Histórico do ZEE
No início dos anos 1980, a Política Nacional do Meio Ambiente (lei federal nº 6.938/1981) foi instituída, no Brasil, com o objetivo de preservar, melhorar e recuperar a qualidade ambiental propícia à vida e estabeleceu, entre seus instrumentos de execução, o zoneamento ambiental, posteriormente regulamentado sob a denominação de zoneamento ecológico-econômico (ZEE) e também previsto no Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (lei federal nº 7.661/1988) como instrumento de gestão da zona costeira.
Em março de 1990, o Governo Collor, por meio da medida provisória nº 150/1990, depois convertida na lei federal nº 8.028/1990, criou a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) como órgão de assistência direta e imediata ao Presidente da República. Entre a medida provisória e sua conversão em lei, foi instituído o decreto federal nº 99.193/1990, dispondo sobre o ZEE. Um Grupo de Trabalho foi instituído pelo Presidente da República com o encargo de conhecer e analisar os trabalhos de ZEE existentes, propondo, no prazo de 90 dias, as medidas necessárias para agilizar sua execução, com prioridade para a Amazônia Legal.
Dentre as conclusões do Grupo de Trabalho, foram recomendados trabalhos como o diagnóstico ambiental da Amazônia Legal, o ZEE de áreas prioritárias e os estudos de casos em áreas críticas e de relevante significado ecológico, social e econômico. O Grupo de Trabalho também recomendou a criação de uma Comissão Coordenadora com o objetivo de orientar a execução do ZEE no território nacional - CCZEE, criada pelo decreto federal nº 99.540/1990, tendo a SAE como braço executivo na coordenação.
Em 1991, o Governo Federal, por meio da CCZEE e da SAE, criou um Programa de Zoneamento para a Amazônia Legal (PZEEAL), justificado pela importância de um conhecimento criterioso e aprofundado de seus espaços intra-regionais. Todos os estados da Amazônia criaram Comissões Estaduais de ZEE e firmaram convênios com a SAE, que descentralizou recursos para a implantação de laboratórios de geoprocessamento. Um acordo de cooperação técnica, firmado com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para treinar equipes de ZEE dos estados da Amazônia, no final de 1994 e durante o ano de 1995, capacitou 105 técnicos.
Projetos iniciados por outros órgãos federais realizaram experiências isoladas. O Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro, que desde o início da década de 1980 desenvolvia propostas de zoneamento na área costeira, estabeleceu uma metodologia de zoneamento, posteriormente revisada, adaptada e consolidada. Entre 1994 e 1996, foi elaborado um Macrodiagnóstico da Zona Costeira na Escala da União, cuja revisão foi concluída em 2008, dando origem ao Macrodiagnóstico da Zona Costeira e Marinha do Brasil.
Ainda em 1995, a SAE atentou para a necessidade de definir mais claramente os procedimentos para elaboração do ZEE. Essa necessidade foi despertada pelos zoneamentos já em processo de execução na Amazônia Legal e, principalmente, para orientar mais efetivamente as ações de zoneamento apoiadas pelo Programa Piloto para Proteção das Florestas Tropicais (PPG7). Em parceria com a Secretaria de Coordenação da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente, foram solicitadas, por meio de convite, propostas de metodologia de zoneamento a diversos especialistas. Foi eleita a proposta do Laboratório de Gestão Territorial da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LAGET/UFRJ), posta em debate e publicada em 1997, no documento “Detalhamento da Metodologia para Execução do Zoneamento Ecológico-Econômico pelos Estados da Amazônia Legal”.
O segundo Governo de Fernando Henrique Cardoso iniciou com uma reforma ministerial que provocou mudança de rumos na realização do ZEE. Com a extinção da SAE, por meio da medida provisória nº 1.795/1999, a responsabilidade pela ordenação territorial foi transferida para o Ministério da Integração Nacional, enquanto ao Ministério do Meio Ambiente foi atribuída a responsabilidade pelo ZEE. Essa atribuição foi confirmada posteriormente, no Governo Lula, pela lei federal n° 10.683/2003, tendo sido mantida no Governo Temer por intermédio da lei federal nº 13.341/2016.
O ZEE também passou a integrar o Plano Plurianual a partir do ciclo 2000-2003, sob a denominação “Programa Zoneamento Ecológico-Econômico”. O então Ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, incumbiu a Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável (hoje, Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável), de coordenar os projetos de ZEE no País e gerenciar o Programa no PPA.
A partir daí, foi promovido um processo nacional de discussão sobre o ZEE, envolvendo a participação de autoridades, pesquisadores e representantes da sociedade civil. Foram efetuadas discussões, consultas e troca de experiências, por meio de cinco seminários regionais (um em cada região do País) e dois seminários nacionais. Com base nestas discussões, foi possível consolidar tanto uma metodologia para a organização do Programa, quanto articular procedimentos operacionais de zoneamento. Os resultados materializaram-se no documento “Diretrizes Metodológicas para o ZEE do Território Nacional (MMA, 2001)”. O documento, organizado para permanente atualização (sendo a última realizada em 2006), consolida e sistematiza as discussões regionais sobre a metodologia de ZEE, define diretrizes metodológicas e procedimentos operacionais mínimos para a execução e implementação do ZEE nos níveis táticos e estratégicos e formaliza os requisitos necessários à execução de projetos de ZEE.
Procedeu-se, assim, a uma ampla articulação interinstitucional, que resultou no restabelecimento da CCZEE e na criação de um consórcio de empresas públicas, denominado de Consórcio ZEE Brasil, regulamentado por meio do decreto federal s/nº de 28/12/2001.
Após esse esforço, o poder executivo federal estabeleceu o decreto nº 4.297/2002, regulamentando o processo de implementação do ZEE em território nacional, como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente. O decreto estabeleceu os objetivos, as diretrizes, os produtos e as condições para execução de projetos em conformidade com o documento “Diretrizes Metodológicas para o ZEE do Território Nacional”.
A partir de 2003, em resposta aos dados referentes à dinâmica do desmatamento na Amazônia Legal – que atingiu, neste ano, 25.396 km², segundo dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Inpe –, o Governo Federal instituiu um Grupo Permanente de Trabalho Interministerial cujo objetivo principal foi a elaboração da primeira versão do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm). Composto por três eixos de ação – ordenamento fundiário e territorial; monitoramento e controle; e fomento às atividades produtivas sustentáveis –, o PPCDAm contribuiu para aumentar a visibilidade do ZEE, que constitui, desde então, importante componente do eixo de ordenamento fundiário e territorial.
Refletindo o amadurecimento do instrumento e considerando as diversas experiências até então desenvolvidas, foi publicada, em 2006, a atual versão do documento “Diretrizes Metodológicas para o ZEE do Território Nacional”, cujas inovações em relação à versão anterior foram incorporadas no Decreto nº 4.297/2002, revisado por meio do Decreto nº 6.288/2007.
Outro importante avanço em torno do ZEE foi decorrente da edição da Resolução nº 3.545/2008, pelo Conselho Monetário Nacional, que modificou o Manual de Crédito Rural do Banco Centro do Brasil. Esta resolução estabeleceu determinadas exigências de documentação comprobatória sobre a regularidade ambiental dos imóveis rurais para fins de financiamento agropecuário no contexto do bioma amazônico, dentre as quais a necessidade de observância das recomendações e restrições do ZEE e dos zoneamentos agroecológicos existentes.
Ademais, em 2009 o Tribunal de Contas da União realizou auditoria de natureza operacional no intuito de examinar a potencial eficácia do ZEE como instrumento a ser utilizado pelo Governo Federal para o planejamento da Amazônia Legal, avaliando o processo e os produtos de ZEE que subsidiaram a formulação de políticas públicas na região. Entre as conclusões desta auditoria, sistematizadas no Acórdão nº 2.468/2009 e que, desde então, orientam diversas iniciativas do Programa ZEE Brasil, foram apontadas a necessidade de previsão legal para a integração dos ZEE aos ciclos orçamentários, de uma maior integração entre o planejamento expresso no ZEE e o planejamento territorial para as terras indígenas e as unidades de conservação e de um maior acompanhamento dos ZEEs estaduais, ao longo de sua elaboração, pela CCZEE.
Valendo-se dos subsídios aportados pelo Diagnóstico Ambiental da Amazônia Legal e reconhecendo os avanços feitos pelos estados da região em seus respectivos zoneamentos, foi elaborado, entre 2008 e 2010, o Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal, que após concluído foi instituído pelo Decreto nº 7.378/2010. O MacroZEE da Amazônia Legal – que será melhor abordado na próxima seção deste documento – foi resultado da articulação entre o Governo Federal, os governos dos nove estados da região e diversos segmentos da sociedade civil. Ao reconhecer a diversidade socioambiental, econômica e cultural da Amazônia Legal, representada pela delimitação de dez unidades territoriais, o MacroZEE permitiu estabelecer uma série de estratégias a serem consideradas quando da formulação e espacialização de planos, programas e políticas públicas federais, assegurando sustentabilidade ao processo de desenvolvimento regional.
Posteriormente, a aprovação do “novo” Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) constituiu um importante marco para o Programa ZEE Brasil, uma vez que estabelece a obrigatoriedade de que todos os estados brasileiros elaborem a aprovem seus ZEEs de acordo com metodologia unificada, estabelecida em norma federal (no caso, o Decreto nº 4.297/2002). Além disso, o “novo” Código Florestal consolidou o uso do ZEE como condição para o redimensionamento da Reserva Legal dos imóveis rurais localizados nas áreas de floresta da Amazônia Legal, tanto para fins de regularização ambiental quanto para a supressão de novas áreas cobertas por vegetação (desde que, nesse caso, além do ZEE, os estados possuam mais de 65% de seu território constituído por terras indígenas homologadas e unidades de conservação de domínio público).
Finalmente, cabe mencionar a elaboração do Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (BHSF). Concluído em 2018 para orientar a implementação do Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e do Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, o MacroZEE da BHSF foi executado pela Comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico do Território Nacional, pelo Consórcio ZEE Brasil e por um grupo de acompanhamento externo composto por entes dos governos estaduais e de membros do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
Atualmente, no âmbito do PPA 2024-2027, o Programa ZEE Brasil está compreendido no contexto do programa Desenvolvimento Regional e Ordenamento Territorial, como integrante do objetivo que busca aperfeiçoar as estratégias e instrumentos de planejamento multiescalar e transversal para o desenvolvimento regional e ordenamento territorial, com melhoria de governança e transparência.