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Mais de 70% do território argentino é árido ou semi-árido
Brasília (DF) - A vizinha Argentina ocupa grande parte de seu território com agricultura, pecuária e produção florestal. Essas atividades trazem retorno econômico, mas também causam impactos significativos no ambiente natural, nas águas e nos solos, ampliando a cada ano as áreas erodidas e desertificadas. As zonas áridas e semi-áridas já somam 75% do território nacional, cerca de dois milhões de quilômetros quadrados (área maior que todo o Nordeste brasileiro). Essas regiões abrigam dez milhões de pessoas, quase um em cada quatro argentinos, e são responsáveis por 40% do Produto Bruto do país.
Todos esses fatores fazem com que o tema desertificação seja presença constante na agenda política argentina, afirmou Octavio Perez Pardo, director de Solos e Luta contra a Desertificação da Argentina (foto acima). Pardo foi um dos participantes da 1ª Conferência Sul-Americana sobre Combate à Desertificação , que aconteceu na última semana, em Fortaleza (CE). "A conservação do solo e o uso racional dos recursos naturais são temas estratégicos para o país", disse.
América Latina enfrenta desertificação e pobreza
De acordo com Sergio Zelaya (foto ao lado), coordenador para América Latina e Caribe da Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação, os países da região enfrentam acelerado processo de degradação ambiental e social, onde a desertificação estão atrelados à pobreza. Segundo ele, as populações mais empobrecidas e mais vulneráveis, cerca de 180 milhões de pessoas (população semelhante à brasileira), são justamente as mais afetadas por esses processos. "A desertificação chega a frear o desenvolvimento de algumas nações, principalmente das mais pobres", disse.
Dos 33 países da região, onze já concluíram seus planos nacionais de combate à desertificação, outros 11 devem finalizá-los até setembro deste ano (ver tabela abaixo), e o restante, até outubro de 2005. Segundo o representante das Nações Unidas, quanto mais os planos nacionais de combate à desertificação estiverem articulados política e socialmente, tanto mais fácil será para que consigam recursos junto a organismos internacionais para sua implementação. "O programa brasileiro tem forte vínculo entre combate à desertificação e à pobreza, e isso facilitará a obtenção de recursos", disse.
Desmatamento acompanha desertificação
O aumento das áreas degradadas na Argentina tem acompanhado a redução das florestas. Nos últimos 75 anos, o desmatamento para exploração madeireira, geração de energia e agropecuária atingiu quase 70% da superfície original. Associado a isso, o país enfrenta perda acentuda de espécies animais e vegetais e degradação dos recursos hídricos.
Nas diferentes regiões do país, o avanço da desertificação tem causas específicas. Na Patagônia, um "deserto frio e com água", o número de rebanhos, principalmente de ovinos, é tão grande que trouxe impactos irrecuperáveis em alguns pontos. Nas regiões irrigadas de Mendoza, San Juan, Rio Negro e Santiago del Estero, entre outras províncias (estados), a dificuldade no escoamento das águas tem provocado salinização e perda de produtividade. No Norte, o semi-árido avança nos espaços onde antes existiam florestas. Matas são derrubadas para cultivo de soja, algodão ou cana-de-açúcar, por dois ou três anos, abandonando-se a terra em seguida. Nas zonas de altitude (puna), a vegetação tem sido usada em excesso para produção de lenha, deixando o solo descoberto. Algumas escolas, contou Pardo, exigem uma quantidade de madeira para aceitarem a inscrição dos alunos, levando a grande desflorestamento a cada início de período letivo.
De acordo com o diretor de Solos, a Argentina debate hoje justamente sobre o avanço da fronteira agrícola, alavancada pela produção de commodities como a soja e o algodão (produtos com grande liquidez, que se transformam em dinheiro rapidamente em qualquer parte do mundo). Segundo Pardo, o avanço da agropecuário é observado sob uma nova ótica. "Não podemos colocar a situação como uma luta da agropecuária contra as florestas, mas sim avaliar quais são os limites do país e qual será o melhor modelo essas atividades", disse.
Plano Argentino
O país finalizou seu Plano de Ação Nacional de Luta contra a Desertificação (PAN) em 1996 e, desde então, vem desenvolvendo uma série de atividades, divididas em vários ministérios e províncias. Conforme Pardo, o avanço dos programas é acompanhado por um Conselho Assessor, que se reúne a cada quatro meses e é formado por membros de governos, produtores, sociedade civil e instituições de ensino e pesquisa. Várias províncias estão adequando suas leis, foi lançado um Atlas da Desertificação , novas linhas de financiamento e compensação ambiental estão sendo desenvolvidas, além de fundos rotativos para pequenos produtores. Além disso, as melhores experiências com produção sustentável são reunidas na publicação Alternativas Produtivas Sustentáveis , já na quarta edição.
O país está investindo cerca de 800 milhões de Pesos (quantia semelhante em Reais) no combate à desertificação. Somente na Patagônia, serão investidos US$ 30 milhões (R$ 90 milhões), em 10 anos, para melhorar o manejo dos rebanhos, e outros US$ 5 milhões para o desenvolvimento de alternativas de produção. "As ações não podem ser somente de caráter ambiental, mas envolver também aspectos econômiocos e sociais", disse.
Conforme Zelaya, a desertificação não traz somente resultados negativos aos países e regiões afetadas. Segundo ele, nas ações para recuperação dos solos, por exemplo, novos produtos e culturas podem ser desenvolvidas. A América Latina é hoje a maior produtora mundial de café, que veio de regiões áridas da África. É possível citar também a cultura da batata, a produção de vinhos e de soja. "A questão é reconhecer a aproveitar a realidade e as potencialidades de cada país".
PANs na América Latina e Caribe
Países que concluíram programas | Brasil, México, Argentina, Cuba, Guatemala, El Salvador, Nicarágua, Peru, Bolívia, Chile, Paraguai |
Países finalizando programas | Venezuela, Santa Luzia, República Dominicana, São Vicente, Barbados, Jamaica, Honduras, Costa Rica, Panamá, Uruguai, Equador |
Fonte: Sergio Zelaya / UNCCD |
Veja a área desertificada ou de risco na América do Sul
Dirección de Conservación del Suelo y Lucha contra la Desertificación