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MJSP negocia retirada de projetos de lei que facilitam garimpo em terra indígena, configuração de legítima defesa em GLO, fake news e porte de armas
Brasília, 07/04/2023 - O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) articula, junto à Câmara dos Deputados, a retirada de quatro projetos de lei (PL’s) enviados pelo Governo Federal ao Legislativo, entre 2019 e 2021. Os temas referem-se à extração de minérios em terras indígenas, alteração do Marco Civil da Internet, estatuto do desarmamento e operação de garantia da lei e da ordem (GLO’s).
Um deles é o Projeto de Lei nº 191, apresentado em fevereiro de 2020, que propõe regulamentação para estabelecer condições específicas para a extração de minérios e aproveitamento energético em terras indígenas, bem como indenização pela restrição do usufruto dos territórios. Se aprovada, a lei ensejaria a presença maciça de garimpeiros nos territórios indígenas. Isso poderia acarretar em permanente situação de emergência para os povos originários, a exemplo do ocorrido em território Yanomami. Só em 2022, 99 crianças morreram de desnutrição, contaminação, pneumonia e diarreia devido ao avanço do garimpo ilegal. Também foram confirmados 11.530 casos de malária, distribuídos entre 37 polos-base, de acordo com dados do Ministério dos Povos Indígenas.
Proteção das terras indígenas
O governo já solicitou a devolução do projeto, que determina, entre outros tópicos, que as terras tradicionalmente ocupadas por indígenas destinam-se a sua posse permanente e que o aproveitamento de quaisquer recursos naturais só pode ser efetivado mediante a participação e escuta da população local. Além disso, segundo o pedido interministerial, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) é imprescindível na discussão do tema.
“Não há sustentabilidade para atuação do garimpo em terras indígenas. O garimpo deixa um lastro de destruição ambiental, mercúrio espalhado pelos rios e pela terra, espalha a fome. O que muda é que, agora, voltamos a ter uma política de proteção das terras indígenas e dos direitos dos povos indígenas, no sentido de cumprir o dever constitucional de assegurar condições dignas de sobrevivência e os direitos conquistados depois de muita luta pelos povos indígenas, com os quais a nossa sociedade tem uma enorme dívida", ressaltou o secretário Nacional de Acesso à Justiça, Marivaldo Pereira.
Atuação de militares e agentes de segurança pública
Outro pedido de retirada foi solicitado pelo MJSP à Presidência da República, juntamente com o Ministério da Defesa, e diz respeito ao projeto de lei nº 6.125, que propõe alteração na legislação penal relacionada à atuação de militares e agentes de segurança pública em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLOs), o que, para as Pastas, “promove um desvirtuamento do conjunto de regras aplicáveis ao uso da força por agentes públicos durante operações de GLO, criando um estado de exceção incompatível com o estabelecimento de uma política de segurança pública com cidadania.” Pelo PL, ampliam-se as situações em que agentes de segurança seriam abrangidos pelo excludente de ilicitude, em caso de situações de definição demasiadamente amplas, conduta capaz de gerar morte ou lesão corporal grave.
No documento, o MJSP argumenta que, além de estar equivocado ao propor presunção de legítima defesa por parte do agente, o projeto contraria o Código Penal e que amplia as possibilidades de episódios de abuso do Estado brasileiro, através do agente de segurança.
Marco Civil da Internet
O projeto de lei nº 3.227, de 2021, que diz respeito ao Marco Civil da Internet, também está incluso nos pedidos de retirada de votação. A proposta prevê a limitação de moderação de conteúdos nas redes sociais, o que dificulta severamente a remoção de conteúdos e suspensão de perfis que infrinjam os termos de uso e violem direitos, facilitando, consequentemente, a propagação de notícias falsas (fake news).
Para embasar a solicitação, feita em conjunto com os Ministérios do Turismo e da Ciência, Tecnologia e Informações (MCTI), são aludidos dois aspectos legais: o teor idêntico da Medida Provisória 1.068, de 2021, à época devolvida ao Poder Executivo por inconstitucionalidade, e ao artigo 8 da própria lei do Marco Civil da Internet, que enumera as hipóteses de remoção, suspensão e exclusão de perfis e conteúdos falsos.
“O PL limita a atuação das redes sociais na prevenção e repressão aos atos de preconceito ou de discriminação praticados contra pessoas de grupos sociais vulneráveis dando caminho livre para o discurso de ódio, que atualmente é instrumentalizado para a radicalização política e leva à corrosão do debate político público democrático”, defendeu a assessora jurídica e coordenadora de Direitos Digitais do MJSP, Estela Aranha.
Ela ressalta, ainda, que tal instrumentalização não é exclusiva da conjuntura política do Brasil: “O texto da lei repete propostas legislativas dos Estados da Flórida e do Texas que foram suspensas e estão sob análise da Suprema Corte Americana, mostrando que a motivação está muito mais para atender demandas ideológicas do que as necessidades e anseios da população brasileira.”
Estatuto do Desarmamento
Por fim, o MJSP, juntamente à Secretaria-Geral da Presidência, encaminhou a retirada do projeto de lei nº 6438, o Estatuto do Desarmamento. Na proposta enviada à Câmara dos Deputados, o porte de armas pela população civil é ampliado. Já o pedido de retirada defende que a ampliação ameaçaria o monopólio legítimo de força do Estado e alimenta o crime organizado. De acordo com a solicitação, a flexibilização na aquisição de armas e consequente ampliação do número de colecionadores, atiradores e caçadores (CACs) não representou proteção efetiva de pessoas e patrimônio, mas sim, contribuiu para o aumento de fraudes, abusos e ameaças ao Estado Democrático de Direito.
Para o secretário de Assuntos Legislativos do MJSP, Elias Vaz, os projetos confrontam com as políticas públicas definidas pela atual gestão, e que retirá-las é fundamental para seguir o programa de governo democraticamente eleito: "São pautas contrárias ao que defende o governo eleito e, portanto, que foram rejeitadas pela maioria da população. Analisamos que é plenamente possível retirá-las pois sequer foram postas em votação", avaliou.