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Brasil vira rota de contrabando de migrantes e MJSP muda regras para a entrada no país
- Foto: Banco de imagens
Brasília, 22/08/2024 - A partir de segunda-feira (26), o passageiro em trânsito que não tiver visto de entrada no Brasil e tem como destino final outro país, terá que seguir viagem ou retornar à localidade de origem. A decisão do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), por meio da Secretaria Nacional de Justiça (Senajus), ocorre após identificar-se um aumento de fluxo migratório relacionado à rota ilegal, principalmente no Aeroporto de Guarulhos (GRU), que é uma das maiores fronteiras de entrada no território brasileiro.
As companhias aéreas e a Polícia Federal (PF) informaram ao MJSP que muitos passageiros têm bilhetes com destino a outros países da América do Sul, mas que fazem conexão no Brasil. Ao chegarem sem visto, precisam esperar na área de trânsito internacional do aeroporto, o que causa superlotação e atrai organizações criminosas envolvidas em tráfico de pessoas e contrabando de imigrantes.
De acordo com o secretário Nacional de Justiça, Jean Keiji Uema, cerca de 70% dos migrantes vêm do sudeste asiático e desistem de seguir viagem ao chegarem ao Brasil. “Por estarem sem visto, aguardam na área de inadmitidos para fazer o pedido de refúgio”, explica. A expectativa é que, com a nova restrição, essas pessoas sem visto comecem a ser inadmitidas no Brasil e as companhias aéreas garantam que elas sigam para o destino final previsto na passagem.
Uema ressalta que o Brasil não pode permitir que seu caráter acolhedor e humanitário seja explorado por organizações criminosas para facilitar a migração ilegal. “O refúgio é um instrumento legal para proteger pessoas perseguidas em seus países de origem. Não podemos permitir que ele seja usado para tráfico de pessoas e contrabando de imigrantes”, diz o secretário, acrescentando que a decisão foi baseada em um extenso estudo jurídico e em diálogo com a Polícia Federal, o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério Público Federal e o Congresso Nacional.
Entenda as principais dúvidas sobre o assunto:
O que muda com o novo procedimento para a entrada no Brasil?
O passageiro em trânsito que não tiver visto de entrada para o Brasil e que tem como destino final um país diferente precisará seguir viagem ou retornar ao ponto de origem. Se esses passageiros permanecerem na área de trânsito internacional do Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, ou em outros aeroportos com conexões internacionais, e não tiverem visto de entrada para o Brasil, não serão admitidos.
O Brasil exige visto de trânsito?
A Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017, a chamada Lei de Migração, estabelece a hipótese de dispensa do visto de visita específica relacionada à finalidade de trânsito: "O visto de visita não será exigido em caso de escala ou conexão em território nacional, desde que o visitante não deixe a área de trânsito internacional”.
A não exigência do visto em caso de conexão ou escala está condicionada à permanência do passageiro na área destinada ao trânsito internacional. O objetivo da legislação brasileira foi facilitar o procedimento de escalas ou conexões nos aeroportos, reduzindo trâmites burocráticos e operacionalizando de forma mais rápida o processo de transferência e/ou parada de passageiros entre trechos internacionais.
É correto afirmar que os viajantes inadmitidos serão deportados?
Não. A legislação brasileira prevê que o passageiro em trânsito não tem o Brasil como destino final. Nesses casos, o Brasil é tido como país intermediário. Por isso, a dispensa de visto está condicionada à permanência desse passageiro em área restrita internacional de trânsito.
Nesse contexto, como o passageiro sinaliza, desde o ato de aquisição do bilhete aéreo, a intenção apenas de trânsito pelo território brasileiro, não se aplica medida de deportação, mas, sim, de efetivação do trânsito até o país de destino final do passageiro.
A medida vale para passageiros de todos os países?
Não. O novo procedimento se aplica apenas àqueles que chegam de países que o Brasil exige o visto e não têm o território brasileiro como destino final. Ou seja, a medida não vale para os países que estão na lista de isenção de visto para entrar no Brasil.
Os novos procedimentos significam uma mudança na política de refúgio do Brasil?
A política brasileira de concessão de refúgio não está mudando. O que está sendo tratado é uma situação muito específica, identificada pela Polícia Federal. O objetivo é manter uma migração justa, ordenada e segura.
O que motivou a decisão?
A decisão foi tomada após a Polícia Federal identificar que o Brasil virou rota de organizações criminosas que fazem contrabando de imigrantes e tráfico de pessoas. As autoridades passaram a identificar um aumento exponencial de nacionais oriundos, principalmente, de países asiáticos. Esses viajantes têm seus bilhetes aéreos emitidos com destino final a outros países sul-americanos.
Ocorre que, uma vez na área internacional de trânsito do aeroporto, em situação de escalas e/ou conexões, esses viajantes desistem do trecho final de suas viagens (muitas vezes desfazendo-se até mesmo de seus cartões de embarque originais), permanecendo nessa área de forma irregular.
A Polícia Federal identificou que os viajantes nessa situação são orientados pelas organizações criminosas a recorrer ao pedido de refúgio para ingressar em território brasileiro, em substituição indevida à necessidade de visto de entrada no Brasil.
Como se chegou a esse diagnóstico?
Investigações da Polícia Federal revelaram que o objetivo desses viajantes não é solicitar a proteção do Estado Brasileiro por meio do instituto do refúgio, mas, sim, seguir rota rumo ao norte das Américas, principalmente para os Estados Unidos e Canadá. Em maioria, esses viajantes estão fazendo uso da conhecida – e extremamente perigosa – rota de Darién.
Além disso, os dados de pedidos de refúgio no Aeroporto Internacional de Guarulhos passaram a chamar a atenção das autoridades. Em 2013, o número de pedidos foi de 69. Em 2023, os pedidos alcançaram o patamar de 4.239, um crescimento de mais de 61 vezes.
De acordo com a Polícia Federal, de janeiro deste ano até 21 de agosto, foram 6.329 pedidos de reconhecimento da condição de refugiado protocolados em Guarulhos.
De todos os pedidos de refúgio recebidos entre 2023 até 27 de junho de 2024, que somavam mais de 8.300, apenas 117 pessoas buscaram a obtenção do Registro Nacional Migratório, carteira disponibilizada a todos os solicitantes de refúgio no Brasil e amplamente demandada e utilizada por este público.
Adicionalmente, apenas 262 pessoas solicitaram CPF - documento gratuito, de fácil emissão, e essencial para o exercício da vida civil no Brasil. Indispensável, por exemplo, para acessar os sistemas de saúde, de educação, de assistência social, para exercício de atividades profissionais e para abertura de conta bancária.
Segundo a Polícia Federal, os números revelam o uso abusivo do instituto do refúgio com a finalidade única de seguir rotas migratórias irregulares. Ou seja, está consolidada no Brasil uma rota de migração irregular, com forte atuação de atores envolvidos no contrabando de migrantes e no tráfico de pessoas; com evidente uso fraudulento do instituto do refúgio.
O novo procedimento tem amparo legal?
Sim. A inadmissão desses passageiros em território brasileiro está prevista na Lei de Migrações. A permanência de pessoas que cheguem ao Aeroporto de Guarulhos com destino a outros países, viola não apenas apenas a legislação brasileira, mas a própria soberania nacional no que diz respeito à decisão sobre quais nacionalidades necessitam ou não de visto de entrada no país.
Nesses casos, não há que se falar em violação ao parágrafo único do Art. 45 da Lei de Migração, que pondera que "ninguém será impedido de ingressar no País por motivo de raça, religião, nacionalidade, permanência a grupo social ou opinião política", posto que está configurado uso fraudulento do instituto de refúgio.
A medida tem como objetivo proteger o instituto do refúgio, assegurando seu acesso a pessoas que efetivamente demonstrem interesse em solicitar a proteção internacional por parte do Estado Brasileiro, além de quebrar a atuação de organizações criminosas no contrabando de imigrantes e tráfico de pessoas.
O que vai acontecer com os migrantes que estão na área restrita do Aeroporto Internacional de Guarulhos?
Até segunda-feira (26), os passageiros que estão em trânsito, na zona restrita, e que, porventura, vierem a pedir refúgio, terão suas solicitações processadas. Até quarta-feira (21), eram 481 pessoas na área restrita de trânsito internacional do Aeroporto de Guarulhos. O Ministério da Justiça, em parceria com a Polícia Federal, montou uma força-tarefa para agilizar o processo.