Edição n° 09 - novembro/2015
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nº 9 /2015
Cooperação Jurídica Internacional e Responsabilização das
Empresas por Atos de Corrupção
Resolução aprovada na ONU aborda a importância da cooperação jurídica internacional para os procedimentos civis e administrativos que visam punir a Corrupção
Foto: Flickr.com
Por Camila Colares*
O Brasil liderou recentemente processo que resultou na aprovação de resolução sobre cooperação jurídica internacional para procedimentos civis e administrativos de combate à Corrupção, no âmbito da VI Conferência dos Estados Parte da Convenção da ONU Contra a Corrupção (UNCAC). A resolução trata de aspectos importantes para a cooperação não-criminal, quando esta se destina à instrução de procedimentos instaurados para investigar e punir atos ilícitos cometidos contra a administração pública nacional ou estrangeira.
A complexidade do fenômeno da corrupção se revela desde o momento em que se busca conceituá-la. São inúmeras as definições, que variam principalmente ao sabor da perspectiva de análise. Independentemente da abordagem adotada, contudo, já não se questionam os efeitos perversos que a corrupção sistêmica produz nos campos político, social e econômico. A corrupção mina os processos democráticos e a legitimidade dos governos perante a sociedade, que passa a identificar as instituições públicas como unidades capturadas por interesses privados. Acentua a pobreza e a exclusão social, na medida em que promove o desvio dos recursos que deveriam servir à promoção de direitos econômicos, sociais e culturais. Prejudica a economia ao promover a fuga de capital produtivo, a alocação equivocada de recursos, o aumento da inflação e do déficit público, distorce a dinâmica concorrencial de mercado, desestimula o investimento e afeta o crescimento do País.
O Estado, através do Direito, pode promover um ambiente de probidade no âmbito de sua própria estrutura administrativa, e também nas demais unidades sociais, inclusive nas estruturas de mercado. O mercado e o Estado são dois lados de uma mesma moeda e são ambos protagonistas na dinâmica que se instala em uma sociedade corrompida. Deve-se esperar que o mesmo Direito que se presta à construção de estruturas probas no Estado e à responsabilização dos agentes públicos corruptos, se dedique também ao desenvolvimento de políticas econômicas que incorporem a preocupação com a promoção da ética no mercado e nas suas relações com o bem público. O desafio do Estado é, portanto, romper com a dogmática que posiciona os atores da economia como unidades reativas, pautadas exclusivamente pelo desejo de maximização dos seus lucros, e promover seu necessário envolvimento no enfrentamento à corrupção, ampliando seu rol de obrigações e levando-o a combinar as preocupações de ordem econômica com as de justiça econômica, política e social.
No plano internacional, inciativas importantes foram tomadas a fim de mobilizar os Estados para a necessidade de implementarem políticas capazes não somente de promover a responsabilização das empresas por atos de corrupção, mas também de gerar mudanças de paradigmas a ponto de se refundar o ambiente de mercado, fazendo-o agir também como agente importante de mobilização e prevenção.
O primeiro grande passo neste sentido foi dado pelos Estados Unidos com a implementação do Foreign Corrupt Practice Act (FCPA) em 1976. Voltada à responsabilização de empresas por atos de corrupção de funcionários públicos estrangeiros, essa lei também prevê obrigações contábeis e estimula a criação de mecanismos internos para prevenção e detecção. Tendo surgido como resposta das autoridades locais a escândalos de corrupção envolvendo grandes empresas americanas, o FCPA inaugura uma prática de regulação pela integridade no mercado. A normativa seguiu como iniciativa isolada até que a pressão gerada por organismos internacionais levou alguns outros países a adotarem leis semelhantes, especialmente a partir dos anos 2000.
As três convenções internacionais que melhor representam o movimento internacional de enfrentamento à corrupção1 trazem dispositivos relacionados ao papel do setor privado neste esforço. A mais específica é a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE. A principal preocupação dos atores que se articularam para a formulação desta Convenção era garantir um mercado internacional livre de interferências relacionadas a práticas corruptas, estimulando, assim, um ambiente transparente e previsível para as contratações transfronteiriças.
O Brasil acompanha este movimento e tem dado passos importantes nos últimos anos, sendo o mais expressivo deles a aprovação da chamada Lei da Empresa Limpa (LEL), em agosto de 2013, que possibilita a responsabilização objetiva das empresas por atos de corrupção contra a administração pública brasileira ou estrangeira, além de criar mecanismos que estimulam a mudança dos padrões de governança corporativa.
Respeitando nossas diretrizes constitucionais, o País optou pela responsabilização não-criminal das empresas por atos de corrupção, de maneira que todo o arcabouço disponível no Brasil para investigação e punição de pessoas jurídicas neste campo é composto por normativos que fundamentam procedimentos civis e administrativos. Não estamos isolados nesta posição. As principais Convenções internacionais que tratam do combate à Corrupção preveem, como regra, a responsabilização não-criminal da pessoa jurídica, e as razões para tanto variam. Além das métricas constitucionais, a opção pela via não-criminal costuma encontrar respaldo também no fato de que os procedimentos civis e administrativos são usualmente mais céleres e suas penalidades mais adequadas à natureza econômica da pessoa jurídica. Ao mesmo tempo, os processos civis e administrativos têm potencial para gerar um ambiente de respeito ao devido processo legal e à ampla defesa nos mesmos moldes que os processos criminais.
O fato é que os instrumentos civis e administrativos de investigação das empresas pelo cometimento de atos ilícitos têm se revelado meios eficientes de combate à corrupção. Porém, se é verdade que um número cada vez maior de países tem recorrido a estas ferramentas, também é verdade que a cooperação jurídica internacional para os procedimentos desta natureza ainda encontra barreiras. Ao mesmo tempo, a aplicação da LEL, assim como de todas as outras que se prestam a investigar e punir atos de corrupção, depende largamente da cooperação jurídica internacional. Em se tratando da investigação de suborno transnacional, ou seja, corrupção de funcionário público estrangeiro por empresa nacional para obtenção de contratos, a necessidade de coordenação com as autoridades estrangeiras se faz ainda mais premente. Dada sua própria razão de existir, as empresas não encontram obstáculos à internacionalização de suas atividades e o que se vê com frequência é uma adequação do seu padrão de governança ao nível de tolerância institucional local.
Apesar de as Convenções internacionais proverem a base legal necessária à troca de atos e provas para a instrução de processos civis e administrativos, na prática, os Estados ainda encontram dificuldade em obter cooperação neste campo. Estas dificuldades devem-se, em grande parte, ao próprio desconhecimento quanto aos sistemas alienígenas, reforçado por uma longa tradição de cooperação para fins exclusivos de instrução criminal.
Com o fim de promover uma mudança neste cenário, o Brasil tem liderado um movimento de mobilização nos principais foros internacionais ligados ao combate à corrupção, o que culminou com a aprovação da resolução mencionada. O documento trata de assuntos importantes para a matéria, tais como a possibilidade de solicitar as medidas de assistência elencadas no artigo 46 da UNCAC e a importância de os Estados promoverem a recuperação de ativos, através da construção de arcabouço jurídico que permita à entidade vítima de corrupção iniciar procedimentos civis na jurisdição que abriga estes ativos, ou mesmo intervir como parte civil em procedimentos conduzidos pelas autoridades locais.
A resolução, claro, não constitui um instrumento vinculante, mas reflete um ambiente mais favorável para a cooperação em matéria civil e administrativa, quando esta se presta à instrução de processos voltados à punição da Corrupção.
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1 Convenção Interamericana Contra a Corrupção (1996), Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (1997) e Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (2005).
* Camila Colares é graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Oficial de Inteligência da Agência Brasileira de Inteligência. Coordenadora-Geral de Acordos e Cooperação Internacional na Secretaria de Transparência e Prevenção da Corrupção da Controladoria-Geral da União. Foi Diretora-Adjunta do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional na Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça.
Difusão do Conhecimento sobre Cooperação Jurídica Internacional
Foto: Flickr.com
A cooperação jurídica internacional em matéria penal consiste em ferramenta essencial destinada a compatibilizar os ordenamentos jurídicos dos diversos países e vem sendo cada vez mais utilizada como instrumento para o combate mais eficaz ao crime transnacional organizado e como procedimento para a obtenção de provas processuais válidas e para a recuperação de ativos junto a países estrangeiros.
No entanto, em que pese essa crescente importância do assunto, que nos dias atuais se apresenta como imprescindível para a atuação eficiente de autoridades que lidam com investigações criminais e processos penais no Brasil, é certo que a cooperação jurídica internacional não é uma matéria de trato diário da grande maioria de Juízes, Procuradores, Promotores e Delegados de Polícia, os quais podem necessitar dessa ferramenta, com maior ou menor intensidade, a depender da natureza dos procedimentos penais e dos crimes investigados.
Desta forma, na prática diária, muitas vezes, ao se depararem com procedimentos criminais em andamento nos quais seja importante obter alguma diligência a ser praticada e obtida no exterior, o Poder Judiciário, os Ministérios Públicos e as Polícias Judiciárias, Órgãos estes legitimados a oficiar no âmbito criminal, via de regra, necessitam de orientação sobre como proceder no caso criminal concreto, em virtude da imprescindibilidade de certos conhecimentos específicos e detalhados sobre a matéria relacionada ao auxílio jurídico internacional.
Dentro dessa perspectiva, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (DRCI/SNJ/MJ), por intermédio de sua Coordenação Geral de Recuperação de Ativos, além da atuação propriamente dita na qualidade de Autoridade Central para a tramitação de pedidos de cooperação jurídica internacional em matéria criminal e recuperação de ativos prevista na quase totalidade dos tratados internacionais sobre a matéria, também possui a atribuição indissociável de realizar e promover a difusão de informações sobre recuperação de ativos e cooperação jurídica internacional em matéria penal, nos termos no art. 11, VII, do Anexo I do Decreto nº 6.061/2007.
De fato, na atuação diária com o tema da cooperação, o DRCI é sensível ao fato de que não basta apenas a própria Autoridade Central manter um conhecimento concentrado e especializado sobre todas as informações e peculiaridades sobre o tema; mas sim convém que a experiência adquirida na cooperação jurídica seja disseminada a todos os cantos do Brasil, de forma que as autoridades federais e estaduais que lidam com processos criminais tenham acesso teórico e prático aos detalhes que envolvem a cooperação jurídica internacional e aos mecanismos de seu funcionamento, e com isso possam dinamizar a preparação e a elaboração dos pedidos de cooperação que sejam de seu interesse.
Diversas iniciativas vêm sendo adotadas pelo DRCI no que tange à difusão do conhecimento sobre o tema. Inicialmente, são disponibilizadas informações para fins de pesquisa no site do Ministério da Justiça e qualquer solicitação de esclarecimentos ou outra demanda sobre cooperação jurídica internacional em matéria penal também pode ser dirigida ao e-mail institucional da Coordenação-Geral de Recuperação de Ativos (cooperacaopenal@mj.gov.br), cujo prazo de resposta é de no máximo 48 horas.
Com a expertise e as boas práticas obtidas na atuação como Autoridade Central desde sua criação e em decorrência do amplo relacionamento com autoridades de diversos países estrangeiros, o DRCI também elaborou diversas publicações, dentre as quais estão o Manual de Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal e Recuperação de Ativos, as Cartilhas sobre o mesmo assunto, e também a presente publicação periódica denominada de Cooperação em Pauta.
Ainda, o DRCI tem organizado ao longo dos anos diversos eventos, seminários e cursos de capacitação específicos sobre cooperação jurídica internacional em diversos Estados da Federação, ou ainda cursos de capacitação contra a lavagem de dinheiro nos quais são inseridas apresentações pontuais sobre cooperação internacional. Como versam sobre matéria criminal, em geral esses cursos são destinados às autoridades que lidam com o tema, sem prejuízo da participação de outros interessados.
Ademais, sempre que convidado por outras instituições parceiras, o DRCI leva esses cursos a esses órgãos, dentre os quais podemos citar cursos de aperfeiçoamento no Conselho de Justiça Federal, cursos de formação de Magistrados Federais feitos pelos Tribunais Regionais Federais, cursos elaborados pela Escola Superior do Ministério Público, eventos organizados pela Procuradoria-Geral da República e por Ministérios Públicos Estaduais, pelo Departamento de Polícia Federal e outros.
Tais iniciativas de difusão de conhecimento são consideradas essenciais para o desenvolvimento da cooperação jurídica internacional no Brasil e para a coordenação com os demais órgãos e autoridades que atuam no âmbito criminal.
Transmissão Eletrônica de Pedidos de Pensão Alimentícia no Exterior: a participação do Brasil no Projeto iSupport
Foto: Arquivo/MJ
O termo Autoridade Central, no sentido usado para designar o órgão responsável por receber e enviar pedidos de cooperação jurídica internacional surgiu, pela primeira, vez, na Convenção da Haia Relativa à Citação, Intimação e Notificação no Estrangeiro de Documentos Judiciais e Extrajudiciais em Matéria Civil e Comercial, de 1965, e na Convenção sobre Obtenção de Provas no Estrangeiro em Matéria Civil ou Comercial, de 1970. Criou-se, nesses tratados, um órgão único para envio e recebimento de pedidos de cooperação jurídica entre os países.
Foi somente mais tarde, em 1980, com a Convenção da Haia sobre o Sequestro Internacional de Crianças, porém, que as Autoridades Centrais passaram a ter um papel fundamental no sistema de cooperação jurídica internacional, com o destaque inovador, naquele texto, da importância da comunicação e da assistência mútua entre as Autoridades Centrais como condição para o bom funcionamento da Convenção1. Trinta e cinco anos depois, credita-se boa parte do sucesso da Convenção de 1980 ao papel dado às Autoridades Centrais no trâmite dos pedidos, sendo o mesmo sistema adotado nas Convenções posteriores. O mais recente exemplo é o da nova Convenção da Haia sobre a Cobrança Internacional de Alimentos, de 2007, a qual agregou ainda mais funções às Autoridades Centrais.
Apesar da experiência bem sucedida da Convenção da Haia de 1980, porém, foi sendo notado que o fato de cada país conferir às suas Autoridades Centrais poderes e papéis distintos tem o potencial de gerar mal-entendidos, havendo a necessidade de reforço, pela Conferência da Haia, por meio de seus guias de boas práticas, da importância da aproximação e do contato frequente entre as Autoridades Centrais. Hoje, entende-se que somente por meio de uma boa comunicação se poderá atingir alguma harmonização entre as práticas de cada Estado, conferindo rapidez e eficiência no atendimento aos pedidos de cooperação jurídica.
Neste sentido, o avanço mais recente para aprimorar a comunicação e o gerenciamento de pedidos de cooperação jurídica entre os Estados se deu com o desenvolvimento do iSupport pela Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, com o apoio da União Europeia. Trata-se de ferramenta que permitirá aos Estados parte da nova Convenção da Haia sobre a Cobrança Internacional de Alimentos gerenciarem e transmitirem pedidos eletronicamente, de forma segura e com uso de linguagem padronizada.
De fato, ao iniciarem o levantamento das necessidades e dificuldades encontradas na transmissão de pedidos entre Autoridades Centrais, os responsáveis pela elaboração do iSupport concluíram que os principais entraves à comunicação são: problemas de tradução, com o uso de terminologias distintas entre os diferentes países; grande volume de pedidos tramitados; demora na tramitação dos casos; insegurança no envio de comunicações; e quantidade de informações trocadas no dia a dia das Autoridades Centrais 2.
A partir desse levantamento, passou-se à segunda fase do projeto, no início de 2015, realizado em conjunto com grupos de trabalho intergovernamentais que discutiram as necessidades técnicas e funcionalidades esperadas da nova ferramenta. A terceira fase, iniciada em julho de 2015, serve para que cada módulo desenvolvido para o programa seja apresentado e aperfeiçoado, de acordo com a avaliação e as demandas dos técnicos envolvidos no projeto. Em princípios de 2016, será iniciada a fase piloto, ocasião em que as Autoridades Centrais deverão estar tecnicamente preparadas para dar início ao uso do iSupport.
Durante essas diferentes fases de desenvolvimento do iSupport, é importante que se destaque o papel do Brasil no projeto, ao lado de Alemanha, Áustria, Estados Unidos, França, Holanda, Noruega, Portugal e Suíça. A participação brasileira resulta do reconhecimento da colaboração e empenho do País, representado pela Secretaria Nacional de Justiça - SNJ, na implantação da Convenção da Haia de Alimentos e temas relacionados, além de novas tecnologias de gerenciamento de processos de cooperação jurídica internacional.
No âmbito do Ministério da Justiça, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, da SNJ, participa quinzenalmente de videoconferências do Projeto Piloto e no ínterim realiza testes e acompanha o trabalho a ser desenvolvido pela Coordenação-Geral de Tecnologia da Informação do Ministério para que, em 2016, o Brasil esteja pronto para a implantação do iSupport. Com o uso da ferramenta, espera-se alcançar o objetivo de tornar mais eficiente, econômico e seguro o processo de envio e recebimento de pedidos de cooperação relacionados a pensões alimentícias, ampliando-se o acesso à justiça para os cidadãos.
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1 DYER, Adair. The Internationalization of International Family Law. In.: 30 U.C. Davis L. Rev. 625 1996-1997.
2 General Description of the iSupport Project . In.: http://www.hcch.net/upload/descr_isupport_en.pdf.
Cooperação Internacional na Pauta do Mercosul
Foto: Arquivo/MJ
Os Ministros da Justiça do Mercosul e seus representantes se reuniram em Assunção para promover a agenda de Justiça do bloco regional. O evento foi antecedido pelo encontro do Foro de Autoridades Centrais e da Comissão Técnica de Justiça, em que preponderaram temas de cooperação jurídica internacional.
O Foro de Autoridades Centrais (FAC) foi reativado por iniciativa brasileira, durante as reuniões que organizamos na condição de país presidente do Mercosul no primeiro semestre deste ano. Os resultados alcançados inspiraram o Paraguai a convocar o FAC também por ocasião da presidência que exerceu neste segundo semestre, o que garantiu continuidade às iniciativas desenvolvidas. O FAC publicou diretório com informações completas sobre as autoridades centrais designadas pelos Estados aos acordos do Mercosul que preveem a cooperação jurídica internacional. A intenção é manter uma base de dados atualizada sobre quais são as autoridades competentes para lidar com pedidos de auxílio, a depender da natureza desses pedidos. Eles podem tratar de extradição, de transferência de pessoas condenadas, de residência, de medidas cautelares, de assistência jurídica gratuita e de solicitações de cooperação em geral, sejam em matéria penal, sejam em matéria civil.
O ânimo de aprimorar os procedimentos de cooperação internacional também inspirou o FAC a discutir a adoção de novos procedimentos para o trâmite de solicitações de auxílio entre os países. Lideramos duas propostas. A primeira trata de formulário bilíngue para tramitação de pedidos que versam sobre comunicação de atos processuais. Como instituição incumbida das funções de autoridade central para cooperação jurídica internacional, o Ministério da Justiça brasileiro identificou que, dentre os casos tramitados com os países do Mercosul, pedidos de citação, intimação e notificação representaram em torno de 65% do total. Sabemos que tempo e custo são conceitos centrais para a prestação do auxílio jurídico mútuo de maneira célere e efetiva. Logo, formalizamos proposta de memorando de entendimento que estabelece modelo de formulário bilíngue para restituição de pedidos de cooperação jurídica internacional que visam a comunicar atos processuais. Tais formulários - por virem redigidos nas línguas espanhola e portuguesa - dispensam tradução, reduzem custos e contribuem para a desejável celeridade da cooperação internacional que estabelecemos. A segunda proposta brasileira cuida da tramitação eletrônica de pedidos entre os países do Mercosul. Assim como a Lei n. 11.419, de 19 de dezembro de 2006, dispõe sobre a informatização do processo judicial no Brasil, iniciativas similares têm sido implantadas em outros países da região, o que dá razão a otimismo de que procedimentos mais racionalizados de cooperação internacional também possam ser implantados. O Ministério da Justiça brasileiro encampou a ideia no Mercosul e tem defendido o uso da tecnologia como uma aliada para que a cooperação internacional contribua para a prestação da Justiça de maneira rápida, segura e econômica.
A Comissão Técnica de Justiça também esteve reunida em Assunção. O grande projeto da Comissão é a negociação de acordo sobre procedimentos civis e administrativos contra a corrupção. Também de iniciativa brasileira, a proposta se baseia no reconhecimento de que a corrupção frequentemente tem caráter transnacional, o que requer uma ação coordenada entre os países, a fim de enfrentar essa prática de maneira eficaz. Além disso, o acordo propõe uma abordagem da corrupção que extrapola a esfera penal, de modo a abranger também infrações apuradas mediante procedimentos civis e administrativos. Trata-se de iniciativa de vanguarda, que o Brasil tem defendido nos principais foros internacionais de que participa. Enquanto os países do Mercosul se reuniam em Assunção, Paraguai, os Estados Parte da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção estavam reunidos em São Petersburgo, Rússia, onde aprovaram resolução sobre o aprimoramento do uso de procedimentos civis e administrativos contra a corrupção por meio da cooperação internacional. O documento encoraja os Estados a negociar acordos multilaterais ou regionais sobre o tema, de modo a promover a fundamentação legal para cumprimento de pedidos de auxílio entre países. O estímulo foi pensado justamente para fomentar o avanço do acordo apresentado ao Mercosul e ilustra a maneira coordenada e proativa com que temos desenvolvido o assunto nos diversos foros internacionais de que participamos.
A reunião em Assunção marcou o encerramento da presidência paraguaia da Reunião de Ministros de Justiça. As atividades se desenvolverão no próximo semestre já sob a presidência pro tempore do Uruguai.