Edição n° 01 - março/2015
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nº 1/ 2015
As novas perspectivas da Cooperação Jurídica Internacional
A discussão dos mecanismos e dos avanços da cooperação jurídica internacional se faz necessária frente aos desafios do mundo globalizado e transnacional
Por Ricardo Andrade Saadi
O processo de globalização pode ser analisado sob diversas perspectivas, todas elas relacionadas à transformação dos espaços nacionais em arenas globais. Assim, temas que antes eram estruturados sob uma ótica estritamente nacional passam à escala mundial, modificando por completo a dinâmica das relações econômicas, financeiras, sociais e informativas. A realidade atual já não possui a marca do Estado nacional como figura protagonista, condicionadora e, porque não dizer, limitadora das relações internacionais.
As fronteiras geográficas, cada vez mais ligadas a aspectos meramente simbólicos, não representam grande obstáculo à livre circulação de bens, de serviços, de capitais e daquilo que melhor representa o avançado estado de globalização em que vivemos - a informação. Enquanto o século XIX foi marcado pela sociedade industrial, no século XX surge a sociedade da informação, permitindo que as informações sejam transmitidas instantaneamente e dando origem às redes sociais virtuais em níveis locais, regionais e globais. Diante deste novo cenário, surgem conflitos jurídicos entre particulares que dependem da cooperação jurídica internacional, uma vez que a jurisdição é um produto do Estado soberano e os países devem colaborar para garantir que as pessoas possam exercer seus direitos que transcendem as fronteiras dos Estados.
Vive-se um cenário onde iniciativas isoladas de regulação são percebidas como medidas de contra-fluxo e destoantes do modelo predominante das relações internacionais. Ao mesmo tempo, parte-se do pressuposto de que a sociedade internacional compartilha de determinados valores básicos ligados à noção que se tem de direitos humanos, universalmente difundida e refletida, expressa ou implicitamente, nos instrumentos internacionais consagrados a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Como, então, garantir que esse padrão que abomina a regulação das relações se compatibilize com o dever que têm os Estados e a sociedade internacional de proteger os direitos humanos independentemente das jurisdições que esse mesmo exercício de proteção envolva? Especificamente, como assegurar que a internacionalização das relações privadas não se reverta em impunidade ou inaplicabilidade da Justiça? Como conferir às relações privadas internacionais o nível de segurança e previsibilidade necessários a que elas sejam sustentáveis a longo prazo?
O alargamento e o aprimoramento da cooperação jurídica internacional surgem como reflexo da preocupação dos Estados em mitigar os efeitos negativos da globalização no que se refere à concretização da Justiça nas relações internacionais. Institutos tradicionais como a Extradição e a Carta Rogatória foram aperfeiçoados ao mesmo tempo em que novos mecanismos foram criados para melhor adaptar a cooperação jurídica às necessidades atuais.
Diante do exposto, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça (DRCI/SNJ) do Ministério da Justiça lança o informativo Cooperação em Pauta a fim de dialogar sobre a cooperação jurídica internacional com todos os atores envolvidos no tema.
* Ricardo Andrade Saadi é Diretor do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional Justiça do Ministério da Justiça e Delegado Federal.
Obtenção de homologação de sentença estrangeira em matéria penal
O Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI/SNJ) vem realizando estudos internos sobre o tema relacionado à homologação de sentença estrangeira em matéria penal. O referido assunto não é muito comum no âmbito processual criminal, tendo em vista que o próprio art. 9º do Código Penal limita a homologação de sentença penal estrangeira no Brasil apenas para as finalidades de obrigar o condenado reparação do dano, restituições e outros efeitos civis, ou ainda para sujeitá-lo à medida de segurança.
A possibilidade de utilização desse mecanismo de cooperação jurídica internacional tende a se elevar em importância no âmbito criminal, pois os Delegados de Polícia, Membros do Ministério Público e Juízes que conduzem investigações e processos penais no Brasil estão enfrentando com mais intensidade o aspecto patrimonial da criminalidade, que além do combate à lavagem de dinheiro, também pode trazer repercussões civis de reparação a danos causados, finalidade para a qual a lei permite a homologação de sentença penal estrangeira no Brasil. Sobre o mesmo tema, ressalta-se ainda que a Resolução nº 9, de 04/05/2005, do STJ, ato normativo que regulamentava o processamento da homologação de sentença estrangeira no Brasil, foi recentemente revogada pelo art. 3º da Emenda Regimental nº 18, de 17/12/2014, do STJ. Desta forma, o tema passou a ser atualmente disciplinado pelo Título VII-A do Regimento interno do STJ, juntamente com as cartas rogatórias (disposto entre os arts. 216-A e 216-X).
Pensão alimentícia no exterior é discutida por videoconferência
O Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI/SNJ) coordena a participação brasileira nos grupos de trabalho da Conferência da Haia de Direito Internacional Privado sobre a prestação de alimentos no exterior, trabalho feito sob a supervisão do Itamaraty. Até meados de março deste ano, seis grupos de trabalho, com representantes de diversos países, frealizam 20 reuniões por videoconferência, para facilitar e agilizar a concessão de pensão alimentícia no exterior.
Os encontros se destinam a assentar as bases para o desenvolvimento de um sistema eletrônico para a gestão de casos e para a tramitação dos pedidos de pensão entre os países participantes. As reuniões são capitaneadas pelo Primeiro Secretário Conferência da Haia, o segundo na hierarquia daquela Organização Internacional. Participam também peritos de países europeus, e diversos membros do Subcomitê Internacional da National Child Support Enforcement Association - NCSEA, que envolve representantes federais, estaduais e provinciais dos Estados Unidos e do Canadá, além de diversos outros países que participam do projeto, como o Brasil.
A utilização da videoconferência permite que reuniões entre os países, antes presenciais, aconteçam a distância. Isso possibilita uma importante redução de custos, aumenta a frequência dos encontros e agiliza as decisões. Contribuem para a iniciativa a UnB, o Banco Central, a Justiça Federal, a AGU, a SDH, PGR, a Defensoria Pública e a PUC-Rio.
Brasil intensifica atuação em foros internacionais durante presidência do Mercosul
No primeiro semestre de 2015, durante a presidência pro tempore brasileira do Mercosul, o Ministério da Justiça presidirá as reuniões da Comissão Técnica de Ministros da Justiça. A expectativa do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) é avançar em projetos de sua iniciativa no foro, propor soluções inovadoras para prevenir e combater a corrupção e consolidar projetos prioritários, como a Estratégia Nacional de Segurança nas Fronteiras. Pretende-se sedimentar a proposta brasileira de criação de grupo ad hoc sobre repartição de bens confiscados, com o fim de avançar na negociação do acordo que dá nome ao grupo. Tanto o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) quanto o Grupo de Especialistas para o Controle da Lavagem de Dinheiro (LAVEX) já vêm desenvolvendo projetos sobre o tema. A experiência desses foros internacionais será aproveitada para estabelecer sinergias que permitam ao bloco regional envolver-se em discussões de vanguarda sobre o enfrentamento de crimes transnacionais.
Haverá também o lançamento de novos projetos. Será proposto acordo para cooperação internacional por meio de procedimentos civis e administrativos de enfrentamento da corrupção. O objetivo é trazer ao Mercosul os acúmulos do trabalho do Brasil em foros como as Nações Unidas, o Grupo de Trabalho contra o Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros (WGB/OCDE) e o Grupo de Trabalho Anticorrupção G20, de modo a aproveitar as boas práticas aferidas nos foros internacionais e confirmar a liderança brasileira nesse tema.
Outra oportunidade de consolidar projetos prioritários do Governo Federal é negociar acordos com países de fronteira. Para tanto, pretende-se fortalecer as autoridades centrais de cooperação jurídica internacional por meio do resgate do foro de autoridades centrais. A convocatória da reunião terá como uma das pautas a negociação de modelo de formulário bilíngue para restituição de pedidos de cooperação jurídica internacional referentes à comunicação de atos processuais e para informação sobre cumprimento de pedido de cooperação jurídica internacional. Por fim, o DRCI pretende fomentar proposta de acordo que cria grupo de trabalho para implementar a metodologia brasileira dos Laboratórios de Tecnologia contra a Lavagem de Dinheiro, em países do Mercosul.