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Conferência Internacional sobre a Síria (Genebra II) - Montreux, Suíça, 22 de janeiro de 2014 - Intervenção do Secretário-Geral das Relações Exteriores, Embaixador Eduardo dos Santos
Intervenção do Secretário-Geral das Relações Exteriores, Embaixador Eduardo dos Santos, na Conferência Internacional sobre a Síria:
"Excelentíssimo Senhor Secretário-Geral,Permita-me transmitir a Vossa Excelência o apreço do meu Governo pela convocação desta reunião tão aguardada sobre a Síria. Estendo meus cumprimentos ao Representante Especial Conjunto Lakhdar Brahimi. Sempre apoiamos e continuamos a apoiar seu valioso trabalho. Também saúdo a presença do Secretário-Geral da Liga Árabe, Nabil al-Araby.
Estamos reunidos aqui hoje para tratar de uma das tragédias mais sangrentas do século XXI – o conflito que irrompeu na Síria três anos atrás e continua a assolar o país e ameaça envolver toda a região. Por um longo tempo a resolução desse conflito esteve comprometida pelo silêncio e a paralisia do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Como membro do Conselho no mandato 2010-2011, o Brasil buscou minimizar essa percepção de fracasso que apenas reforçou o chamado para uma reforma urgente e abrangente do Conselho de Segurança.
Na qualidade de representantes de um país que valoriza sua diversidade cultural e abriga milhões de brasileiros descendentes do Oriente Médio, saúdo calorosamente a abertura desse diálogo entre o governo sírio e grupos de oposição, facilitado pelas Nações Unidas.
O diálogo é urgente e indispensável para fazer avançar esforços de reconciliação nacional, atingir a paz sustentável e colocar um fim tanto na violência quanto nos abusos de direitos humanos. Também é essencial para assegurar um processo politico liderado pelos sírios que respeite as aspirações legítimas do povo sírio de determinar seu próprio futuro ao mesmo tempo em que se preserva a independência, soberania, unidade e integridade territorial da Síria.
Senhor Secretário-Geral,
Acredito que todos nós presentes nessa Conferência afirmamos em um momento ou outro que não há solução militar para o conflito sírio. Somente a negociação pode nos levar a um acordo aceitável que nos conduza à paz sustentável. No entanto, a guerra ainda devasta e coloca em perigo o futuro da Síria.
Não haverá solução para o conflito na Síria enquanto ambos os lados continuarem a receber recursos financeiros e armas do exterior. Não desejo repassar os números trágicos de mortos, pessoas deslocadas e refugiados que foram assinalados durante a Conferência de Doadores sobre Síria no Kuwait alguns dias atrás. Mas nunca deveríamos perder de vista o fato de que atrás das estatísticas existem pessoas de verdade, milhões delas. Suas vidas têm sido profundamente afetadas - e, no caso de dezenas de milhares, destruídas - pelo conflito na Síria.
Os países e organizações reunidos aqui hoje deveriam apoiar fortemente o diálogo político liderado pelos sírios. Esta Conferência deveria mostrar seu apoio não tentando determinar as decisões que as partes sírias deveriam tomar, nem aceitando a militarização do conflito. O melhor cenário para essa Conferência é formar um compromisso amplo e sólido para ajudar os sírios a superar pacificamente suas diferenças mediante negociações. Essa Conferência precisa encorajar um processo sírio com o apoio da comunidade internacional e não um processo internacional com participação síria.
Senhor Secretário-Geral,
O Brasil entende plenamente as dificuldades que enfrentamos a frente. Ao mesmo tempo, devemos nos sentir encorajados pelo fato de que estarmos todos reunidos aqui é em si mesmo um grande logro da diplomacia. A diplomacia permitiu a adoção do Comunicado do Grupo de Ação de Genebra em 2012, rompendo um impasse longo e destrutivo. A diplomacia também tornou possível alcançar um acordo para eliminar estoques de armas químicas na Síria, conforme determinado pela Resolução 2118 do Conselho de Segurança. Hoje, é nosso dever ajudar a encontrar pontos de convergência e estimular um acordo entre as partes sírias que levará a uma transição politicamente negociada.
O conflito sírio não é somente nacional, mas também uma crise regional com impacto mundial. O Brasil continua extremamente preocupado com os efeitos do conflito nos países vizinhos, que estão recebendo centenas de milhares de refugiados, tais como Líbano, Jordânia, Iraque e Turquia.
Renovamos nosso compromisso de apoiar esforços internacionais por meio das agências das Nações Unidas. Desde setembro de 2013, o Brasil decidiu facilitar vistos de entrada para todos aqueles nacionais sírios que buscam asilo. Meu país acredita que os princípios da solidariedade internacional e da divisão de responsabilidades deveriam nos guiar no que se refere aos nacionais sírios que buscam asilo em áreas fora das fronteiras imediatas da Síria.
Além disso, fizemos importantes contribuições financeiras a esforços de assistência humanitária das Nações Unidas na Síria e na região. Acreditamos que a recuperação política precisará ser construída com base na ajuda humanitária sustentada e na assistência de longo prazo ao desenvolvimento.
Senhor Secretário-Geral,
Precisamos agir oportuna e efetivamente. Medidas concretas são necessárias neste momento. Permita-me listar alguns passos que, na opinião do Brasil, são essenciais para alcançar uma solução política:
- Implementação imediata do Comunicado Final do Grupo de Ação, em particular o estabelecimento de um órgão de transição neutro com plenos poderes executivos e de um diálogo nacional abrangente e significativo;
- Acesso seguro, pleno e desimpedido a agentes humanitários e à assistência a pessoas em necessidade;
- Compromisso de todas as partes sírias de assegurar o retorno seguro daquelas pessoas deslocadas e refugiadas que querem voltar para as suas casas na Síria;
- Implementação imediata de medidas contra a violência baseada no gênero e daquelas medidas destinadas a proteger mulheres e crianças da violência sexual e do tráfico humano;
- Assegurar que todos os responsáveis por violações de direitos humanos sejam trazidos à justiça;
- Suspensão de todas as sanções econômicas unilaterais regionais conforme ressaltado pela Comissão Independente de Inquérito do Conselho de Direitos Humanos;
- Compromisso de todas as partes sírias com o cessar-fogo, que poderia ser estabelecido de forma progressiva em diferentes áreas do país, a ser monitorado por um mecanismo acordado mutuamente pelas partes envolvidas e pelas Nações Unidas;
- Estabelecer um embargo de armas abrangente e efetivo;
- Apoio continuado a esforços em andamento para remover armas químicas da Síria e destruí-las com segurança, processo este que já começou a dar resultados. Os prazos estipulados na Resolução 2118 do Conselho de Segurança devem ser estritamente observados.
Senhor Secretário-Geral,
O Brasil assinala firmemente seu renovado compromisso com os esforços internacionais visando a uma solução política para o conflito sírio. Estamos prontos a considerar possíveis mecanismos de seguimento a esta Conferencia que possam facilitar o diálogo político e o entendimento entre os próprios sírios.
Devemos às milhões de pessoas afetadas pelo conflito um esforço sustentado para ajudar as partes a superar suas diferenças. Vamos trazer paz finalmente e colocar um fim ao sofrimento suportado por tantos por tanto tempo.
Muito obrigado."