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DISCURSO DA PROFESSORA THAIS MATOS - PRÊMIO CURTA HISTÓRIAS
A luta contra o preconceito e discriminação das pessoas negras em nosso país jamais deve acontecer apenas na Semana do dia 20 de novembro no qual é celebrado o dia da Consciência Negra. Especialmente dentro da Escola, que de forma alguma é um campo neutro dentro da sociedade na qual estamos inseridos, as discussões devem ser acirradas e acompanhadas pelos olhares dos educadores. Quando começamos a desenhar e pensar como seria nosso minicurta, uma coisa já estava clara: faremos o trabalho com crianças. Acredito piamente que adultos, são capazes de refletir, aprender e mudar comportamentos e concepções. Os adolescentes, por sua vez, são mais flexíveis que os adultos (em certa parte), mas com um trabalho bem direcionado conseguimos muita mudança em seus comportamentos. Entretanto, é na infância que se aprende muito do que vai ser a vida toda. E decidimos fazer com 5 meninas uma reflexão profunda sobre o que se esconde em simples situações do dia-a-dia. Antes de começar os trabalhos assistimos o filme Vista Minha Pele e discutimos sobre como seria o mundo ao contrário, onde as pessoas de pele negra tivessem muito mais destaque na televisão que as de pele branca, onde a maioria dos professores e alunos das escolas fossem negros e negras e onde ter cabelo liso fosse um drama nacional. No bate papo depois do filme, infelizmente ouvi da minha aluna Ana Carolina, a protagonista do filme junto com a Amanda, um triste relato sobre o cabelo: “Quando estava no jardim, eu chorava para minha mãe passar prancha no meu cabelo pra ele ficar liso, por que as meninas ficavam dizendo que meu cabelo era feio, era ruim. Minha satisfação com o resultado do trabalho já começou nesse momento ao perceber a indignação das colegas: “Como alguém pode fazer isso, né professora?”
O cabelo faz parte de nossa identidade, ajuda a dizer quem somos, nossas preferências, nossas origens. Ainda mais para nós, mulheres. Dizer que o cabelo de fulano ou beltrano é ruim, é o mesmo que dizer que ele mesmo é ruim, é péssimo, que não deveria estar ali desfilando com aquele cabelo, que não é apenas um acessório, que é ele mesmo! O fato de ter a pele negra ou branca, capelo crespo, cacheado ou liso, pouco importa. Somos todos afrodescendentes. Temos nossas raízes orgulhosamente fincadas na África e nossos alunos e alunas precisam saber disso. Precisamos ensiná-los desde pequenos a lutar contra qualquer tipo de preconceito. E, para isso, precisamos armá-los de argumentos, teorias, questionamentos. E quem fará isso? Tantas famílias desestruturadas mal têm tempo e meios de refletir sobre isso! A Escola. É nela que as transformações devem começar. É lá que devemos discutir, discordar e propor mudanças. Um educador jamais deve ficar neutro ao ouvir uma frase como essa: “Seu cabelo é ruim, não dá pra fazer isso ou aquilo”. Ele deve intervir e questionar: “Cabelo bom? Bom pra quê? Por quê esse ou aquele tipo de cabelo é considerado bom ou ruim? Quem determinou isso? Por que devemos continuar pensando assim? Sei que muitos de nós professores e professoras estamos despreparados para muitas dessas situações, uma vez que nós mesmos fomos criados em meio a tantos preconceitos. Mas é nosso dever buscar, formar-se e informar-se para oferecer aos nossos alunos novas possibilidades de mudança. A Lei 10.639, assim como O Prêmio Curta Histórias, são ações importantes e fundamentais para alcançarmos esse objetivo. Mas nada mudará se não mudarmos. Nada mudará se o bem permanecer em silêncio a cada vez que o mau recrutar novos seguidores. Plantemos pequenas sementes, mas plantemos.