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Audiência pública do Pena Justa reúne instituições para debate sobre melhorias do sistema penitenciário
Foto: Everton Ubal/MJSP
Brasília, 29/04/2024 - O secretário Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), André Garcia, afirmou que o país vive um momento da chamada “agenda do senso comum”, que faz vítimas preferenciais. “Uma delas é o sistema penitenciário brasileiro, e isso em meio a uma agenda legislativa que tem sido pautada com respostas imediatas, simples e, muitas vezes, na exploração do sentimento médio das pessoas”, disse.
A declaração foi feita em audiência pública do Pena Justa, o plano nacional voltado ao enfrentamento do Estado de Coisas Inconstitucional do sistema carcerário brasileiro, conforme apontado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347. O evento acontece nesta segunda-feira (29) e terça-feira (30), no Palácio da Justiça, sede do MJSP, quando serão ouvidas propostas e experiências baseadas em critérios de representatividade e diversidade, que ajudarão a construir um plano sólido e eficaz.
Para André Garcia, a função da audiência pública é tratar, de forma racional, respeitosa e profunda, um problema que é complexo e não pode ser resolvido com improviso. “Não é um lugar para achismo e nem para estrelismo. É um lugar para tratarmos de propostas sérias, que possam apresentar caminhos de solução para o problema”, ressaltou. Segundo ele, a reunião representa uma das mais importantes oportunidades para se discutir um tema que lançou luz sobre o problema no sistema prisional.
“Mas junto desse holofote veio o constrangimento judicial, que todos nós temos a oportunidade de reverter. Estamos complementando uma decisão judicial. E o que nós decidirmos aqui, e o que for acolhido no processo final de audiência pública, fará parte dessa decisão”, disse o secretário.
ADPF 347
A elaboração do plano foi determinada pelo STF em outubro de 2023 ao julgar a ADPF 347. A decisão reconheceu que as prisões brasileiras são tão precárias que funcionam contra a Constituição Federal. Para superar esse quadro, a Corte determinou que a União e o Judiciário apresentem uma solução satisfatória com a participação de instituições, órgãos competentes e sociedade civil. A versão final do plano será entregue ao STF no próximo mês de julho.
A proposta está estruturada em quatro eixos: controle de entrada e das vagas no sistema penal; qualidade da ambiência e dos serviços prestados e da estrutura prisional; processo de saída da prisão e de inserção social; políticas para não repetição do Estado de Coisas Inconstitucional. O objetivo é garantir a escuta de diferentes vozes para a construção de um plano plural até o dia 5 de maio. Todas as sugestões serão discutidas em oficinas de trabalho e sistematizadas para a conclusão da versão final do plano após a validação do Pena Justa pelo Supremo. Os 26 planos estaduais e o plano distrital têm prazo de três anos para serem implementados a partir da aprovação pelo STF.
CNPCP
O presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), Douglas de Melo, afirmou que o STF forneceu uma “grande oportunidade” ao decretar a ADPF 347. “Em um ambiente absolutamente desafiador, existe um desejo na sociedade absolutamente legítimo por segurança pública”. Para ele, “lamentavelmente, muitas instituições se movem no sentido do discurso fácil do encarceramento em massa como política pública”, afirmou.
No entanto, ele sublinhou que o Estado precisa defender a decisão da Corte com palavras e gestos ao alcance das instituições. “É nosso dever contribuir com o debate público para convencer a sociedade que não é com encarceramento em massa, com o mais do mesmo que já se tem se realizado durante décadas”, salientou. Ele acrescentou que essas políticas já demonstraram ser sem êxito.
CNJ
O coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF/CNJ), Luiz Lanfredi, afirmou que a audiência pública dará voz às pessoas mais impactadas pelos desajustes e desarranjos da atual configuração do sistema prisional. “O que estamos a tratar não é mais um momento, mas a oportunidade que mede o tamanho da nossa responsabilidade diante desse processo. O Pena Justa é essa expectativa e esperança de que podemos devolver o sentido e funcionalidade às estruturas do sistema prisional às pessoas”, afirmou.
Para Lanfredi, este não é um problema localizado, mas é um problema inerente ao Brasil. “Nós temos na audiência, portanto, uma composição plural e heterogênea muito própria desse esforço, por meio do qual nós buscamos construir uma manifestação que represente aquilo que pensamos como coletivo.”
Além disso, o conselheiro superior do DMF/CNJ, José Edivaldo Rocha Rotondano, ressaltou que a finalidade do encontro é melhorar a situação vivenciada no sistema carcerário. “O que nós buscamos são orientações e conversas que possam agregar. Queremos ouvir quem vive a realidade do sistema carcerário. O estado pode, sim, limitar a liberdade, mas não violar todos os direitos dessas pessoas. Devemos nos unir para acabar com esse momento ruim que estamos vivenciando”, defendeu.
Ministério Público
O membro auxiliar da presidência do Conselho Nacional do Ministério Público (CNNP),Atalá Correia, lembrou que há mais pessoas privadas de liberdade que vagas nos presídios. “Além da expansão dessas vagas, o tema exige maior rigor na decretação de prisões, especial atenção às medidas cautelares na prisão. Além disso, mais eficiência na aplicação das medidas desencarceradoras, sobretudo na fase da execução penal”, definiu.
Segundo Atalá, há vagas que não possuem condições mínimas de salubridade. “Precisamos adequá-las com mais dignidade."
Objetivo
A audiência pública visa a ampla participação e contribuição de diferentes setores da sociedade na consolidação do Pena Justa, que será entregue ao STF em julho de 2024. Os temas em discussão incluem aspectos cruciais como o controle de entrada e vagas no sistema penal, a qualidade dos serviços e ambientes prisionais, os processos de reinserção social e as políticas para evitar a repetição de condições inconstitucionais no sistema prisional.
Além da audiência pública, está em andamento uma consulta pública para o plano, aberta a todas as pessoas e instituições interessadas na questão penal. Os participantes têm a oportunidade de indicar ações prioritárias para cada um dos problemas identificados nos quatro eixos temáticos do plano, bem como propor novas ações e problemas a serem considerados.
A participação na consulta pública é fundamental para garantir uma abordagem abrangente e inclusiva na formulação do plano nacional, que visa a promover mudanças significativas e duradouras no sistema prisional brasileiro.