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Consumo colaborativo: trocar faz bem
MARTA MORAES
A brasiliense Valéria Novo é veterinária e andava incomodada com uma dor “eterna” nas costas. Ela então trocou a castração de um gato por dez sessões de acupuntura. Fred Cunha é relações públicas e se achava acima do peso. Maurício Camargo um personal trainer que adora ganhar novos clientes. Eles trocaram então um planejamento estratégico de comunicação por uma série de exercícios. Já Helena Mesquita faz salgadinhos caseiros e tem dois cachorros bem agitados, que, além dos salgados, adoram comer a espuma do sofá. Aí ela trocou os salgados para uma festa infantil pelo reparo no sofá. E deu certo.
Onde aconteceu tudo isso? Por meio do FaZoQuê, plataforma online de Brasília especializada em troca de serviços. O site tem como inspiração o consumo colaborativo. O conceito é baseado na troca, empréstimo ou compra de objetos usados, em vez de produtos novos, e na troca de serviços. Por exemplo: sabe aquele videogame que você não joga mais? Ao emprestá-lo a um amigo, ele não precisa comprar um novo, diminuindo o desperdício e conservando a energia e a matéria-prima que seriam usados em sua fabricação.
MAIS É MENOS
Esse tipo de troca de produtos ou serviços, claro, já existe há muito tempo. Mas agora ganhou força com o crescimento da internet e da preocupação ambiental, e a crise econômica no mundo. Os principais ganhadores com o consumo colaborativo são a sociedade e o meio ambiente: afinal, mais compartilhamento significa menos. Menos produção de bens, menos extração de recursos naturais e menos desperdício.
Por trás do consumo colaborativo está ainda outro fator: a crise econômica mundial. A ideia é que as pessoas não precisam ter a posse dos objetos ou pagar por serviços. Doar, compartilhar, alugar e trocar são os verbos do chamado consumo colaborativo, que é pautado no pensamento "o que é meu é seu".
É bem provável que você tenha uma furadeira em casa. O que talvez não saiba é que o uso médio de uma furadeira, em toda a sua vida útil, é de aproximadamente 40 minutos. A pergunta correta é: você precisa da furadeira ou do furo? Muitas vezes não é preciso possuir um bem para usufruir dos benefícios que ele pode trazer – e esse é o princípio do consumo colaborativo.
Surgido no final de 2008 nos EUA, o movimento vem ganhando cada vez mais adeptos no Brasil. Em artigo de 2011 da Revista Time, dos Estados Unidos, o consumo colaborativo foi elencado como uma atitude entre as dez coisas que vão mudar o mundo, o que pode ser provado pela quantidade de sites que se especializaram em fazer esse tipo de aproximação de pessoas com interesses complementares. É possível encontrar de tudo: de livros a furadeiras, de televisores a pessoas que decoram bolos de aniversário.
FAZ O QUÊ
Baseado no consumo colaborativo, o FaZoQuê segue uma tendência mundial onde as relações são construídas por meio da necessidade e oportunidade na troca de serviços. Profissionais de diferentes áreas interagem, divulgam suas habilidades e economizam dinheiro trocando serviços de forma rápida, fácil e gratuita.
O FaZoQuê existe desde 2013. São mais de 2 mil inscritos, e no momento existem 379 trocas contabilizadas. Segundo Saulo Sena, designer e um dos idealizadores do projeto, todos os retornos têm sido positivos.
Lançado por um grupo de oito amigos de Brasília, propõe uma forma de economia compartilhada para que, em épocas de crise, a comunidade continue produzindo, valorizando as relações pessoais e promovendo o encontro de profissionais de diversos segmentos e classes sociais. O cadastro na página é gratuito.
As áreas de construção civil e fitness têm os serviços mais procurados no site. Logo depois vem pets. Já as profissões mais cadastradas são especialistas em informática e comunicação (15% cada), administração e educação (8% cada) e saúde, jurídico e artes (5% cada). Depois de cada troca, os profissionais são analisados entre si e depois ranqueados de acordo com a avaliação recebida.
“O sistema é muito simples. O usuário procura o profissional que ele deseja e entra em uma sala de negócios, onde pode ou não trocar o serviço. Os profissionais podem trocar informações de contato e negociar a troca do serviço da maneira que acharem melhor”, explica Saulo. “As trocas são baseadas numa relação de confiança. Nos sentimos pioneiros em consumo colaborativo em Brasília e reunimos no site pessoas que acreditam no conceito”, conta ele.
Segundo Valéria Novo, a primeira troca que ela fez foi bem bacana, o que estimulou a veterinária a trocar de novo. “Da última vez, troquei uma consulta veterinária por ingressos de um show que queria ver. Acho que esse tipo de troca colabora com o meio ambiente e nos conscientiza sobre o nosso papel para um consumo mais consciente”, destacou.
TEM AÇÚCAR?
Outra iniciativa que vem fazendo bastante sucesso em termos de consumo colaborativo é o site Tem Açúcar?, versão brasileira de uma plataforma de empréstimos e doações entre vizinhos. A ferramenta online permite pedir emprestado e encontrar um vizinho nas redondezas que queira emprestar um abridor de lata, um furadeira ou um alicate. Depois, é deixar acontecer o encontro, o empréstimo, a troca.
A plataforma, que já possui 63 mil usuários cadastrados em todos os estados brasileiros, funciona da seguinte forma. Você se cadastra e lança seu pedido: que pode ser uma escada, um leitor de disquete (acredite!), um casaco ou até a fatídica furadeira. Segundo a criadora do projeto, Camila Carvalho, a troca evita o desperdício e aproxima as pessoas.
LIBERTE AS SUAS COISAS
No facebook existe a comunidade Free Your Stuff Porto Alegre , coordenada pela jornalista Luísa Fedrizzi, que já possui mais de mil participantes. O FYS permite a usuários interessados em doar ou receber objetos fazer suas ofertas e pedidos através do grupo na rede social. Aqui só a troca é permitida. O FYS (literalmente, "liberte as suas coisas") é uma ideia que surgiu na Alemanha, virou sucesso em diversas cidades europeias e está dando os primeiros passos no Brasil — em São Paulo, tem mais de 3 mil membros. A versão gaúcha nasceu em setembro do ano passado.
A ideia é simples: quem quiser se livrar de algum objeto em desuso dentro de casa, posta a foto do produto com as características na página da comunidade. Quem se interessar, responde que quer e, por mensagens privadas, as partes combinam a forma de entrega. E, por lá, vale quase tudo: de roupas a eletrodomésticos, de CDs virgens a produtos de cabelo, de fogões a instrumentos musicais. Seja por solidariedade ou sustentabilidade, são dezenas de doações que ocorrem por dia.
Uma pesquisa inédita realizada em 2015 pelo instituto Market Analysis identificou que o conceito consumo colaborativo não é novidade para 20% dos consumidores brasileiros, mas ainda não é muito praticado no país – a incidência é de apenas 7%. O estudou ouviu 900 brasileiros adultos residentes nas principais capitais do país e revelou que estar familiarizado com o conceito faz aumentar a prática. Pelo menos um em cada três familiarizados praticaram alguma forma de consumo compartilhado nos últimos 12 meses. Iniciativas inspiradoras surgidas nos últimos anos, como o FazoQuê, Tem Açúcar?, FSY, e muitas outras, mostram um novo caminho.
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Edição: Alethea Muniz
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