CONSULTA PÚBLICA - MINUTA DE PORTARIA
Publicado em
24/01/2024 10h46
Atualizado em
24/01/2024 10h49
Estabelece a Diretriz Nacional sobre Câmeras Corporais em Segurança Pública.
O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA, no uso das atribuições que
lhe conferem os incisos I e II, do parágrafo único, do art. 87, da Constituição Federal e, e tendo em vista o disposto nos incisos I, II, XII, XVII, XIX e XX do art. 1º do Anexo I ao Decreto nº 11.348, de 1º de janeiro de 2023, resolve:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art.1º Esta Portaria estabelece a Diretriz Nacional sobre Câmeras Corporais para os órgãos de segurança pública.
§1 A observância do disposto nesta Portaria é obrigatória para todos os órgãos de segurança pública que optarem pela implementação de câmeras corporais.
§2 O disposto no § 1º também se aplica à Força Nacional de Segurança Pública e à Força Penal Nacional.
Art.2º A implementação de projetos de câmeras corporais pelos órgãos de segurança pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios será considerada para fins de repasse dos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário Nacional.
Art.3º São princípios desta Diretriz:
I - proteção, valorização e reconhecimento dos profissionais de segurança pública;
II - proteção dos direitos humanos, respeito aos direitos e garantias fundamentais e promoção da cidadania e da dignidade da pessoa humana;
III - uso diferenciado da força;
IV - respeito à privacidade e à integridade pessoal;
V - articulação interfederativa e interagências;
VI - transparência, responsabilização e prestação de contas;
VII - inovação tecnológica em segurança pública; e
VIII - simplicidade, economia procedimental e celeridade no serviço prestado à sociedade.
Art.4º São objetivos desta Diretriz:
I - estimular a profissionalização dos órgãos de segurança pública;
II - fortalecer processos de inovação e modernização em segurança pública;
III - padronizar procedimentos de atuação dos profissionais de segurança pública quanto ao uso de câmeras corporais e gestão dos registros audiovisuais;
IV - qualificar a produção de provas materiais, dentro dos princípios da cadeia de custódia, a partir de registros audiovisuais;
V - incentivar a utilização de registros audiovisuais para fins de treinamento e aperfeiçoamento técnico;
VI - fomentar estudos científicos para proposição, aperfeiçoamento e avaliação de políticas públicas de segurança;
VII - auxiliar a elaboração e estruturação de ações de interesse da segurança pública;
VIII - garantir que as informações coletadas pelos sistemas de registros audiovisuais
atendam aos requisitos de disponibilidade, integridade, confidencialidade e autenticidade; IX - promover a participação social; e
X - estabelecer mecanismos de supervisão e de avaliação.
Art.5º Para os fins desta Portaria, considera-se:
I - autenticidade: garantia de que as informações são genuínas e confiáveis, ou seja, que foram criadas, modificadas ou transmitidas por uma fonte confiável e que não foram corrompidas durante o processo.
II - câmera corporal: dispositivo portátil que capta registros audiovisuais das interações com o ambiente e com outras pessoas e que se acoplam nos uniformes dos profissionais, integrando o conjunto de equipamentos de proteção individual (EPI).
III - disponibilidade: capacidade de acessar e utilizar os dados ou sistemas quando necessário.
IV - gravação (buffer) de pré-evento: recurso que possibilita a gravação temporária do registro audiovisual por um período pré-determinado, antes que ocorra um evento ou ação específica.
V - hash: função responsável por converter dados de entrada de comprimento variável em uma saída de comprimento fixo;
VI - informação: dados processados que podem ser utilizados para produção e transmissão de conhecimento, contidos em qualquer meio, suporte ou formato;
VII - integridade: qualidade da informação que não modificada, quanto à origem, ao trânsito e ao destino;
VIII - log: registro informacional cronológico de todos os eventos ou atividades que ocorrem em um sistema, aplicativo ou ambiente específico;
IX - metadados: conjunto de dados que descrevem e disponibilizam informações sobre outros dados;
X - registro audiovisual: informação ou dados audiovisuais que podem ser usados para comprovar ou refutar um fato, evento, ação, transação, atividade criminosa, ou qualquer outra
circunstância em um contexto legal, investigativo, regulatório ou de conformidade; e
XI - sistema de gestão audiovisual: conjunto de ferramentas e processos usados para acessar armazenar, autenticar, gerenciar e preservar registros audiovisuais de forma segura e confiável, garantindo sua integridade, autenticidade e confidencialidade.
CAPÍTULO II
DAS OBRIGAÇÕES
Art.6º Compete ao Ministério da Justiça e Segurança Pública:
I - financiar, de acordo com a disponibilidade orçamentária, projetos de câmeras
corporais;
II - formular, implementar, monitorar e avaliar projetos de câmeras corporais que contemplem dimensões de diagnóstico, padronização de procedimentos e doutrina, treinamento, aquisições e avaliação de impacto, dentre outras;
III - disponibilizar estruturas, normativos e pessoal para oferta de consultoria técnica especializada aos projetos dos órgãos de segurança pública;
IV - disponibilizar guia de referência para subsidiar a compreensão dos órgãos de segurança pública quanto às diretrizes e aos demais temas pertinentes;
V - disponibilizar norma técnica especificando requisitos de segurança cibernética, física e operacional, bem como padrões de coleta, transmissão e armazenamento audiovisual;
VI - elaborar e disponibilizar cadernos de diretrizes sobre procedimentos operacionais relacionados às câmeras corporais e ao uso diferenciado da força;
VII - disponibilizar atas de registro de preços de soluções tecnológicas de registro audiovisual, como também de equipamentos de menor potencial ofensivo, para adesão dos órgãos de segurança pública;
VIII - realizar e fomentar treinamentos sobre câmeras corporais e uso diferenciado da força;
IX - promover ações de conscientização, discussão e integração com a sociedade civil;
X - promover intercâmbio de boas práticas; e
XI - fomentar pesquisas e estudos, com ênfase na avaliação de impacto, sobre câmeras corporais e uso diferenciado da força.
Art.7º Compete aos órgãos de segurança pública:
I - manter estrutura administrativa dedicada à gestão dos registros audiovisuais produzidos pelas câmeras corporais;
II - formular, implementar, monitorar e avaliar projetos de câmeras corporais que contemplem dimensões de diagnóstico, padronização de procedimentos e doutrina, treinamento, aquisições e avaliação de impacto, dentre outras;
III - custear, com recursos próprios e de acordo com a sua disponibilidade orçamentária, projetos de câmeras corporais;
IV - disponibilizar instrumentos de menor potencial ofensivo, prioritariamente, para os profissionais que utilizarem câmeras corporais em consonância com a Lei nº 13.060, de 22 de
dezembro de 2014, e com a Portaria Interministerial nº 4.226, de 31 de dezembro de 2010;
V - disponibilizar equipamentos de proteção individual, em quantidade suficiente e qualidade adequada;
VI - oferecer formação e capacitação continuada; e
VII - fomentar pesquisas e estudos, com ênfase na avaliação de impacto, sobre câmeras corporais e uso diferenciado da força.
§1 As matrizes curriculares de formação e capacitação continuada deverão ser atualizadas de forma a incluírem conteúdos específicos relacionados ao uso de câmeras corporais.
§2 O disposto no inciso IV do caput, apesar de recomendado, não é obrigatório para os Corpos de Bombeiros e as Perícias Oficiais de Natureza Criminal.
CAPÍTULO III
DA UTILIZAÇÃO
Art.8º Os profissionais de segurança pública em serviço deverão utilizar as câmeras corporais, quando possível e tecnicamente viável, observado o disposto no art. 5º, pelo menos, nas seguintes circunstâncias:
I - em atendimento de ocorrência;
II - em atividade que demande atuação ostensiva, seja ordinária ou especializada;
III - na realização de identificação e checagem de bens;
IV - durante buscas pessoais, veiculares ou domiciliares;
V - durante operações, inclusive aquelas que envolvam manifestações, controle de distúrbio civil, interdições ou reintegração de posse;
VI - no cumprimento de determinações de autoridade competente e mandados judiciais;
VII - em perícias externas;
VIII - em atividades de fiscalização e vistoria técnica;
IX - em atividades de busca, salvamento e resgate;
X - nos casos em que os profissionais de segurança pública julgarem necessários para sua defesa ou coleta de evidências;
XI - em escoltas ostensivas de custodiados;
XII - em todas as interações entre policiais e custodiados, dentro e fora do ambiente prisional;
XIII - durante as rotinas carcerárias, inclusive no atendimento aos visitantes e advogados;
XIV - nas intervenções e resolução de crises, motins e rebeliões no sistema prisional;
XV - nas situações de oposição à atuação policial, potencial confronto ou uso de força física; e
XVI - em sinistros de trânsito.
§1 A utilização de câmeras corporais deve ser regulamentada por cada órgão de segurança pública de acordo com as peculiaridades do seu regime jurídico.
§2 O uso de câmeras corporais nas atividades de inteligência, em investigações que possam ter sua eficiência prejudicada pelo seu uso e em situações que violem a intimidade do profissional deve ser objeto de regulamentação específica.
§3 O órgão de segurança pública deverá disciplinar a priorização do uso de câmeras corporais quando o número de equipamentos disponíveis não atender à totalidade dos profissionais em serviço operacional.
Art.9º Os órgãos de segurança pública desenvolverão procedimentos e processos para controlar a funcionalidade e a utilização das câmeras corporais, visando garantir que o equipamento esteja disponível e em plenas condições de uso pelo profissional de segurança pública.
§1 É obrigatória a identificação das câmeras corporais, tanto em seu patrimônio quanto no sistema de gestão dos registros audiovisuais, por meio de numeração única com base em seu
código serial ou equivalente, possibilitando a identificação do profissional que a utiliza.
§2 Deve ser garantida, sempre que possível e tecnicamente viável, a localização em tempo real das câmeras corporais.
CAPÍTULO IV
DOS PROCEDIMENTOS
Art.10. A gravação das câmeras corporais ocorrerá, alternativa ou concomitantemente, mediante regulamentação de cada órgão de segurança pública, de acordo com os seguintes modos:
I - por acionamento do profissional de segurança pública: a gravação é iniciada pelo operador da câmera corporal;
II - por acionamento automático, quando:
a) a gravação é iniciada desde a retirada do equipamento da base até a sua devolução, registrando todo o turno de serviço;
b) a gravação é configurada para iniciar em resposta a determinadas ações, eventos, geolocalização ou sinais específicos;
III - por acionamento remoto: a gravação é iniciada, de forma ocasional, por meio do sistema após o despacho, aceite de ocorrência ou decisão de autoridade competente.
§1 Ao regulamentar os modos de gravação, o órgão observará:
I - as peculiaridades jurídicas de suas atividades;
II - as situações em que será obrigatória a gravação intencional dos fatos de interesse;
III - as formas de supervisão, inclusive relacionadas às hipóteses de não acionamento, acionamento inadequado ou gravação interrompida;
IV - os mecanismos de revisão dos registros, com designação de funções, atividades, rotinas de trabalho e periodicidade;
V - possibilidade de utilização de gravação (buffer) de pré-evento; e
VI - as normas técnicas de certificação das câmeras corporais produzidas pela Secretaria Nacional de Segurança Pública.
§2 Os órgãos de segurança pública poderão, justificada e excepcionalmente, regular hipóteses de vedação do uso de câmeras corporais e classificação de acesso, especialmente quando importe constrangimento ou situações vexatórias dos envolvidos.
§3 Os regulamentos dos modos de gravação das câmeras corporais deverão ser públicos e de fácil acesso em meio digital.
Art.11. O profissional de segurança pública deverá informar as partes envolvidas sobre a gravação antes do início da interação.
Parágrafo único. O disposto no caput poderá deixar de ser observado quando o equipamento trouxer o aviso por meio de sinal indicativo, oferecer risco aos profissionais ou aos cidadãos ou outras situações excepcionais, regulamentadas pelos órgãos de segurança pública.
CAPÍTULO V
DA INTEGRIDADE DOS REGISTROS AUDIOVISUAIS
Art.12. O sistema de gestão audiovisual deve assegurar que as informações sobre a entrada e a saída dos dados sejam validadas, garantindo o correto e apropriado processamento do conteúdo armazenado e preservando as condições de rastreabilidade e custódia dos registros
audiovisuais.
§1 O rastreamento dos registros audiovisuais inclui função hash, registros de eventos, marca d’água, georreferenciamento, data, hora, identificação do operador e do equipamento.
§2 O sistema de gestão audiovisual deverá ser auditável.
Art.13. O sistema de gestão audiovisual deve assegurar a identificação do usuário e da respectiva câmera corporal em arquivos específicos.
Art.14. Os arquivos originalmente produzidos pelas câmeras corporais não poderão sofrer modificações, mantendo a sua integridade e rastreabilidade.
Parágrafo único. Mantida a integridade do arquivo original, os órgãos de segurança pública
deverão regular a ocultação de sinais de identificação pessoal, nudez explícita, placas de veículos, segurança institucional, dentre outros, em cópias a serem compartilhadas, visando resguardar os direitos à vida, à integridade e à imagem de pessoas e coisas.
Art.15. A regulamentação do uso de câmeras corporais pelos órgãos de segurança pública deve garantir a proteção da cadeia de custódia dos vestígios e evidências, nos termos do Código de Processo Penal.
CAPÍTULO VI
DO ARMAZENAMENTO DOS REGISTROS AUDIOVISUAIS
Art.16. O armazenamento dos registros audiovisuais produzidos pelas câmeras corporais deverá respeitar os requisitos mínimos de segurança da informação para utilização de soluções
de computação em nuvem estabelecidos pela Instrução Normativa nº 5, de 30 de agosto de 2021, do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República.
Art.17. A classificação das informações deve observar rigorosamente o disposto no art. 23 da Lei nº 12.527, de 2011.
Art.18. Os registros audiovisuais produzidos pelas câmeras corporais devem ser armazenados por no mínimo noventa dias.
Art.19. Os registros audiovisuais produzidos pelas câmeras corporais devem ser armazenados por no mínimo um ano, quando:
I - forem vinculados a conjunto probatório que acompanhe inquérito policial, processo judicial, procedimento ou processo administrativo disciplinar;
II - forem classificados como de interesse da segurança pública;
III - forem relacionados a ocorrências com resultado morte e lesão corporal grave, inclusive de profissionais de segurança pública;
IV - forem relacionados a manifestações, controle de distúrbio civil, interdições, reintegração de posse, policiamento de manifestações ou contenção de tumultos e rebeliões; e
V - ocorrer prisão, disparo de arma de fogo e ingresso em domicílio.
Parágrafo único.Parágrafo único. Os órgãos de segurança pública poderão dispor sobre outros períodos e circunstâncias de armazenamento de registros audiovisuais.
Art.20. O descarte de registros audiovisuais, mesmo que automatizado pelo sistema, deverá ser passível de rastreabilidade, mantendo-se os seus registros de eventos (log), metadados e as
marcas de vinculação registradas no sistema.
CAPÍTULO VII
DO ACESSO AOS REGISTROS AUDIOVISUAIS
Art.21. As instituições de segurança pública deverão regulamentar o acesso imediato aos registros audiovisuais das câmeras corporais de acordo com os seguintes parâmetros:
I - mediante requisição do juiz, do Ministério Público, do delegado de polícia, do defensor público, e de responsáveis por investigações e processos administrativos;
II - mediante requerimento do advogado da vítima, do acusado e do investigado.
§1 A regulamentação de que trata o caput deverá prever o compartilhamento por meio de aplicações e sistemas dedicados a esta finalidade, e contemplará o desenvolvimento e a publicização de protocolos de segurança das informações.
§2 Na hipótese de ausência da regulamentação de que trata o caput, o órgão de segurança pública deverá conceder o acesso em prazo não superior a vinte dias, prorrogáveis, de forma
justificada, por mais dez dias.
§3 Os órgãos de segurança pública deverão disponibilizar em seus meios de comunicação oficiais orientações para apresentação de pedidos de acesso aos registros audiovisuais.
Art.22. Os profissionais de segurança pública poderão solicitar a visualização dos registros audiovisuais das câmeras corporais quando tiverem participado dos fatos registrados.
Art.23. É vedada a divulgação e o compartilhamento de registros audiovisuais produzidos pelas câmeras corporais sem autorização prévia da instituição geradora dos dados, sob pena de responsabilização civil, penal e administrativa, na forma da lei.
Parágrafo único. Os procedimentos que autorizem a divulgação de registros audiovisuais deverão observar:
I - o direito de imagem dos envolvidos;
II - a possibilidade de prejuízo às investigações e aos exames periciais;
III - a natureza dos fatos a serem divulgados, desde que não façam parte de inquérito policial, procedimento ou processo administrativo ou judicial sigilosos;
IV - as circunstâncias relacionadas a ato infracional;
V - as circunstâncias que ensejem constrangimento ou exposição a situações vexatórias;
VI - as regras de ética em pesquisa, desenvolvimento, inovação, tecnologia e aperfeiçoamento profissional; e
VII - a limitação da disseminação de conteúdos flagrantemente ilícitos, prejudiciais ou danosos à imagem institucional.
CAPÍTULO VIII
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art.24. Sempre que possível e tecnicamente viável, aplica-se o disposto nesta Portaria às câmeras veiculares empregadas pelos órgãos de segurança pública.
Art.25. Os casos omissos serão resolvidos pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública, no limite de suas competências.
Art.26. Esta portaria entra em vigor 30 dias após a data de sua publicação.