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O talento único de Maria Fernanda da Silva é destaque nas Surdolimpíadas
A catarinense Maria Fernanda da Silva Costa é única entre os 315 atletas inscritos nas Surdolimpíadas Brasil 2019, em Pará de Minas (MG). Única porque deixou para trás todas as adversárias na chave de simples do tênis de mesa e venceu com autoridade, com 12 sets a favor e apenas dois contra na campanha. Única porque repetiu a dose na disputa de duplas, ao lado da parceira Irozina Rauen Vanelli. E, principalmente, porque é a única atleta surda com Síndrome de Down inscrita na competição que reúne competidores de 14 estados na disputa de 11 modalidades. O encerramento do evento será neste domingo, 23.06.
No caminho para o título individual, Maria Fernanda deixou para trás, por 3 sets a 0, Ana Cristina (RJ) e Gabriela Santos (AM), na fase de grupos. Na semifinal, superou Laís Sayuri (SP), também em parciais diretas. Na decisão, bateu novamente a carioca Ana Cristina, dessa vez numa disputa acirrada, por 3 x 2.
Eu gosto de aprender sempre. Sou forte. Estou evoluindo. Ganhei medalha. Estou feliz. E tem de passar na televisão"Maria Fernanda da Silva Costa
Com fundamentos lapidados em treinos de três horas, duas vezes por semana, em Itapoá (SC), a atleta de 17 anos lidera o ranking sul-americano para atletas com Down. Em 2017, viveu a experiência de integrar a delegação brasileira na versão mundial das Surdolimpíadas. "Eu gosto de aprender sempre. Sou forte. Estou evoluindo. Ganhei medalhas. E tem de passar na televisão", cobrou a bem-humorada atleta, que se comunica em Libras e impressionou o técnico mineiro Wesley Rosa, frequentador habitual das divisões principais do tênis de mesa olímpico brasileiro. "Ela é diferenciada, com base ótima. Quem ensinou ela fez um ótimo trabalho", comentou.
Luta em vários fronts
Se o tênis de mesa é a paixão, Maria Fernanda trouxe para o esporte das raquetes e bolinhas o espírito de luta que desenvolveu em passagens por judô, muay thai, taekwondo e caratê. Isso sem falar de experiências com yoga e natação. Para a mãe da atleta, a professora de artes aposentada Karen Jackeline da Silva, o esporte é um dos idiomas essenciais na vida da filha, principalmente porque a síndrome exige estimulação constante.
"As pessoas com down são hipotônicas. Desde que descobri, no parto, trabalho essa estimulação. Por isso o esporte é tudo para ela. E ela não se intimida. Em 2017, quando fomos para a Turquia, ela enfrentou atletas renomadas, que 'davam o pau em cima dela', mas não desistia. Seguia. Luta sempre", afirmou a mãe, que descobriu a deficiência auditiva da filha apenas quando ela completou três anos. Até então, ela entendia a dificuldade de comunicação de Maria Fernanda como consequência da Síndrome de Down.
"Segundo os médicos, a deficiência auditiva possivelmente veio de uma lesão no parto, que foi uma cesariana por fórceps que machucou muito. Ela é completamente surda de um ouvido e tem 5% do outro. Eu achava até então que a falta de comunicação era porque ela era mais lenta. Ela só andou com dois anos e quatro meses", lembrou a mãe. A partir do diagnóstico, a língua de Libras passou a fazer parte da rotina da dupla. "Foi um aprendizado lento, mútuo, com muitos desafios e conquistas graduais".
Ajuda de Senna
No caminho para garantir a escolaridade regular da filha mais nova (Maria Fernanda tem uma irmã de 24 anos), Karen vivenciou vários instantes de preconceito e de falta de informação. Mudou de cidade em busca de melhores condições. Saiu de Blumenau para Balneário Camboriú. De lá para Itapoá. E ali experimentou um momento de grande parceria pedagógica e inclusão na Escola Municipal Ayrton Senna.
As pessoas com down são hipotônicas. Desde que descobri, no parto, trabalho essa estimulação. Por isso o esporte é tudo para ela. E ela não se intimida. Luta sempre"Karen Jackeline, mãe da atleta
"Fico até emocionada de falar porque me lembro que, quando cheguei lá disse: Ayrton, por favor, aí de cima, olhe por ela. E foi show de bola. Toda escola foi incluída. A gente saía na rua e algumas pessoas sabiam Libras. Os professores abraçaram isso juntos", afirmou.
Karen conta até que, usualmente, Maria Fernanda costumava ganhar uma competição no mês do aniversário. Em 2018, contudo, a viagem para competir não foi possível. Diante disso, a escola se mobilizou. Fez um circuito esportivo interno e virou uma festa. "Foi o máximo. Fiz bolo, salgadinho, tudo lá", recordou Karen. Embora Maria Fernanda tenha saído do colégio por ter concluído o ensino fundamental, ela sempre volta para levar as medalhas. De Pará de Minas, mais duas estão a caminho.
Abraçada pela primeira-dama, Michelle Bolsonaro, na Cerimônia de Abertura das Surdolimpíadas, Maria Fernanda espera ser uma das primeiras da fila para ser contemplada quando o edital da Bolsa Atleta para modalidades não olímpicas e não paralímpicas for publicado. A indicação do edital com previsão de publicação até o fim de 2019 foi informada pelo ministro da Cidadania, Osmar Terra, e pelo Secretário Nacional de Alto Rendimento, Emanuel Rego. "É um alento importante. A gente tem muita dificuldade de manter esse ritmo de viagens e competições apenas por conta própria", afirmou Karen.
Domínio mineiro
No masculino, o domínio no tênis de mesa foi do mineiro Thiago Benedito Castro, que também venceu as disputas individuais e de duplas masculinas sem deixar brechas ou sets. Nas duplas mistas, o ouro foi para a dupla carioca composta por João Oliveira e Ana Cristina.
Judô
Nos tatames, um dos destaques foi a carioca Marcele Felix, campeã em sua categoria (-70kg) e na Absoluta. Marcele é conhecida por ser a primeira atleta surda das Américas a conquistar a faixa preta na modalidade. Ela treina no Instituto Geração, local que revelou a campeã olímpica Rafaela Silva e idealizado pelo medalhista olímpico Flávio Canto. "Minha maior motivação é provar que não há nada que uma mulher e um atleta surdo não possa conquistar", afirmou Marcele.
Uma das surpresas da competição foi a derrota de Alexandre Fernandes, um dos judocas mais consistentes da modalidade. Primeiro medalhista brasileiro na história das Surdolimpíadas Internacionais, com um bronze conquistado na edição de 2009, em Taipei, Alexandre ficou com a medalha de ouro em sua categoria, a -90kg, em que não houve adversários inscritos. Na Absoluto, contudo, acabou superado na estreia pelo paulista Cleiton Batista da Silva. O ouro no absoluto ficou com o paulista Rômulo Santos.
Na contagem geral de medalhas do judô, São Paulo levou a melhor, com quatro ouros, duas pratas e um bronze. A delegação do Rio de Janeiro somou três ouros, três pratas e um bronze. Minas Gerais saiu da competição com um bronze.
Outras modalidades
O sábado foi de intensas disputas em pelo menos cinco instalações esportivas de Pará de Minas. Além de tênis de mesa e judô, a competição teve suas disputas encerradas na natação, no badminton, no xadrez e no caratê. No domingo, modalidades coletivas, como futebol de campo, basquete e vôlei, chegarão ao fim. A organização anuncia a publicação dos resultados completos em https://surdolimpiadasnacional2019.wordpress.com/judo/ .
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Gustavo Cunha - Ascom - Ministério da Cidadania