Presidenta da República na celebração do Dia do Diplomata.
Formalizamos hoje a incorporação ao Serviço Exterior brasileiro de mais uma turma egressa do Instituto Rio Branco – a turma Oscar Niemeyer.
Aos que se associam formalmente ao Itamaraty, minhas mais calorosas boas-vindas.
Parabéns pela trajetória para chegar até aqui.
Parabéns às famílias que prestigiam esta cerimônia e que têm justificadas razões para compartilhar a alegria deste momento.
Estimados formandos,
No trabalho que realizarão – ou, na verdade, já realizam – como diplomatas, Vocês terão a responsabilidade e o privilégio de representar um País que, neste início de século, se afirma como uma democracia voltada para o desenvolvimento sustentável, com crescimento econômico, redução das desigualdades e consciência ambiental; como um ator que vive a paz e privilegia o diálogo; como uma sociedade multicultural crescentemente engajada com o mundo.
Um País cujo Governo conquista resultados tangíveis no caminho da erradicação da pobreza e contempla novos horizontes em termos de bem-estar social, de padrões educacionais sempre mais elevados, de avanços científicos e tecnológicos, de respeito inegociável aos direitos humanos. Que tem na construção da plena cidadania seu objetivo maior.
Vocês servirão a um País que reflete em sua política externa os mesmos valores e as mesmas prioridades que o mobilizam no plano doméstico. Um País que, sob a condução de Vossa Excelência, Senhora Presidenta, se projeta no mundo de forma aberta e plural, como aberta e plural é a sociedade brasileira.
Senhora Presidenta,
Em 2011, celebramos o centenário de nascimento de San Tiago Dantas.
No ano passado, recordamos o centenário de morte do Barão do Rio Branco.
Este ano quero lembrar que, há cinco décadas, outro ilustre Chanceler do Brasil, João Augusto de Araujo Castro, pronunciava, perante a Assembleia-Geral das Nações Unidas, um discurso memorável.
Araujo Castro, um dos artífices da Política Externa Independente, apontava um caminho novo, que deveria ir além das polarizações ideológicas da Guerra Fria. Um caminho que se construiria com uma agenda formada por “três D's” que se tornariam famosos: o desenvolvimento, o desarmamento e a descolonização.
Passadas três décadas, em 1993, outro Chanceler brasileiro, dotado de sensibilidade não menos aguçada para a dinâmica dos tempos em mudança, propôs-se uma reinterpretação da agenda dos “três Ds”.
Também perante a Assembleia Geral da ONU, o Embaixador Celso Amorim – que a turma Oscar Niemeyer teve a sabedoria de escolher como Paraninfo – revisitou o mote de Araujo Castro, recordando que a luta pela descolonização, que mantém sua relevância, se traduz de forma mais completa, em nossos dias, na valorização da democracia.
Celso Amorim atualizou, então, os “três D's”. E passamos a falar, com ele, em desenvolvimento, desarmamento e democracia.
Ao fazer essa digressão, recordo, sempre em perspectiva histórica, que há dez anos estabelecíamos, sob a liderança do ex-Presidente Lula e do então Chanceler Amorim – já em sua segunda gestão à frente do Itamaraty –, um conjunto de objetivos e de iniciativas que ainda hoje ajuda a estruturar nosso trabalho como diplomatas.
Trata-se de plataforma que inclui:
- o aprofundamento de nosso compromisso com a integração regional, a partir de uma atenção diferenciada para com cada um de nossos vizinhos, em especial no âmbito do MERCOSUL, da UNASUL e, mais recentemente, também da CELAC;
- o olhar atento para as alterações aceleradas, em escala mundial, na distribuição do poder econômico e geopolítico, alterações que nos aproximam dos demais integrantes de foros como o IBAS e os BRICS;
- a projeção universal de nossa diplomacia, com ênfase na criação de novas e efetivas parcerias com o mundo em desenvolvimento, particularmente na América Latina, no Caribe e na África, e também no Oriente Médio, na Ásia e no Pacífico;
- a modernização de uma agenda de diálogo e de cooperação com os polos estabelecidos da economia global, como são os Estados Unidos, a Europa, o Japão, o Canadá, a Oceania;
- o engajamento com o multilateralismo em suas múltiplas vertentes – a comercial, a financeira, a ambiental, a social, a da paz e da segurança.
Essa plataforma se consolida e se atualiza, sob a orientação da Presidenta Dilma Rousseff, (i) na ocupação crescente de espaços na cena internacional; (ii) na contribuição continuada aos grandes debates políticos e conceituais da atualidade; (iii) na defesa de interesses específicos por intermédio da dinamização de relações com um número cada vez maior de parceiros em matéria de comércio, de investimentos, de inovação; e (iv) no aprofundamento da integração regional.
Uma das manifestações concretas da ocupação de espaços a que me refiro se traduz na eleição ou indicação para importantes cargos internacionais de personalidades brasileiras que demonstram ter o País liderança a desempenhar em uma ampla gama de temas. Sem ser exaustivo, não quero deixar de mencionar a escolha de José Graziano para a Direção da Organização para Agricultura e Alimentação – a FAO; de Bráulio de Souza Dias para a Secretaria-Executiva da Convenção sobre Diversidade Biológica; de Roberto Caldas e de Paulo Vannuchi para a Corte e a Comissão Interamericanas de Direitos Humanos; e, de forma especialmente paradigmática, de Roberto Azevêdo para a Organização Mundial do Comércio. São conquistas que revelam uma capacidade propositiva em campos tão diversos quanto a segurança alimentar, os direitos humanos, a cooperação econômica e comercial.
É possível afirmar que já não existe debate internacional de sentido estratégico em que as impressões digitais da política externa brasileira não estejam presentes: da democratização das estruturas de governança global e da consolidação do conceito de desenvolvimento sustentável, na Rio+20, ao impacto de oscilações cambiais sobre o comércio e às questões políticas e morais relacionadas com a proteção de civis em situações de conflito, para mencionar apenas alguns exemplos.
Ao mesmo tempo, são nítidos os dividendos obtidos em decorrência do aumento do número de Embaixadas, no estabelecimento de relações intergovernamentais com todos os membros das Nações Unidas. Dividendos que vão além da dimensão estritamente política, já em si de relevância intrínseca: a ampliação do alcance da ação diplomática representa, também, maior capacidade de apoio ao setor privado e a outros atores da sociedade brasileira com interesses que ultrapassam nossas fronteiras; condições aprimoradas de identificação de oportunidades de comércio e de investimentos; maior e melhor intercâmbio de conhecimento, inclusive ao abrigo do programa Ciência sem Fronteiras.
No plano regional, prioridade por definição, continuamos a sedimentar o espaço sul-americano como uma zona de paz e de cooperação, que tem na democracia um compromisso político irrenunciável, um requisito essencial dos processos de integração em curso. Continuamos, também, a promover, em nosso entorno imediato, uma zona de crescimento econômico com justiça social, em que as relações econômicas estão a serviço do desenvolvimento inclusivo que é nosso propósito comum. Nessa matéria, o MERCOSUL já representa um patrimônio de realizações de grande significado prático. O bloco ampliou-se e fortaleceu-se, com o ingresso da Venezuela como membro pleno. A Bolívia assinou Protocolo de Adesão para também tornar-se membro pleno. O Presidente do Equador oficializou publicamente a intenção de trilhar o mesmo caminho. E a Guiana e o Suriname se estão tornando Estados Associados. Ao valorizarmos o acervo do MERCOSUL – que traz ganhos decisivos para nossa indústria, que gera empregos de qualidade –, trabalhamos olhando para a frente. Trabalhamos para fazer mais e melhor. E, para além do MERCOSUL, mas sempre a partir dele, levamos adiante, desde há muito tempo, esforços de integração econômico-comercial com toda a nossa região – destino, não é demais lembrar, da maior parcela de nossas exportações de produtos manufaturados. Sob a égide da ALADI, negociamos uma rede de acordos que cobre, ou cobrirá, no futuro próximo, a quase totalidade das trocas em nossa parte do mundo. Essa já é uma realidade, que temos que administrar e sobre a qual seguiremos construindo.
As novas frentes abertas em nossa política externa, na região e no mundo, adquirem especial ressonância nos contatos que mantemos com o conjunto da sociedade brasileira. Com o Congresso, com o Judiciário e com os mais diversos segmentos sociais que, no País, buscam crescente participação nas dinâmicas de alcance internacional.
Especificamente quanto aos contatos com a sociedade civil, que já são frequentes, estamos agora trabalhando para institucionalizá-los.
A abertura ao diálogo, o saber ouvir e o fazer-se entender são parte integral do Governo democrático liderado pela Senhora Presidenta da República.
A experiência da Comissão Nacional Preparatória para a Rio+20, valiosa e efetivamente valorizada por todos os que dela participaram, nos anima a persistir nessa direção. Essa experiência nos encoraja a atrair a sociedade civil em suas múltiplas dimensões – e, eu diria, a juventude em particular – para os grandes debates relativos à política externa brasileira.
Antes do fim do ano, Senhora Presidenta, proporei a Vossa Excelência projeto, já em gestação, para que se crie um foro permanente de diálogo com a sociedade civil sobre política externa.
Está claro que a extensão de nossa presença no mundo nos traz, ao Itamaraty, responsabilidades acrescidas.
Faço questão de ressaltar nosso dever de assistência a brasileiros no exterior. A intensificação das relações do Brasil com outros países acentua a importância da atividade consular. É com satisfação que presto aqui uma homenagem de reconhecimento ao trabalho, tantas vezes difícil e tantas vezes silencioso, dos funcionários que se desdobram para garantir a nossos concidadãos que se encontram distantes do País, sempre que necessário, o melhor apoio possível e a adequada observância de seus direitos.
Senhora Presidenta,
Colegas de todas as gerações,
Senhoras e Senhores,
Algumas breves palavras sobre a escolha, pela turma que se forma, de Oscar Niemeyer, como seu Patrono, e de Celso Amorim, como seu Paraninfo.
É fácil, neste Palácio, fazer o elogio do grande arquiteto.
Com o passar dos anos, e o crescente reconhecimento de seu talento, Niemeyer tornou-se parte indissociável da imagem do Brasil no exterior, onde teve atuação profissional e presença destacada.
Entre tantas outras realizações, integrou o seleto comitê dos onze arquitetos que elaboraram o projeto do edifício-sede das Nações Unidas, um dos marcos da paisagem urbana de Nova York.
Fica, assim, de Niemeyer não somente o que ajudou a construir aqui no Brasil. Fica também a imagem brasileira que ele ajudou a projetar no exterior, a imagem verdadeira de um país que encarou de frente a modernidade, que teve a ousadia de sonhar novas formas de convivência.
Celso, colega e amigo de tantos anos – como Chanceler, Você deixou um exemplo que perdurará como referência para todos nós.
Seu conhecimento aprofundado dos dossiês, sua experiência, sua visão da grandeza do Brasil e do lugar que lhe cabe no mundo, todas essas são marcas indeléveis de seu legado como Ministro das Relações Exteriores.
Vocês não poderiam haver escolhido melhor Paraninfo.
Meus caros formandos,
Não faltam desafios, obstáculos, situações de tensão a exigir, de cada um, discernimento, preparo, tenacidade, imaginação, sangue frio.
Em conversa recente com um grupo de alunos do Instituto Rio Branco, eu observava que a diplomacia é uma carreira que envolve a personalidade em seu conjunto: a capacidade de iniciativa, de relacionamento humano, de lidar com imprevistos e com adversidades.
A formação intelectual, o rigor nas análises e nos pronunciamentos, esses são, sem dúvida, traços que permanecem essenciais para o bom desempenho das variadas funções que lhes serão atribuídas. Mas a disposição de enfrentar desafios, a coragem e a persistência na promoção dos valores e dos interesses do Brasil também o são.
E concluo com uma citação do escritor moçambicano Mia Couto, que há poucos dias, em Lisboa, recebeu, das mãos da Presidenta Dilma Rousseff e do Presidente Cavaco Silva, o Prêmio Camões de 2013.
Em conferência dirigida a professores e a alunos de uma instituição de ensino em seu país natal, afirmou esse expoente da literatura lusófona, e eu cito:
"Vocês são jovens. Ser jovens é uma condição inerente, que se exerce sem esforço. Mais do que jovens, sejam diferentes. Tragam para nosso tempo o inesperado, o que é novo, o que é historicamente produtivo. [...] [Não sejam] jovens de alma envelhecida. [...] [O] nosso futuro como nação não se constrói senão com ousadia, com vitalidade e um infinito respeito pelos outros."
Muito obrigado.