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Discurso da ministra Marina Silva, pela Semana Nacional do Meio Ambiente
Discurso da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, durante cerimônia no Palácio do Planalto, 3 de junho, pela Semana Nacional do Meio Ambiente.
Senhor Ministro, Senhores e Senhoras
É com muita alegria e com muita honra que viemos à presença do Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu, e a de todos os senhores para assinarmos e anunciarmos atos importantes para a gestão do meio ambiente do Brasil. Temos um enorme desafio pela frente, para o qual convidamos a todos os brasileiros, há um ano atrás, quando com o senhor lançamos a Conferência Nacional de Meio Ambiente: Vamos cuidar do Brasil. Cuidar do nosso Brasil significa conservar e usar de maneira responsável, a maior floresta tropical do mundo, com cerca de 550 milhões de hectares, o maior manancial hídrico, com quase 12% da água doce superficial do mundo, 70% dela na Amazônia; significa cuidar bem da maior concentração de biodiversidade, com cerca de 20% do total de espécies existentes no nosso planeta. Cuidar do Brasil é também trabalhar com os governos estaduais e municipais para assegurar qualidade de vida em nossas cidades, onde vivem quase 80% dos brasileiros. No momento em que o Brasil começa a retomar índices de crescimento de sua economia, cuidar também quer dizer contribuir para que as atividades produtivas, especialmente na área de infraestrutura, se instalem e se desenvolvam de maneira ambientalmente sustentável.
Porque afinal para o nosso governo desenvolvimento quer dizer direito a uma vida digna para todos, ou seja, direito à qualidade de vida em todas as regiões e biomas do país.
Por isso que quando recebemos do Presidente Lula a missão de fazer uma política ambiental a ser respeitada por todos, anunciamos quatro grandes diretrizes: a política ambiental integrada, o fortalecimento do Sistema Nacional de Meio Ambiente, o controle e a participação social, e o desenvolvimento sustentável, que, a rigor, é o objetivo principal da política ambiental de governo.
Um ano e meio após assumirmos este desafio, estamos realizando a Semana Nacional de Meio Ambiente com o tema Juntos, Meio Ambiente e Desenvolvimento dão frutos. Mas antes de dar frutos é preciso semear a terra.
Permita-me, senhor Ministro, contar uma breve história antes de voltar ao dia de hoje. Como professora de história, reconstitui o percurso das ações ambientais no Brasil para me certificar da nossa missão neste mandato.
Vivemos, nos anos 70, um período inicial de denúncias contra a poluição urbana, os agrotóxicos e outros temas. Enquanto o mundo se surpreendia com a emergência dos problemas ambientais, aqui o governo admitia qualquer tipo de poluição como um preço admissível para o progresso. Como se fosse possível casar progresso e degradação.
Movimentos e lideranças emergentes como Lutzemberger e Paulo Nogueira Neto, no entanto, forçaram medidas do governo. Assim, era criada a Secretaria Especial de Meio Ambiente, em 1973. As primeiras medidas de governo se dirigiram apenas às ações chamadas de Comando e Controle.
Nos anos 80, ao lado dos movimentos sindicais, como a CUT, e os de trabalhadores sem terra, que foram criados e organizados, surgiram também o Conselho Nacional dos Seringueiros, o encontro nacional dos ambientalistas e a mobilização social e ambiental em torno da Constituinte.
Para abrir os anos 90, ainda em 89, o governo do presidente Sarney, motivado pela grande repercussão do assassinato de Chico Mendes, criou o Ibama. Mais tarde, em 92, coube ao presidente Itamar Franco a criação do Ministério do Meio Ambiente. Na Eco-92, fomos o primeiro país a assinar a Agenda 21. Ao longo desta década assistimos a promulgação de leis importantes, como a de Crimes Ambientais, a do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, bem como a ratificação da Convenção da Diversidade Biológica, que me inspirou no Senado, em 1995, a propor o Projeto de Lei sobre acesso à biodiversidade. Entretanto, mesmo com essas iniciativas a idéia do Desenvolvimento Sustentável, lançada em 1987, pelo Relatório da ONU, Nosso Futuro Comum, ainda não alcançou a necessária implementação.
Diante desse breve histórico, qual será a missão que nos cabe neste inicio de século e de milênio e quanto dela já estamos começando a realizar?
Primeiro, vale ressaltar o pioneirismo da política ambiental integrada. Pela primeira vez, nesses 30 anos, um governo trabalha decididamente com a meta criar uma política ambiental integrada. Isto significa que o nosso governo dá um exemplo para toda a sociedade nacional e internacional ao incorporar a variável socioambiental como critério fundamental nas ações de governo, desde o planejamento. Assim deve ser também na economia. Não se pode mais pensar na dimensão ambiental como uma mera externalidade da atividade produtiva.
Neste primeiro ano e meio de gestão ambiental do Governo Lula, o Ministério do Meio Ambiente, e suas entidades vinculadas, mantiveram um diálogo sistemático com o centro do Governo, e com os ministérios que guardam interface com a área ambiental. Prova disso, foi o trabalho do GT de Combate ao Desmatamento, o trabalho de formulação de Plano BR 163 Sustentável, o novo modelo de política energética, a política de reforma agrária na Amazônia, a revisão do crédito com os fundos constitucionais do Norte e do Centro Oeste, o Plano Amazônia Sustentável, entre outras iniciativas em curso.
Mesmo com dificuldades compreensíveis e quase sempre superadas com o apoio do Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu, alguns passos significativos vêm sendo dados também na articulação da política ambiental integrada junto aos estados e municípios, consolidando gradativamente o Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama).
Outra iniciativa inédita em 30 anos de política ambiental foi a realização da Conferência Nacional de Meio Ambiente. Há pelo menos 20 anos que a sociedade e os movimentos sociais e ambientalistas brasileiros clamavam por uma instância de diálogo aberto entre governo e sociedade.
Mas o grande desafio que temos, a missão que evidentemente recai sobre nossos ombros, Ministro, é, como o Presidente tem dito sempre, devolver a auto-estima ao povo brasileiro. Este é, sem dúvida, o sentido do desenvolvimento que queremos: socialmente justo, economicamente viável e ambientalmente sustentável.
Vemos com bons olhos o debate nacional sobre a função, a natureza e o lugar da política ambiental na retomada de um novo ciclo de desenvolvimento. Nunca nesses 30 anos a política ambiental mereceu tanta atenção, por exemplo, de alguns segmentos empresariais. Podemos observar este debate já como um indicador positivo da nossa política integrada. No entanto, algumas críticas que se dirigem muitas vezes para o tema do licenciamento, alegando um suposto gargalo nos processos que tramitam no órgão executivo do MMA, o IBAMA, não revelam os problemas reais e toda a complexidade de situações, inclusive internacionais, que o governo enfrenta para, efetivamente, retomar o crescimento econômico. Além disso, em algumas situações, a crítica corresponde ainda à resistência de alguns segmentos, que estão sendo obrigados a abandonar práticas irregulares de uso e exploração dos recursos naturais.
Para avançar rumo ao desenvolvimento justo e sustentável, nosso governo tem um grande desafio a ser vencido, que é a compreensão de que uma política ambiental integrada, articulada com estados e municípios é fruto de diálogo com a sociedade, constitui um fator essencial para o desenvolvimento do país. Incorporar a dimensão socioambiental nas metas de crescimento econômico é condição, e não obstáculo, para o desenvolvimento duradouro, sustentável e socialmente inclusivo. Cabe, portanto, mostrar que negócio que não trabalha com a qualidade ambiental é mau negócio; desenvolvimento que atropela a dimensão socioambiental não pode mais ser considerado desenvolvimento real da sociedade.
As medidas que estamos assinando aqui são produtos dessa nova política ambiental. O Presidente Lula assinou:
As Reservas Extrativistas de Capanã Grande e Cururupu
As Florestas Nacionais do Cabedelo e Piraí do Sul
O Plano Nacional de Prevenção, Preparação e Resposta Rápida a Emergências Ambientais com Produtos Químicos Perigosos o P2R2
Eu estou assinando ou anunciando:
O Acordo com Governos Estaduais da Amazônia para o ARPA
A Portaria que cria Comissões Tripartite em 14 estados
A criação do Fundo de Áreas Protegidas
O carimbo dos Correios comemorativo dos 15 anos do Ibama
O Fórum de Áreas Protegidas
O Edital do Prêmio Chico Mendes
E, finalmente, a Comissão Nacional para o Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais.
As unidades de conservação, especialmente de uso sustentável, como Reservas Extrativistas e Florestas Nacionais, expressam a importância que a conservação ambiental tem também como alavanca de processos socioeconômicos. São as Reservas do Lago do Capanã Grande, no Estado do Amazonas e de Cururupu, no Maranhão. Juntas essas Resex somam quase meio milhão de hectares, atendendo a quase 1.500 famílias.
As Flonas são as de Cabedelo, na Paraíba, e de Piraí do Sul, no Paraná, que, a médio prazo, estarão integradas à economia florestal do país, gerando emprego e renda.
Quero dar uma boa notícia, especialmente às lideranças extrativistas aqui presentes. O Presidente assina, nos próximos dias, outra medida que terá significativo impacto para as comunidades tradicionais e agro-extrativistas. De forma pioneira, estamos criando a Comissão Nacional para o Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais.
O agroextrativismo é a conjunção da extração de produtos florestais nativos (borracha, castanha-do-brasil, andiroba, copaíba, babaçu etc), com uma agricultura sustentável, de baixo impacto, mas com alto valor social. O agroextrativismo constitui-se num consistente processo de valorização das florestas e matas e de resgate do valor socioambiental desses ecossistemas. Esse sistema, bem como o da pesca artesanal, apresenta os princípios básicos desejáveis para o desenvolvimento sustentável. Entre outras funções, a Comissão vai assessorar o Presidente da República na formulação e acompanhamento da implantação da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável das Comunidades Tradicionais, e na coordenação e articulação das ações da Política, em conjunto com os governos estaduais e municipais, considerando as dimensões sociais e econômicas e a melhoria da qualidade de vida das populações extrativistas. O mais importante é que a Comissão Nacional contará com a participação de todos os ministérios afetos ao tema, além de representantes da sociedade civil, das comunidades tradicionais, entre outros. Será presidida pelo Ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, tendo o nosso Ministério como secretaria executiva.
Voltando às unidades de conservação, quero destacar que, com o mesmo grau de importância, são as unidades de conservação integral, que também prestam importante contribuição para a pesquisa científica e, sobretudo, para um dos setores da economia que mais cresce em todo o mundo que é o turismo e o ecoturismo. Neste sentido, estamos assinando aqui seis Acordos de Cooperação Técnica com 6 governos da Amazônia para a implementação do Programa de Áreas Protegidas da Amazônia, o ARPA. Trata-se de uma iniciativa do Governo Federal para proteger dentro de unidades de conservação, em dez anos, cerca de 50 milhões de hectares de florestas na Amazônia, sendo considerada a maior iniciativa do gênero para florestas tropicais no planeta. Com a assinatura dos Acordos entre o Funbio, que é nosso parceiro, e os Estados do Acre, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, e Tocantins, com interveniência do Ministério do Meio Ambiente, estamos dando um passo importante também em relação ao desenvolvimento regional. São 13 unidades de conservação contempladas com recursos garantidos por esses convênios.
Além disso, o Programa ARPA está apoiando a criação de um Fundo de Áreas Protegidas (FAP), cuja meta é capitalizar-se até 240 milhões de dólares em dez anos para garantir apoio para sempre às unidades de conservação do Programa. Estamos criando este Fundo também hoje, com a assinatura de um Contrato entre Funbio e WWF-Brasil e a sinalização do primeiro depósito de cerca de três milhões de reais.
Vale destacar também o Decreto assinado pelo Presidente que estabelece a Comissão Nacional e o Plano Nacional de Prevenção, Preparação e Resposta Rápida a Emergências Ambientais com Produtos Químicos Perigosos o P2R2. Com este decreto, o Presidente dá inicio à implementação de uma política de abrangência nacional, voltada à integração e articulação dos esforços de órgãos governamentais e do setor privado na atuação em situações de emergência com produtos químicos perigosos, minimizando ocorrências e, conseqüentemente, danos ao meio ambiente e a saúde da população.
Outra iniciativa fundamental para o fortalecimento de parcerias com Estados, e neste caso, também com os municípios é a portaria que assino para a criação de Comissões Tripartite em 14 estados. O objetivo dessas comissões é propor estratégias e diretrizes para promover a gestão ambiental compartilhada entre União, Estados e Municípios. A Tripartite Nacional é composta por três integrantes indicados pelo Ministério do Meio Ambiente, três indicados pela Associação Brasileira de Entidades de Meio Ambiente ABEMA e três indicados pela Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente ANAMMA. Nos Estados, a Comissão Tripartite terá a função de equilibrar a gestão ambiental nos três níveis de governo, de maneira a promover um melhor equilíbrio e compartilhamento de competências. Apenas para se ter uma idéia do descompasso, segundo pesquisa realizada pelo IBGE em 2001, apenas 22% dos municípios brasileiros têm Conselhos Municipais de Meio Ambiente ativos.
Esses atos completam outros que estamos assinando e lançando nesta semana e que ilustram bem o tema da semana: juntos, meio ambiente e desenvolvimento dão frutos. Vale a pena destacar a posse que demos a 34 membros da Comissão de Política para o Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Brasileira; os convênios assinados com o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e o que assinaremos daqui há pouco com o Grupo Pão de Açúcar, para a comercialização nacional de produtos sustentáveis de produtores familiares; assinamos também, após um longo período de negociação, um Acordo com o Governo de Rondônia, que regulariza dispositivos do Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado, beneficiando milhares de agricultores que voltam a ter acesso a crédito rural; ainda estaremos anunciando nesta semana, a ampliação do Parque Nacional da Tijuca, um incentivo para o turismo no Rio de Janeiro, na maior floresta urbana do país, assim como liberação de recursos para obras de revitalização do São Francisco em Minas; fecharemos a Semana com medidas de apoio à conservação biológica e pesquisa científica no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, com apoio da Caixa Econômica e da Petrobrás.
Finalmente, Presidente, quero concluir lembrando mais uma vez o nosso amigo Chico Mendes. Em seguida ao assassinato de Wilson Pinheiro, depois da tantos empates realizados para impedir as derrubadas de floresta, que ainda prosseguiram, Chico passou a defender que além de resistir o movimento precisava apresentar alternativas. Foi assim que surgiu a proposta das Reservas Extrativistas. Com esse mesmo espírito, estamos lançando aqui, neste ato, o edital do Prêmio Chico Mendes. Em sua terceira edição, o Prêmio Chico Mendes de Meio Ambiente, instituído pelo Ministério do Meio Ambiente, vai premiar Liderança Individual, Associação Comunitária, Organização Não-Governamental, Negócios Sustentáveis, Ciência e Tecnologia e Arte e Cultura.
De acordo com o lema desta Semana, estes serão outros frutos a serem premiados.
Na Semana do Meio Ambiente de 2003 lançamos a Conferência e criamos unidades de conservação. Este ano estamos debatendo meio ambiente e desenvolvimento apresentando medidas concretas que ilustram o diálogo necessário e oportuno entre esses dois temas da atualidade. Temos muitos desafios pela frente. Mas o que nos impulsiona é a política do exemplo que estamos apresentando aqui. É também a divisão de protagonismo que fortalece e torna real o nosso sonho a cada dia.
O tema da semana é: Juntos, Meio Ambiente e Desenvolvimento dão frutos. Mas antes de dar frutos é preciso casar. Por isso que o nosso querido amigo Ziraldo propôs o slogan: Meio Ambiente e Desenvolvimento: DÁ PRA CASAR.
Bem vindos senhores ao tempo deste casamento!
Muito obrigada.