Edição n° 12 - fevereiro/2016
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nº 12 /2016
Rede de Recuperação de Ativos do GAFILAT (RRAG)
A utilização de ferramentas simplificadas e preliminares de cooperação informal,
tais como a RRAG, é um caminho importante para aumentar a efetividade na obtenção
do cumprimento de diligências solicitadas em um pedido de cooperação jurídica internacional
Foto: Flickr.com
Por Isalino Antônio Giacomet Júnior*
A sociedade contemporânea convive com fenômenos característicos, tais como o crescimento das relações econômicas internacionais, utilização da internet para transferências financeiras e negócios comerciais, maior acesso a viagens ao exterior e facilidade de trânsito nas fronteiras. Se de um lado tais acontecimentos são extremamente úteis aos povos, de outro podem criar ambiente a ser utilizado pela criminalidade para práticas delitivas que envolvem a jurisdição de mais de um país. Daí a importância da cooperação internacional, que necessita de mecanismos adequados, dinâmicos e complementares, para fazer frente a tal realidade e bem cumprir seu papel no combate ao crime de forma efetiva e célere.
Dentro dessa perspectiva, paralelamente à cooperação jurídica internacional, realizada formalmente por intermédio das Autoridades Centrais dos Estados1, com base em Acordos Internacionais ou reciprocidade, imprescindível para a obtenção de atos processuais e/ou elementos de prova válidos no exterior; cresce também a consciência da necessidade de uso de ferramentas mais dinâmicas de cooperação direta e informal, realizada especialmente para obtenção de informações a título de inteligência e que podem servir para auxiliar na condução de investigações e processos.
Assim, ao lado da cooperação direta já existente entre as instituições homólogas de diversos países2, surgem também as denominadas “redes de cooperação”, criadas por iniciativa e apoio de blocos regionais e organizações internacionais para dinamizar as relações de colaboração entre os Estados no combate ao crime e na recuperação de ativos desviados ilicitamente.
Uma das principais redes de cooperação da qual o Brasil faz parte é a Rede de Recuperação de Ativos do Grupo de Ação Financeira da América Latina contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (RRAG-GAFILAT)3, formalmente criada na reunião plenária do GAFISUD (atual GAFILAT), em 22 de julho de 2010, em Lima, Peru. Apoiam essa iniciativa o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime – UNODC, a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas da Organização dos Estados Americanos – CICAD/OEA, a Organização Internacional de Polícia Criminal – INTERPOL e outros parceiros.
A RRAG é um foro de natureza técnica e específica, composto por pontos de contato dos 16 países membros do GAFILAT4 mais a Espanha5, com o objetivo de otimizar mecanismos para a identificação, localização e recuperação de ativos de origem ilícita. Para tanto, possui uma plataforma de tecnologia da informação destinada à troca segura de dados entre os pontos focais dos países membros, a qual foi desenvolvida pelo Instituto Costarriquense de Drogas e cedida pela Costa Rica. Além disso, a rede estabelece reuniões presenciais periódicas a fim de fortalecer o intercâmbio de experiências e atualização prático-jurídica de cada país.
A rede possui caráter informal e dinâmico, destinada ao compartilhamento de informações como ferramenta prévia a um pedido formal de cooperação jurídica internacional, especialmente no intercâmbio voltado à identificação e rastreio de bens e valores no exterior. Apesar da informalidade, a plataforma da rede garante a segurança das informações, as quais são tramitadas de forma criptografada entre autoridades prévia e devidamente indicadas pelos Estados. Além disso, permite o acesso a partir de qualquer computador ligado à internet, de onde os pontos de contato cadastrados podem consultar os dados que são objetos das solicitações e das respectivas respostas.
Assim, a RRAG se destina a permitir a troca de informações sobre pessoas físicas, jurídicas, bens e valores, visando facilitar a identificação, localização e recuperação de ativos localizados no exterior que sejam produto ou instrumento de atividades ilícitas. Funciona também como um centro de intercâmbio de experiências e boas práticas sobre aspectos de investigação e persecução contra a lavagem de dinheiro e seus delitos antecedentes.
Para as autoridades brasileiras que presidem inquéritos policiais e atuam em processos criminais, a RRAG pode ter grande utilidade nas respectivas investigações, especialmente nas que envolvem lavagem de dinheiro, nas quais seja necessário identificar, localizar ou rastrear bens ou pessoas em alguns dos países membros da RRAG ou de outras redes de cooperação com as quais a RRAG tenha vínculo, como a Camden Assets Recovery Interagency Network – CARIN6.
Ainda, as informações obtidas por intermédio da RRAG podem ser utilizadas por Juízes, membros dos Ministérios Públicos e Delegados de Polícia também como fontes de dados que podem ser inseridos em um pedido de cooperação jurídica internacional, como por exemplo a identificação do número e agência de uma conta bancária, o correto endereço de alguma pessoa, a identificação do proprietário de um veículo, etc. Ou seja, a rede pode ser utilizada para facilitar e agilizar a comunicação entre os atores internacionais envolvidos no combate à criminalidade.
Por outro lado, a utilização da rede pode auxiliar no sentido de evitar a formalização de um pedido de cooperação jurídica internacional que possa ser considerado como “fishing expedition”. De fato, com base na confirmação dessas informações obtidas informalmente via RRAG, a autoridade responsável pelo caso criminal pode fazer uma posterior solicitação de cooperação jurídica internacional, a fim de obter provas ou as medidas assecuratórias pertinentes sobre esses mesmos ativos identificados.
A RRAG é constituída por pontos de contato de cada um dos países membros, que via de regra são autoridades ligadas à aplicação da lei que lidam diariamente com temas voltados ao rastreio e recuperação de ativos, bem como seu bloqueio e confisco, e que necessitam da cooperação de autoridades estrangeiras. Em regra, cada país é representado por dois pontos focais, sendo um da Polícia e outro do Ministério Público. Entretanto, há países que indicam um representante de sua Unidade de Inteligência Financeira e outros que indicam outro órgão que tenha atribuição sobre o tema de recuperação de ativos.
Desde a criação da RRAG, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça – DRCI/SNJ vem participando com um ponto de contato e nas reuniões, em virtude da temática referente à recuperação de ativos. Atualmente, estão designados três pontos focais pelo Brasil, oriundos de três instituições diferentes: DRCI, Departamento de Polícia Federal e Procuradoria Geral da República.
Caso haja interesse ou necessidade nos recursos e informações que a plataforma da RRAG pode oferecer, as autoridades nacionais que oficiam em inquéritos criminais e processos penais podem encaminhar suas dúvidas e demandas para o email institucional da Coordenação-Geral de Recuperação de Ativos do DRCI, cooperacaopenal@mj.gov.br, ou também consultar os pontos de contato das outras instituições brasileiras presentes do referido foro internacional.
Mais informações sobre a rede podem ser obtidas no seguinte endereço eletrônico:
http://www.gafilat.org/content/cooperacion/&lang=pt
1 No Brasil, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) do Ministério da Justiça exerce a função de Autoridade Central para análise e tramitação dos pedidos de cooperação jurídica internacional, conforme preceitua o art. 11, IV, do Decreto nº 6.061, de 15 de março de 2007, que a partir de 11 de março de 2016 será substituído pelo Decreto nº 8.668, recentemente publicado. Em matéria penal, tal função é exercida pelo DRCI/SNJ para a quase totalidade dos pedidos, excetuando-se apenas para os casos que tramitam com base no Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Federativa Portuguesa e para aqueles que tramitam com base no Acordo de Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá, sendo que nessas duas hipóteses a Autoridade Central prevista em tais acordos é a Procuradoria-Geral da República. Entretanto, para os pedidos de cooperação jurídica internacional que envolvam o Canadá, diversos deles são tramitados também por intermédio do DRCI/SNJ, com base na Convenção Interamericana sobre Assistência Mútua em Matéria Penal (Decreto nº 6.340, de 03 de janeiro de 2008), firmada no âmbito da Organização dos Estados Americanos, da qual ambos os países fazem parte.
2 Como exemplos de conhecidos mecanismos de cooperação direta e informal entre entes homólogos, encontram-se a comunicação entre as polícias dos países por meio das representações da INTERPOL e a comunicação entre as Unidades de Inteligência Financeira (UIF’s) por meio do Grupo de Egmont.
3 O GAFILAT é uma organização intergovernamental regional entre os países da América Latina, formalmente criado com o objetivo de combater a lavagem de dinheiro e o financiamento ao terrorismo, sob o mesmo modelo e mesmos propósitos do GAFI, visando à contínua melhoria das políticas nacionais ao fortalecimento de diferentes métodos de cooperação entre os Estados-Parte. Foi criado inicialmente no âmbito da América do Sul (e por isso era denominado de GAFISUD) em 08 de dezembro de 2000 em Cartagena das Índias, Colômbia, pela assinatura de um Memorando de Entendimento entre os Governos.
4 Atualmente os membros do GAFILAT são: Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru e Uruguai.
5 Em virtude da alta demanda de cooperação com os países latino americanos, a Espanha solicitou a inclusão de um ponto de contato na RRAG, pedido que foi aceito em 2013.
6 A CARIN é uma rede de cooperação informal semelhante à RRAG, utilizada por autoridades especializadas em identificação, rastreio, bloqueio e confisco de ativos, composta por pontos de contato no âmbito dos países da Europa, além de Estados Unidos da América, outros países e organizações internacionais.
* Isalino Antônio Giacomet Júnior é Delegado da Polícia Federal e Coordenador-Geral de Recuperação de Ativos do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça.
Autoridade Central para Extradição e Transferência de
Pessoas Condenadas – nova atribuição do DRCI
Foto: Flickr.com
Recentemente, no dia onze de fevereiro deste ano, foi publicado o Decreto nº 8.668/2016 da Presidência da República, que aprova a nova estrutura regimental do Ministério da Justiça e trata de outros assuntos administrativos diversos.
O referido ato normativo revogou expressamente o Decreto nº 6.061, de 15 de março de 2007, que trata do mesmo assunto. De acordo com o art. 9º do novo Decreto, foi prevista vacatio legis de vinte e oito dias após a data de sua publicação, havendo, portanto, previsão para sua entrada em vigor no dia 11 de março de 2016.
No que tange ao Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça – DRCI/SNJ, suas competências vieram previstas no art. 10, dentre as quais diversas delas não são novas e vieram apenas reforçar o seu âmbito de atuação já previsto anteriormente.
Nesse contexto, destacam-se as funções de articular a implementação da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro – ENCCLA, coordenar, articular, integrar e propor ações entre os órgãos nacionais no enfrentamento da corrupção, da lavagem de dinheiro e do crime organizado transnacional; coordenar a Rede Nacional de Laboratórios de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro - Rede-Lab; bem como estruturar, implementar, monitorar ações de governo sobre os temas de cooperação jurídica internacional e recuperação de ativos, além de atuar como Autoridade Central para tais assuntos. Ressalta-se que tais atribuições já vinham previstas expressamente em decretos anteriores e já fazem parte da vida diária dos servidores há mais de 10 anos, quando da criação do Departamento.
Entretanto, no campo da cooperação jurídica internacional, o novo Decreto nº 8.668/2016 destinou ao DRCI/SNJ novas e relevantes atribuições relacionadas aos temas de extradição e transferência de pessoas condenadas, absorvendo matérias até então tratadas no âmbito do Ministério da Justiça pelo Departamento de Estrangeiros – DEEST/SNJ, que agora passou a ser denominado de Departamento de Migrações.
Agora, de acordo com o art. 10 do novo Decreto, cumpre ao DRCI/SNJ estruturar, implementar e monitorar ações de governo nas áreas de cooperação jurídica internacional, inclusive em assuntos de extradição; negociar acordos de cooperação jurídica internacional, inclusive em assuntos de extradição, de transferência de pessoas condenadas e de transferência da execução da pena; promover a articulação dos órgãos dos Poderes Executivo e Judiciário e do Ministério Público no que se refere à entrega e à transferência de pessoas condenadas.
Ademais, o art. 10, V, do novo Decreto destinou expressamente ao DRCI/SNJ o exercício da “função de Autoridade Central para o trâmite dos pedidos de cooperação jurídica internacional, inclusive em assuntos de extradição, de transferência de pessoas condenadas e de execução de penas, coordenando e instruindo pedidos ativos e passivos.”
Ampliou-se assim o rol de atribuições do DRCI/SNJ com a inserção de importantes assuntos no âmbito de suas competências, com o objetivo de permitir o aperfeiçoamento do sistema de cooperação jurídica internacional brasileiro, na tentativa de torná-lo ainda mais organizado, coerente e padronizado.
Além disso, a reorganização dessas competências alinha-se também às boas práticas e tendências internacionais, especialmente em se destinar a função de Autoridade Central ao mesmo Órgão nacional para todos os assuntos relacionados à cooperação jurídica internacional, seja em matéria penal, civil, extradição e transferência de pessoas condenadas, a fim de que a expertise sobre esses temas possa ser tratada e difundida de forma coordenada como um todo.
Assim, ao receber as atribuições sobre os temas de extradição e transferência de pessoas condenadas, a partir de março de 2016, os servidores do DRCI/SNJ terão a tarefa de dar continuidade aos excelentes trabalhos realizados pelo DEEST/SNJ até o momento, assim como propor melhorias, implementar políticas e eventuais adaptações aos respectivos procedimentos internos e junto aos órgãos parceiros. Com isso, o Ministério da Justiça almeja continuar sua missão de otimizar a cooperação jurídica internacional e atingir níveis cada vez mais altos de efetividade em todas suas áreas de atuação.
Lançados Novos Manuais Práticos da Haia
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Estão disponíveis na página da internet da Conferência da Haia de Direito Internacional Privado as novas edições de dois Manuais Práticos: a 4ª edição do Manual sobre a Convenção de Citação – Convenção Relativa à Citação, Intimação e Notificação no Estrangeiro de Documentos Judiciais e Extrajudiciais em Matéria Civil e Comercial, de 1965 – e a 3ª edição do Manual sobre a Convenção de Provas – Convenção sobre a Obtenção de Provas no Estrangeiro em Matéria Civil ou Comercial, de 1970. Ambas as publicações estão disponíveis para a venda ao público em geral em formato e-book, nos idiomas oficiais da Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, inglês e francês.
Os manuais são uma importante ferramenta de trabalho para os operadores das Convenções, uniformizando e atualizando as práticas dos Estados-Parte, além de reunirem jurisprudência e relatos de casos. As publicações são resultado do trabalho das respectivas Comissões Especiais e trazem como novidade, em suas últimas versões, questões relacionadas ao uso de novas tecnologias da informação na prática das Autoridades Centrais e na tramitação de pedidos de cooperação jurídica internacional de forma geral.
No país, a Convenção de Provas foi aprovada pelo Congresso Nacional em 2013 e está em vigor no âmbito internacional entre o Brasil e os Estados que já o reconheceram. A Autoridade Central para esta Convenção é o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ). O tratado prevê a cooperação entre os Estados ao oferecer meios para que esses solicitem a produção de provas no exterior, por intermédio das suas respectivas Autoridades Centrais. Na prática, isso significa que a autoridade de um Estado pode enviar à autoridade de outro Estado um pedido de produção de provas para uso no âmbito de um processo judicial, sendo aplicável a lei do Estado requerido para a obtenção da prova solicitada. A principal vantagem da Convenção é a de oferecer instrumentos que resolvam eventuais incompatibilidades entre os sistemas jurídicos, especialmente entre os de Common Law e os de Civil Law.
Em relação à Convenção de Citação, seu texto está em análise pelo Congresso Nacional, no âmbito do Projeto de Decreto Legislativo 187/2015, atualmente sob exame da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados. A Convenção tem o principal objetivo de facilitar a tramitação de pedidos de comunicação de atos processuais – como citações, intimações e notificações – entre os Estados. A praticidade de sua aplicação tem resultado em maior efetividade e celeridade no cumprimento dos pedidos de cooperação jurídica internacional cujo objeto seja o de comunicação processual.
Assim, tendo em vista as vantagens oferecidas pela adesão às Convenções da Haia, que facilitam a tramitação de pedidos de cooperação jurídica internacional em matéria civil, o Brasil tem tido relevante papel nas discussões no âmbito da Conferência e também colaborou ativamente na produção do material ora publicado, por intermédio da equipe do DRCI/SNJ. O Ministério da Justiça é Autoridade Central para a maioria dos tratados internacionais dos quais o país é parte, além de exercer também este papel nos pedidos de cooperação jurídica internacional tramitados com base em reciprocidade.
Expansão da Cooperação Internacional no Leste Europeu
Foto: Divulgação/DRCI/SNJ
Brasileiros e bielorrussos se sentaram à mesa de negociação para celebrar acordos de cooperação jurídica internacional. O Ministério da Justiça e o Ministério das Relações Exteriores foram anfitriões desse encontro, realizado em Brasília, entre os dias 25 e 27 de janeiro. Os resultados da reunião foram bastante promissores. Ao final, foi concluída a negociação de dois acordos: o tratado bilateral de cooperação jurídica internacional em matéria penal e o memorando de entendimento entre o Ministério da Justiça da Belarus e o Ministério da Justiça do Brasil.
O acordo bilateral de cooperação jurídica internacional permitirá o aprimoramento das relações para prestar auxílio jurídico mútuo em matéria criminal. Já no preâmbulo, o tratado reconhece o compromisso que ambos os países já assumiram em âmbito multilateral para cooperar nos termos das principais convenções das Nações Unidas contra crimes transnacionais: a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Drogas e de Substâncias Estupefacientes, a Convenção contra o Crime Organizado Transnacional e a Convenção contra a Corrupção. Essas têm sido as bases normativas sobre as quais se fundamentam os pedidos de cooperação jurídica internacional entre Belarus e Brasil.
Os crimes que usualmente possuem natureza transnacional e, portanto, demandam cooperação internacional, caracterizam-se pela complexidade e agilidade de procedimentos, o que requer normas adaptadas a melhor atender aos sistemas jurídicos específicos dos países. Esse é o principal mérito dos acordos bilaterais, cujas disposições poderão refletir o tratamento mais adequado aos pedidos de cooperação e encaminhar de forma mais célere e efetiva solicitações de auxílio de forma geral, inclusive, de pedidos de afastamento de sigilo bancário e solicitações de constrição de bens, para fins de recuperação de ativos. Os acordos bilaterais, em suma, possuem a prerrogativa de adequar os pedidos de cooperação às especificidades próprias dos sistemas jurídicos dos países envolvidos, a fim de possibilitar a efetividade do cumprimento desses pedidos. Foi com essa perspectiva que se ultrapassou os esforços multilaterais para celebrar acordo bilateral de cooperação adaptado ao sistema jurídico brasileiro e bielorrusso.
Os países se comprometeram, por meio do tratado, a prestar as medidas mais abrangentes de cooperação internacional em assuntos criminais. Isso abrange não só solicitações que visam a esclarecer investigações e ações de persecução penal, mas também pedidos cujo objetivo seja o de recuperar ativos desviados pelo crime. Para tanto, previram-se solicitações de medidas acautelatórias que permitem a preservação desses ativos até eventual ordem de confisco definitivo ao final do processo. Em suma, o acordo fundamenta pedidos para identificar, rastrear, localizar, apreender e confiscar instrumentos e proveitos do crime; realizar oitivas; prover documentos e outros meios de prova; localizar pessoas e objetos; realizar medidas de busca e apreensão; entregar objetos; realizar perícias sobre pessoas, objetos e lugares; e recuperar ativos ilícitos, que serão posteriormente compartilhados entre os países que cooperaram para a recuperação.
O Ministério da Justiça é a autoridade central brasileira para o acordo com a Belarus. A autoridade central é responsável pelo recebimento, pela transmissão e pela análise dos pedidos de cooperação jurídica. Por isso, sabe que o envio de documentos pelas vias tradicionais envolve custos com correios e papeis, que muitas vezes tardam a alcançar o destinatário. A expertise acumulada no tema permitiu mitigar esses fatores que dificultariam a cooperação com a Belarus. As negociações do tratado prezaram pela modernização dos procedimentos e por um trâmite rápido e eficaz no envio de documentos. Assim, privilegiaram-se instrumentos de tecnologia que tornarão a cooperação mais eficiente, célere e barata, mediante a utilização de videoconferência para realização de oitivas e a possibilidade de tramitação de pedidos por meios eletrônicos.
O acordo também devota grande importância à recuperação de ativos como estratégia valiosa para enfrentar o crime transnacional. Grande parte dos delitos cometidos tem como objetivo final a obtenção de lucro. Assim, a melhor forma de combatê-los é restringir a capacidade econômico-financeira dos criminosos em agir, mediante a recuperação de bens, direitos e valores provenientes do crime. Há uma clara necessidade de descapitalização da atividade criminosa. Tal fato foi há muito percebido pela comunidade internacional, que reiteradamente chama a atenção para a necessidade do confisco e da apreensão dos bens ilícitos. O acordo com a Belarus está em sintonia com essa diretriz internacional e dedica pelo menos 6 artigos integralmente à recuperação de ativos.
Além do acordo de cooperação jurídica internacional em matéria penal, foi negociado Memorando de Entendimento com o Ministério da Justiça da Belarus. O documento valoriza a experiência positiva de cooperação entre os países e prevê futuras negociações, consultas e reuniões em temas de auxílio jurídico mútuo. Profissionais que trabalham com cooperação internacional em ambos os países serão capacitados em temas como recuperação de ativos e enfrentamento à lavagem de dinheiro e ao crime organizado transnacional. O Memorando de Entendimento também prevê o intercâmbio de informações sobre atualização de legislação aplicável - seja ela penal ou civil - o que pode incluir a troca de materiais jurídicos e de publicações periódicas, bem como a organização de eventos conjuntos de capacitação.
Os acordos negociados indubitavelmente contribuem para o aprimoramento da inserção do Ministério da Justiça no cenário internacional. A expansão das parcerias na Europa do Leste denota o alcance da rede de cooperação que o País tem estabelecido. A boa notícia é que, além de abrangente, essa atuação está sintonizada com as diretrizes mais atuais que a comunidade internacional tem traçado para enfrentar o crime que transpõe fronteiras. A atuação do Ministério da Justiça junto aos diversos foros internacionais que se dedicam a pensar soluções a esses problemas permite traduzir em acordos os consensos alcançados no âmbito de organizações como as Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos, o Mercosul, a Unasul, o G20 e tantos outros. Isso posiciona o Brasil na vanguarda da cooperação internacional.