Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Bioma Cerrado (PPCerrado) - 4ª fase (2023 a 2027)
O Cerrado é um dos mais importantes hotspots de biodiversidade no planeta. Conhecido como “berço das águas”, o bioma é um fundamental produtor-doador de água doce e conector de chuvas para todos os outros biomas brasileiros, sendo, portanto, a sua gestão crucial para a manutenção do regime hídrico dentro e fora da região.
Apesar de sua importância ambiental e de representar 23,3% do território brasileiro, a perda da vegetação nativa no Cerrado representou mais de 40% de todo o desmatamento no país entre 2019 e 2022. Entre 2003 e 2022, perdeu-se 12% da vegetação nativa do bioma (24 milhões de hectares), uma área equivalente ao estado de São Paulo. Em 2020, o bioma possuía 49% da vegetação nativa original, com 29% e 14% ocupados, respectivamente, por áreas de pastagem e culturas agrícolas (incluindo florestas plantadas). Estima-se que cerca de metade do desmatamento que ocorre no Cerrado segue a legislação ambiental vigente, entretanto estudos apontam que os imóveis registrados no CAR no bioma possuem ainda 30 milhões de hectares de excedente de reserva legal. A conversão legal dessas áreas implicaria a manutenção de taxas de desmatamento no bioma superiores a 10 mil km2 para além de 2050, mesmo sob uma política de desmatamento ilegal zero, gerando a emissão de 5,6 bilhões de toneladas de CO2e. O desmatamento, legal e ilegal (que interfere negativamente nas mudanças climáticas), já aumentou de forma significativa a estação seca e as temperaturas durante todo o ano, reduzindo a disponibilidade hídrica superficial e subterrânea em diferentes regiões do bioma. Portanto, o futuro do Cerrado requer soluções que vão além do combate ao desmatamento ilegal, necessitando também medidas alternativas ao comando e ao controle para o desmatamento legal dentro do marco legislativo vigente, para alcançar o desmatamento zero até 2030.
A 4ª fase do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento e das Queimadas no Bioma Cerrado (PPCerrado) é fruto da consolidação das diretrizes definidas pelo Grupo Técnico de Meio Ambiente da Comissão de Transição Governamental 2022 e das contribuições dos diversos ministérios que integram a Subcomissão Executiva (13 ministérios compõem a Subcomissão Executiva e mais 22 convidados entre ministérios e instituições públicas federais). O documento foi construído a partir da experiência acumulada pelo governo federal nas três fases anteriores, do diálogo constante com a sociedade civil e a academia em diversas oportunidades, principalmente durante o Seminário Técnico-Científico de Análise de Dados do Desmatamento no Cerrado, realizado no dia 11 de julho de 2023, e as contribuições obtidas durante a fase de consulta pública do documento preliminar (186 contribuições recebidas). As ações do plano são estruturadas conforme as orientações do Decreto n. 11.367/2023, com a divisão em quatro grandes eixos temáticos: i) atividades produtivas sustentáveis; ii) monitoramento e controle ambiental; iii) ordenamento fundiário e territorial; e iv) instrumentos normativos e econômicos, dirigidos à redução do desmatamento e à concretização das ações abrangidas pelos demais eixos.
Após o diagnóstico das causas do desmatamento na Amazônia e seguindo as diretrizes do Decreto n. 11.367/2023, o modelo lógico estabeleceu 13 objetivos estratégicos distribuídos pelos 4 eixos temáticos. Para o alcance desses objetivos, foram propostos 41 resultados esperados e 82 linhas de ação e, como forma de demonstrar mais claramente as prioridades e direcionamentos deste primeiro ano de execução do plano, foram estabelecidas 175 metas com os respectivos indicadores e definidos os prazos, atores-chave e eventuais órgãos parceiros. Tais metas e indicadores servirão de base para avaliação e monitoramento do plano que, por foça legal, deve passar por atualização anual.
Entre os principais resultados esperados e linhas de ação trazidas na 4ª Fase do PPCerrado, merecem destaque, no contexto do Eixo I, o incentivo à pecuária e à produção de grãos sustentáveis com redução da pressão sob áreas críticas de desmatamento (2.1.1), o fortalecimento e a ampliação do acesso ao mercado e às políticas públicas da agricultura familiar (2.1.2) e a ampliação da oferta de assistência técnica por meio de entidades executoras de assistência técnica rural (3.2.1).
Já no Eixo II, as ações mais relevantes são a implementação de um sistema de controle de origem ambiental e rastreabilidade dos produtos agropecuários (5.2.1.1); fortalecimento do monitoramento e controle do fogo, com base na implementação do manejo integrado do fogo (6.1 e 6.2); integração, no Sicar, de dados de autorização de desmatamento, autos de infração e embargos gerados pelos estados, de modo a distinguir o desmatamento legal do ilegal (7.1 e 8.2.1.1).
No Eixo III devem ser enfatizadas as ações voltadas à identificação e a regularização de Terras Indígenas, Territórios Quilombolas e Territórios de Povos e Comunidades Tradicionais (10.2.1). Especificamente em relação à questão hídrica, foi proposto como Objetivo 12 do Eixo III realizar um planejamento territorial e implementar instrumentos já previstos em lei para assegurar o papel da infraestrutura natural (vegetação nativa na manutenção e na recuperação do regime hídrico e da qualidade da água). Dentro desse objetivo serão realizadas ações voltadas para a elaboração e a revisão do zoneamento ecológico-econômico (ZEE) dos estados do Cerrado, observando-se a possibilidade de incremento da exigência de Reserva Legal (12.1.1), a definição de áreas prioritárias para compensação de Reserva Legal (12.1.2), o aumento das exigências de conservação e recuperação de áreas de preservação permanente e de recarga de aquífero (12.1.3), bem como o aprimoramento e a implementação das exigências de reposição florestal (12.1.4), medidas já previstas pela Lei n. 12.651/2012, mas que carecem de implementação efetiva. Além disso, é proposta a revisão do zoneamento agrícola de risco climático (Zarc) das principais culturas agrícolas (soja, milho e cana-de-açúcar) e de florestas plantadas, orientando a expansão dessas atividades de acordo com a disponibilidade hídrica, a qualidade da água do bioma e os efeitos das mudanças climáticas e do desmatamento (12.2.1) e a inclusão de critérios de conservação da vegetação nativa no nível do imóvel e na microbacia no processo de avaliação de concessão de outorgas para irrigação (12.3.1) juntamente com o aprimoramento do monitoramento dos recursos hídricos (12.3.2) de modo a incentivar a conservação da vegetação nativa para além do exigido pela legislação vigente.
Finalmente, no Eixo IV são propostas ações para criar o “Fundo Biomas” a fim de apoiar a conservação no Cerrado e outros biomas (13.1.2), proposição de normas e incentivos fiscais para a bioeconomia e produtos da sociobioeconomia (13.3.1), fortalecimento do Pronaf para financiamento da agricultura familiar (13.4.1), alinhamento progressivo do crédito rural com a meta de desmatamento zero (13.4.2), ampliação do financiamento para recuperação de pastagens e áreas degradadas (13.4.3), implementação da lei do PSA, da cota de reserva ambiental, outros instrumentos de compensação de reserva legal para estimular a conservação de excedentes de vegetação nativa (13.13, 13.9.1 e 13.9.2) e padronização da normativa para emissão e integração de autorizações para supressão e uso alternativo do solo (13.16.1).
A 4ª fase do PPCerrado propõe o compromisso de reduzir a perda da vegetação nativa no bioma e alcançar o desmatamento zero até 2030, por meio da eliminação do desmatamento ilegal e a compensação da supressão legal de vegetação nativa e das emissões de gases de efeito estufa delas provenientes, resultantes do fortalecimento da implementação da legislação florestal e da recuperação e aumento de estoque da vegetação nativa por meio de incentivos econômicos para a conservação e manejo florestal sustentável.
Através do PPCerrado, o governo federal de forma transversal e em articulação com os estados e municípios e com a sociedade civil, reafirma o compromisso público de eliminar o desmatamento ilegal no Cerrado e compensar as supressões legais, através de incentivos às atividades produtivas sustentáveis, das ações repressivas, da destinação de terras públicas e por meios de incentivos econômicos e instrumentos normativos adequados, garantindo um futuro mais sustentável e próspero para as presentes e futuras gerações.